Resenha: Show de Bruce Dickinson em São Paulo foi a história viva sendo escrita ao vivo!

 

Por Murilo Araujo / Iron Maiden Brasil

A agradável calorosa noite de sábado (4) na cidade de São Paulo proporcionou o clima ideal para uma apresentação incendiária de Bruce Dickinson, que aproveitou a folga na exigente agenda do Iron Maiden para contemplar a insana base de fãs (tanto do vocalista assim como da Donzela) com a The Mandrake Project Tour, turnê essa que apresenta seu mais recente trabalho de inéditas e que leva o mesmo nome. Bruce retornou ao Brasil um ano após sua apresentação do projeto "Concerto For Group And Orchestra" do Deep Purple e idealizado pelo lendário John Lord! (relembre essa história aqui)

Foto: Gustavo Diakov

Muitos elementos apimentaram não somente esta fatídica noite, mas toda a turnê realizada aqui no Brasil (Curitiba, Porto Alegre, Brasília, Belo Horizonte, Rio de Janeiro e Ribeirão Preto) durante as duas últimas semanas, a começar pelo seu retorno solo aos palcos, que não ocorria desde sua apresentação no Wacken Open Air 2002, há 22 anos. Ainda há mais tempo, ocorria sua última apresentação no Brasil, pela turnê do álbum 'The Chemical Wedding' (1998) que selou com o Brasil uma verdadeira relação alquímica no ano de 1999 e deu origem ao segundo álbum ao vivo do vocalista, o lendário 'Scream For Me Brazil'.

O Vibra São Paulo, local escolhido para a apresentação de encerramento da turnê no país, pareceu minúsculo para os mais de 6 mil fãs presentes. Mas a ideia de Bruce era exatamente essa, um show mais intimista, fugindo inicialmente dos grande públicos. Lembro aqui que nosso vocalista já retornou à Europa (Bonjour la France! Quelles surprises nous réservent les six vieux messieurs ? 👀) e após alguns dias de folga na França(...) retornará aos palcos e em sequência, no verão, tocará nos grandes festivais europeus. O público devidamente trajado de preto, com estampas majoritariamente do Iron Maiden e mesclas do próprio material solo de Bruce, se aproveitou do tardio horário do início das apresentações para chegar com calma na região de Santo Amaro, zona sul da capital paulista. Mas houveram aqueles mais corajosos que toparam o desafio de encarar o atípico sol ardente no mês de maio desde bem cedo para ter a chance de ver seu ídolo bem de perto, na grade que faz divisa com o palco.

Por volta das 20h30 a banda brasileira Noturnall, compostas por remanescentes da nacional clássica Shaman, subiu ao palco e tratou de já chutar a porta. Nada de aquecimento! Uma apresentação energética e excepcional que cativou até mesmo aqueles mais ranzinzas e impacientes para o início da principal atração da noite. O vocalista Thiago Bianchi, com o coração explodindo de felicidade, fazia questão de a todo instante demonstrar toda a sua gratidão por aquela oportunidade! Lembro aqui que a banda Noturnall realizou a abertura das últimas três datas no Brasil, substituindo a banda Clash Bulldog's, que por motivos de cuidados em saúde envolvendo um dos integrantes da banda, optou por se desvincular da turnê. Após exatas uma hora de apresentação, a ansiedade tomava conta para o momento mais aguardado de todos!

Foto: Murilo Araujo/Iron Maiden Brasil

Já falei aqui de ansiedade? Pois bem! O início programado para às 22h em ponto dependia da pontualidade britânica da qual estamos tão acostumados ao ver a Donzela, mas Bruce postergou por mais 10 minutos (que maravilha não ficar sob o comando a punho de ferro do Patrão, né?!). Mas logo aquela leve apreensão por conta do horário se tornou a apreensão causada pelo desconhecido universal... as luzes verdes tomaram conta do palco e a voz de William Woodson ecoou, trazendo como abertura a introdução da longínqua série sci-fi "The Invaders", exibida nos EUA entre 1967 e 1968. Um alienígena surgiria para o nosso arrebatamento.

Com todo seu peso, Accident Of Birth, do álbum homonimo de 1997, abria a última data da The Mandrake Project Tour, já tratando de inflamar os ânimos daqueles ali presentes, soltando a voz e causando crateras na pista geral com rodas de bate cabeça. Bem vindos ao lar, mas não para um acidente de nascimento e sim para uma jornada que mescla o passado e futuro da voz mais potente do Heavy Metal!

Foto: Murilo Araujo/Iron Maiden Brasil


A admiração pela ufologia que Bruce possui foi exposta logo na sequência, com a canção Abduction do poderoso Tyranny Of Souls de 2005, cantada em coro, descarregando uma energia gigantesca em todos nós!

Foto: Murilo Araujo/Iron Maiden Brasil

A eufórica e macabra Laughing In The Hiding Bush do clássico Balls To Picasso de 1994 tratou de enlouquecer ainda mais os fãs, e o responsável por isso tem nome: Chris Declerq! Que assumindo o protagonismo na guitarra, executou os solos de forma insana! Assim como um coringa, Bruce estava de volta e ria para nós!

Foto: Murilo Araujo/Iron Maiden Brasil

Alguns segundos para recuperar o fôlego após uma trinca de peso e pudemos contemplar o brilho de Ragnarok que recaiu sobre nós após 18 anos. Sendo o primeiro single do novo trabalho de Bruce, lançado ainda em dezembro de 2023, Afterglow Of Ragnarok foi amplamente entoada pelos fãs, com o sentimento de alegria por poder apreciar uma nova obra do nosso vocalista.

Foto: Murilo Araujo/Iron Maiden Brasil

A alquimia, a arte poética, esotérica e oculta de William Blake se fizeram presentes com o clássico absoluto Chemical Wedding de 1997, onde um lindo casamento químico amarrou ainda mais a paixão recíproca entre Bruce e os fãs brasileiros, que cantaram como uma unidade só a belíssima canção. Um dos pontos altos desta noite! Que cerimônia! Uma verdade celebração!

Foto: Murilo Araujo/Iron Maiden Brasil

Many Doors To Hell, canção do novo álbum, veio para exibir a perfeita forma física e potência vocal do velho Bruce, que entregou uma interpretação consistente e incrível. Alma mais que viva e presente, Bruce Dickinson trouxe ainda mais vida para o espetáculo nos provocando com seu lendário jargão. SCREAM FOR ME SÃO PAULO!!!

Foto: Murilo Araujo/Iron Maiden Brasil

Retornando para 1997, Gates Of Urizen e a razão que enclausura e a moral que aprisiona, nos imerge em mais uma das místicas de William Blake. Bruce em mais uma interpretação esplêndida, nos encantou e hipnotizou mais uma vez! Filosofia, alquimia.

Foto: Murilo Araujo/Iron Maiden Brasil

Na sequência, com Resurrection Man, nossos corações pularam para fora ao ritmo das galopadas inquietantes da The House Band Of Hell composta por Dave Moreno (bateria), Mistheria (teclados), Tanya O’Callagan (baixo), Philip Naslund (guitarra) e Chris Declercq (guitarra). Com uma viagem por diversas nuances, principalmente por um saboroso deleite à la Black Sabbath, presenciamos um dos momentos mais pesados da noite, onde Tanya O'Callagan nos nocauteou com seu baixo em potência máxima! Sensacional! 

Na sequência com Rain On The Graves, encerrava ali a execução das canções do novo álbum lançado em março deste ano. Bruce soltou a voz, sorriu debochadamente e gritou estridentemente, tal qual um vigário canastrão. Aqui tivemos mais uma canção inspirada nas obras de William Blake, dessa vez sendo o poema Augúrios da Inocência.

Foto: Murilo Araujo/Iron Maiden Brasil

Foto: Murilo Araujo/Iron Maiden Brasil

Executando a instrumental Frankenstein, cover de The Edgar Winter Group, vivenciamos uma verdadeira sinestesia musical e tivemos um dos momentos mais icônicos da noite, no qual Bruce nos agraciou com suas habilidades únicas em conduzir um theremin, um peculiar instrumento musical eletrônico que não necessita do toque físico, apenas da capacitância do corpo humano. Como um alquimista e apaixonado pelo experimentalismo, Bruce manipulou frequências e amplitudes, proporcionando sensações sonoras curiosas ali.

Foto: Murilo Araujo/Iron Maiden Brasil

Retornando da "pausa", pudemos sentir o peso do erro, do pecado, da tentativa de alcançar aquilo que está além de nós: a vida eterna. Mas a alquimia é falha, imperfeita e Deus não tem nada a ver com isso. Em The Alchemist, Bruce, com sua interpretação feroz, traz a consequência disso. O final do casamento químico. 

Foto: Murilo Araujo/Iron Maiden Brasil

Anestesiados, admiramos Philip Naslund acariciar as cordas do violão, entregando uma das mais belas introduções da carreira solo de Bruce. Tears Of The Dragon é, indiscutivelmente, o clássico absoluto do nosso vocalista. Entoada a plenos pulmões por todos ali presentes, a ponto de sobressair sobre a voz daquele que estava no comando no palco, o espetáculo atingia seu ápice!

Foto: Murilo Araujo/Iron Maiden Brasil

Foto: Murilo Araujo/Iron Maiden Brasil


Se aproximando do final do show, nos deslocamos para Darkside Of Aquarius e a desarmonia do ciclo da vida através das desgraças do mundo contemporâneo, figurativamente descrita com os Cavaleiros do Apocalipse e a Roda do Dharma. Uma letra densa que só mesmo Bruce poderia criar e interpretar. 

Foto: Murilo Araujo/Iron Maiden Brasil

Se desvencilhando do caos, Bruce parou para conversar com o público e lamentou por aquela ser a última data da turnê no Brasil, mas avisou que estaria de volta em dezembro junto ao Iron Maiden, trazendo a The Future Past Tour por duas noites no Allianz Parque, na cidade de São Paulo! Além disso, confessou seus planos solo para 2025 e que o Brasil fará parte disso! O que nos aguarda? Mais um álbum de inéditas acompanhado de uma mini turnê? Aguardemos!

Bruce também se solidarizou pela drástica e triste situação de calamidade que o estado do Rio Grande do Sul está vivendo devido às fortes chuvas e enchentes e pediu para que todos pudessem apoiar da forma que for possível. We're Blood Brothers! Bruce dedicou a próxima canção para o povo do sul.

Foto: Murilo Araujo/Iron Maiden Brasil

Navigate The Seas Of The Sun, a pura poesia presente em Tyranny Of Souls. Uma canção linda, acalentadora e que proporcionou um dos momentos mais emocionantes da noite! Bruce performou de forma mágica, assim como os universos projetados no telão ao fundo do palco. Além disso, seu entrosamento em um coro belíssimo junto a Tanya O'Callagan e Philip Naslund, encheram nossos olhos de lágrimas de felicidade. Lindo, magnífico. 

Foto: Murilo Araujo/Iron Maiden Brasil

Chegando à penúltima música, Bruce contou uma tensa história de terror. O terror do dilema humano sobre a moralidade, o profano, a inocência usurpada pelo carnal. Em mais uma interpretação baseada na obra de William Blake, todos puderam contemplar Book Of Thel.

Foto: Murilo Araujo/Iron Maiden Brasil

Fechando com chave de ouro a The Mandrake Project Tour no Brasil, The Tower veio para mostrar que, por mais que o alquimista busque a Pedra Filosofal, seu destino está selado e não será a tão desejada eternidade acompanhada de seu livre arbítrio, mas sim o Fim. Musicalmente falando, reitero a qualidade excepcional dos músicos da The House Band Of Hell, principalmente Chris Declerq que honrou o legado de Adrian Smith e Roy Z nos trabalhos clássicos de Bruce Dickinson.

Foto: Murilo Araujo/Iron Maiden Brasil

Fim da apresentação, um público em transe, anestesiado com a performance assombrosa de Bruce, que não aparenta sentir nem um pouco a influência inevitável do tempo. Irretocável, sua voz e vitalidade estavam em sua máxima capacidade, sua entrega no palco foi absoluta! Sem sombra de dúvidas o Brasil foi privilegiado por poder acompanhar a história viva sendo escrita. Um marco para a vida de qualquer fã de Iron Maiden. Um marco para a vida de qualquer fã de Bruce Dickinson. Obrigado, velho Bruce! E até dezembro!

E nós, do Iron Maiden Brasil, deixamos nossos agradecimentos à Midiorama pela parceria e também ao time da MCA Concerts por conduzir de maneira excepcional a turnê no Brasil!


Setlist - Vibra São Paulo (04/05/2024)

Intro - William Woodson's Storytelling of "The Invaders" (1967-68)

1 - Accident Of Birth (Accident Of Birth - 1997)

2 - Abduction (Tyranny Of Souls - 2005)

3 - Laughing In The Hiding Bush (Balls To Picasso - 1994)

4 - Afterglow Of Ragnarok (The Mandrake Project - 2024)

5 - Chemical Wedding (The Chemical Wedding - 1998)

6 - Many Doors To Hell (The Mandrake Project - 2024)

7 - Gates Of Urizen (The Chemical Wedding - 1998)

8 - Resurrection Man (The Mandrake Project - 2024)

9 - Rain On The Graves (The Mandrake Project - 2024)

10 - Frankenstein (cover The Edgar Winter Group)

11 - The Alchemist (The Chemical Wedding - 1998)

12 - Tears Of The Dragon (Balls To Picasso - 1994)

13 - Darkside Of Aquarius (Accident Of Birth - 1997)

14 - Navigate The Seas Of The Sun (Tyranny Of Souls - 2005)

15 - Book Of Thel (The Chemical Wedding - 1998)

16 - The Tower (The Chemical Wedding - 1998)

















Sobre Murilo Araujo

Murilo Araujo

1 comments:

  1. Valeu a pena assistir. Espero que ele lance um DVD, um album ao vivo dessa turnê. Bruce podia fazer como o Maiden, e incluir uma musica de cada lugar do planeta que tocou.

    Foi mais um capitulo da historia da musica, sendo escrita. O Bruce se preparou, se cuidou pra entregar um show decente. Não querendo ser chata, mas é 100% oposto á imitação de 'espetáculo' da Broadway em proporções megalomaníacas da Madonna, fazendo só fingimento, só playback sem dó. Ela não tem a mesma idade de Bruce? Ele também teve problema de saúde mas se preparou pra entregar shows ao vivo. Mesmo que ele ficasse paradão no palco, pelo menos ele canta de verdade, faz show de verdade com banda de verdade. Realmente, é dificil entender o mundo. kkkk

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