Iron Maiden - Biografia

Texto: Tarcísio Moura
Complementos e adaptações: Bruno C. Prado
Revisão geral: Douglas V. Rios



NO INÍCIO, APENAS UM GAROTO E SEU BAIXO

Nossa história começa no início dos anos 70, na Inglaterra, quando um garoto de quinze anos, chamado Steve Harris, desistiu de uma promissora carreira como jogador de futebol pelo West Ham United. Também não andava muito interessado na Leyton Country High Schooll, onde estudava na sua nativa Leytonstone. Pouco depois de pendurar as chuteiras, Harris, como muitos e muitos outros garotos de sua idade, acabou caindo de amores pelo rock. Logo estava curtindo os sons das maiores bandas da época como Yes, Black Sabbath, Deep Purple, Jethro Tull, e duas de suas maiores influências: o Wishbone Ash (primeira banda a ter dois guitarristas solo) e o UFO, onde as acrobacias de palco do lunático baixista Pete Way seriam copiadas ponto a ponto. Mais tarde Scorpions e Judas Priest também trariam uma considerável inspiração.

Seu colega de classe, um certo Dave Smith, tinha aprendido a tocar guitarra, mas Steve gostava do som característico do baixo elétrico. Assim, pegou 40 libras juntadas com muita dificuldade e comprou uma cópia de um baixo Fender Telecaster. Junto com Smith formou então seu primeiro grupo que batizou de Influence, mas antes que tocassem seu primeiro show ao vivo, eles mudaram para um nome mais evocativo, Gypsy Kiss. Nessa época, 1972, Steve resolveu deixar a escola para sempre e seguir a carreira de músico. Antes que pudesse ganhar o suficiente para se sustentar, como viveria durante muito tempo, pegou diversos pequenos empregos durante o dia para ter o prazer de tocar à noite. Então, logo que deixou a escola, utilizou suas boas notas para conseguir um trabalho como estagiário desenhista, ganhando a preciosa soma de 11 libras por semana. Quando se cansou, passou para varredor de rua e uma série de empregos temporários incluindo uma temporada de 3 dias como lixeiro. "Esse eu tive que me livrar logo porque fiquei cheio de catar insetos que caiam pelo meu pescoço" revelou Steve na primeira biografia oficial do grupo, Running Free.

AS PRIMEIRAS APRESENTAÇÕES

Mas se a vida nos empregos não era lá essas coisas, musicalmente falando as expectativas foram aumentando progressivamente, ao mesmo tempo em que ganhava importante experiência. A primeira apresentação do Gypsy Kiss foi num show de talentos no St. Nicholas Church Hall em Poplar. O promotor do evento era um cara chamado Dave Beasley, mais conhecido como Dave Lights, que viria a ser uma figura importante na vida do Iron Maiden, num futuro próximo. Claro que não foi das melhores apresentações que se podia esperar. Numa das músicas, que deveria começar com um solo de baixo, Steve se mostrou tão nervoso que errou completamente, ao ponto de seus companheiros acharem que ele estava tentando afinar o instrumento. Mas a apresentação foi bem recebida, constando que o grupo ficou em segundo lugar no concurso.

Nos meses seguintes o Gypsy Kiss continuou fazendo alguns shows esporádicos, tocando um set de músicas famosas como Paranoid (do Black Sabbath), All Right Now (do Free), Smoke On The Water (Deep Purple), Blowing Free (do Wishbone Ash) e até Neil Young (Southern Man). Também arriscavam algumas músicas próprias, incluindo uma certa "Endless Pit", de autoria de Harris, que mais tarde, se tornaria parte de "Innocent Exile".

Mas depois de sete apresentações, o Gypsy Kiss acabou e Steve resolveu entrar para outra banda da região leste de Londres chamada Smiler. Nesta banda estavam o baterista Doug Sampson, o vocalista Dennis Wilcock e os guitarristas Mick e Tony Clee. Mick e Tony, oito anos mais velhos que Steve, eram os donos do show. A banda fazia um som mais para o boogie, como o Savoy Brown, e conseguiram uma série de apresentações através do circuito de bares da região, obtendo uma fama pequena mas respeitável.

Para o jovem Steve a experiência foi considerável, mas estava fadada a ser curta. A banda chegou a fazer uma versão balançada de Innocent Exile, mas recusaram a tocar a primeira canção "verdadeira" de Harris, "Burning Ambition" com a desculpa esfarrapada de que ela tinha "muitas mudanças de andamento" e que - acreditem se quiserem - "parecia com Genesis"(!).

NASCE UMA BANDA

Frustrado, Harris caiu fora do Smiler, decepcionado com aquela visão estreita e preconceituosa e resolveu criar uma banda nova. Mesmo naqueles tempos iniciais Steve já tinha uma idéia bem clara de como a banda devia ser. "Naquela época eu já tinha escrito algumas músicas. Então eu sabia qual era meu objetivo. Eu queria uma banda de rock pesado que preferiria tentar algumas coisas diferentes, que experimentaria um pouco ao invés de ficar naquela de três acordes que todo mundo fazia". Relembra ele. Steve escolheu o macabro nome de “Iron Maiden” para sua banda. Como muitas das músicas que escreveu, esta foi inspirada num filme, O Homem da Máscara de Ferro, e se referia a um instrumento de tortura, uma espécie de caixão, com espinhos afiados na parte interna. Nessas alturas o repertório incluía algumas composições que ficariam famosas anos depois: "Transylvania", "Innocent Exile", "Burning Ambition" e o hino "Iron Maiden".

O recém batizado grupo estreou em maio de 1976, no St. Nicholas Hall, em Londres, e logo depois tocando no clube Cart & Horses, em Maryland Point, Stratford (que muitos acreditavam ser o primeiro show). O local era tão pequeno que a banda teve que usar o banheiro como camarim. A primeira formação do Maiden tinha Ron Mathews na bateria, Steve no baixo, Paul Day no vocal e Terry Rance e Dave Sullivan nas guitarras. Não foi muito difícil para a banda arranjar apresentações em clubes locais, já que o próprio Harris atuava como agente e cuidava dos contratos, usando seus contatos e experiência adquirida durante sua temporada com o Smiler. Mas muita água iria correr antes que conseguissem ganhar o suficiente para encarar a vida como músicos profissionais.

Um dos maiores empecilhos nessa fase, além das dificuldades normais de ter que competir com dezenas e dezenas de outras bandas iniciantes, foi a constante troca de membros na formação do grupo. Isso iria continuar por muito tempo, já que Harris, o eterno perfeccionista, era difícil de se satisfazer. E, embora o primeiro Maiden tivesse sido bem recebido ao vivo, Harris estava longe de sentir que tinha as pessoas certas. Para começar havia o problema dos guitarristas: embora fossem bons nas bases, Rance e Sullivan não tinham muito jeito para solos. Paul Day era outro problema, não no vocal, no que era muito competente (mais tarde faria um certo sucesso no More), mas na sua falta de energia ao vivo. Harris queria uma banda dinâmica e brilhante no palco.

EM BUSCA DA FORMAÇÃO PERFEITA

Assim, Steve mudou de vocalista chamando o antigo cantor do Smiler, Dan Wilcock, que, por sua vez, trouxe a solução de terem um bom solista de guitarra: um loirinho, jovem e talentoso que havia tocado com Wilcock no Warlock chamado Dave Murray. Fizeram uma pequena audição e o cara caiu como uma luva no som que Harris pretendia fazer. Isso faria do Maiden um sexteto, mas Rance e Sullivan sentiram-se diminuídos com a inclusão de Murray e intimaram Harris a escolher entre eles ou o novato. Steve, muito profissional, não teve dúvidas: ficava com Murray. Sullivan e Rance caíram fora. Um certo Bob Sawyer foi chamado para completar o time de guitarras.

Dave ficou uns seis meses com a banda, até ter uma briga feia com Wilcock durante uma apresentação na Bridge House. Wilcock o despediu e Dave foi juntar-se à banda Urchin, liderada por um velho amigo seu, um guitarrista desconhecido mas muito bom, chamado Adrian Smith. Bob Sawyer já tinha sido descartado um pouco antes, pois vivia tentando ultrapassar Murray ao invés de complementar seu som, sendo mais um rival do que um companheiro.

Com isso Steve ficou temporariamente desiludido com o conceito de dois guitarras-solo, cheio das brigas de ego. Chamou o guitarrista Terry Wapram, ex-Hooker, para ocupar o posto de Murray e, pela primeira e única vez, contrataram um tecladista via anúncio na Melody Maker, Tony Moore. Nesse meio tempo Ron Matthews saiu da banda e foi substituído por Barry Purkins. Essa formação só durou uma apresentação. Teclados não se encaixavam bem no som do Maiden da época e Moore caiu fora. O guitarrista Wapram acabou saindo também pois insistia que só tocaria se tivessem teclados na banda.

Nessas alturas Harris sabia muito bem quem ele queria de volta: o veloz, preciso e tranquilo Murray. Steve foi atrás dele com sua habitual determinação, até encontra-lo num show do Urchin. Foi, conversou e conversou até convencer Dave a voltar para o Maiden, deixando um Adrian Smith muito chateado.

Mal voltava à banda com Harris e nova crise bateu: Dan Wilcock disse que "estava cheio" e pulou fora do Maiden bem em cima de uma apresentação no Green Man Plumstead, o que deixou a banda furiosa. Com essa baixa, Purkins resolveu sair também, deixando apenas Harris e Murray para levantar a bandeira do Iron Maiden. Purkins, que atendia pelo apelido de Thunderstick iria se juntar pouco depois ao Samson, um grupo que incluiria um certo Bruce Dickinson nos vocais. Dava para acabar com qualquer um. Mas Harris não era qualquer um e tratou de arrumar as pessoas que faltavam.

NEM SÓ DE SOM VIVE UMA BANDA

Aqui, antes de Wilcock desaparecer de cena, vale a pena destacar sua contribuição para o futuro do Maiden. Nem tanto no vocal, mas sim numa outra área muito importante para o sucesso posterior da banda: sua imagem.

Wilcock era um grande fã do Kiss e foi dele a idéia de usar um pouco de teatro no palco para dar mais força às apresentações. Ele usava maquiagem vermelha num dos olhos (muito parecida com a de Paul Stanley do Kiss), máscaras em algumas músicas e fingia atacar Dave Murray para morder-lhe o pescoço durante seus solos. Mas o ponto alto destas apresentações acontecia em "Iron Maiden", quando ele passava um florete na boca e "cuspia" sangue de cápsulas de tinta. O resto da banda ficou muito impressionado com o resultado, principalmente quando duas garotas que estavam na fila da frente num show em Margate desmaiaram ao verem a cena. Certamente esses truques ajudaram a melhorar sua performance no palco.

Depois que Dan Wilcock saiu, Steve quis manter o elemento de teatro de horror na banda, mas sem a necessidade de ter um cantor maluco para fazê-lo. Até então o símbolo do Iron Maiden era um desenho de uma boca cuspindo sangue, bem parecida com a famosa boca dos Rolling Stones. O desenho era baseado nas performances de Wilcock.

A famosa figura do Eddie só apareceu bem depois, graças a um personagem chamado Dave Lights. Dave era um velho conhecido de Harris, pois foi ele quem organizou o concurso de bandas onde o Gypsy Kiss estreou. Mais tarde Lights decidiu transformar um velho vicariato onde vivia num local para ensaios. Dave acabou entrando para a história do Maiden como responsável pelo show de luzes da banda e, mais tarde, efeitos especiais, tais como fogos de artifício durante as apresentações. O caráter de improvisação é bem demonstrado pelo número de vezes que Steve e Dave Murray saíram queimados quando o sistema estourava.

Mas a criação mais famosa de Dave Lights aconteceu quando ele pegou o logotipo da banda (desenhado pessoalmente por Steve Harris) e pintou-o de dourado, colocando junto uma máscara facial (segundo consta, furtada de alguma escola de arte). "Eu não sei quem é esse cara - Comentou Steve - Mas ele devia ser feio!" Dave colocou lâmpadas em torno das beiradas e usou o compressor de ar de um aquário para que a máscara cuspisse sangue durante a música "Iron Maiden". A idéía da cabeça e da rima (em inglês: Eddie, the Head) veio de uma piadinha infame de Dave Murray sobre um garotinho que tinha nascido sem corpo.

A segunda cabeça de Eddie era um pouco maior e Dave Lights a construiu de fibra de vidro e acrescentou olhos que acendiam, além de fumaça vermelha que saía dela. Também o logotipo foi melhorado sendo bem maior e feito de pedaços de vidro duramente construídos pelo senhor Lights. Tanto a cabeça de Eddie quanto o logotipo podem ser vistos nas primeiras fotos promocionais da banda, e na contracapa do primeiro LP. Eddie permaneceria sem corpo até a aparição do desenhista Derek Riggs, bem mais tarde.

RETORNANDO PARA A BATALHA

Depois que Wilcock e Purkins saíram, Harris não desanimou e voltou à carga a procura de pessoas que pudessem preencher as vagas da melhor forma possível. Como resultado ele acabou entrando em contato com seu antigo baterista do Smiler, Doug Sampson, e ensaiaram duramente por seis meses, enquanto buscavam novo cantor. Eventualmente ele acabou chegando a Paul Di'Anno, uma figura de Chingford, que era, sem dúvida o primeiro vocalista digno do nome até então. Harris o conheceu através de um amigo de Paul, Trevor Searle, que ficou sabendo que o Maiden precisava de novo cantor. Foi durante uma apresentação do Pink Fairies no seu clube local, o Red Lion, antes de ser demolido. Curiosamente, o cara que organizou aquela apresentação do Pink Fairies era um certo Rod Smallwood, então agente do grupo.

Paul foi chamado para um teste e passou tranquilamente numa inspirada versão para "Dealer" do Deep Purple. A lenda diz que Di'Anno impressionou a banda com histórias que teria cantado em vários conjuntos, chegando a mais tarde declarar para a imprensa que tinha estado até em bandas de Reggae e coisas a fim. Essas declarações eram típicas mentirinhas que Paul faria durante os anos seguintes para aumentar sua reputação, embora isso em nada afetasse o fato dele ser um excelente cantor e uma figura carismática no palco, perfeito para uma banda energética e carismática como o Maiden. Paul entrou no final de 1978 bem na hora do Maiden estrear uma série de apresentações triunfais num bar que faria sua fama e glória, o Ruskin Arms, na High Stree North, Manor Park, East London.

O MARKETING DA ÉPOCA

O Maiden tinha um público certo, mas estava longe de ser a única grande banda das redondezas. Havia muita rivalidade e a competição era foda. Steve então achou interessante fazer muita propaganda, colocando anúncios em todos os locais possíveis, que podiam variar desde um simples "Vocês não viram nada ainda" até coisas mais elaboradas como "A única banda que vale a pena ver... sangue, choque e rock", "Reis do rock do East End" e por aí vai. A mais longa e interessante, além de original, veio depois de seus seis meses de preparação quando colocaram no jornal Melody Maker essa bomba, que traduzida livremente dizia mais ou menos assim:

"IRON MAIDEN não é apenas a de melhor visual, alta energia, original, barulhenta mas talentosa, bonita, de bom gosto, apaixonante, batedora, vampiresca, fazedora de cabeças, banda de hard rock de Londres! Nós somos também muito bons rapazes, legais com nossos fãs e familiares, hostis para outras bandas, mas antes de tudo nós somos sensacionais, grandes estrelas e nós somos honestos e estamos de VOLTA!!!!!!! ENTÃO FÃS, GRAVADORAS, CAçADORES DE TALENTO, AGENTES, PROMOTERS, CONTADORES E GAROTAS BONITAS DISPONÍVEIS, FIQUEM DE OLHO NESSE ANÚNCIO PARA DETALHES!”

Sim, eles sabiam voltar com estilo. O único problema é que muitas pessoas não viam as coisas com tanto humor e vira e mexe havia gente de outras bandas que vinha provoca-los ou coisa pior. Em pelo menos uma ocasião outra banda arrebentou os portões do clube Cart & Horses e jogou cerveja em todos os monitores da banda, resultando numa briga de proporções épicas.

TEMPOS DIFÍCEIS

Apesar do Maiden ter um público fiel e certo, a época não era para Heavy Metal. De fato, o Punk rock começava a chamar a atenção da mídia e empresários e já anunciado como a "nova tendência". Vale dizer aqui que, nessa época, o pessoal do punk e do metal não se tocavam e viviam se estranhando. Heavy Metal era coisa de “hippies cabeludos” e o som era tido como “ultrapassado”, como pontuavam os críticos. Mas não dava para ignorar totalmente um pessoal talentoso como o Maiden. Vários "olheiros" apareciam e alguns empresários se aproximaram de Steve Harris & cia. para um eventual contrato de gravação. Mas a história era sempre a mesma: todos ficavam impressionados com a energia e talento da banda, mas vinham com as velhas propostas de "cortem os cabelos" ou "Façam algo mais comercial". Uma empresária de Londres, dona de uma gravadora de Reggae(!) chegou mesmo a sugerir que tocassem no Roxy (o templo do punks na época), com um material mais pop, desistissem do cenário e das pirotecnias, cortassem o cabelo e usassem toda a parafernália punk (como alfinetes e penteados arrepiados). Desnecessário dizer pra onde os membros da banda mandaram a empresária.

Foi um período duro para pessoas como Steve Harris, determinado, inteligente e consciente de sua musicalidade, ver suas chances de gravação e shows desaparecerem diante da moda dos Punks e New Waves. Os membros do Maiden estavam certos que fazer concessões à moda queimaria seu nome e nunca conseguiriam de volta os fãs que tinham em sua região. Levantaram a bandeira do Heavy Metal para quem quisesse seguir e foram adiante. O único interesse da época tinha sido de um empresário belga que chegou a sugerir que a banda se mudasse para aquele país onde poderiam gravar. Mas o pessoal do Maiden chegou à conclusão que não valia a pena deixar seus fãs fiéis e sua localidade.

Enquanto isso a banda logo descobriu que estavam cada vez mais atraindo pessoas de locais mais longínquos para vê-los tocar. Melhor: quando o Iron se aventurou a se apresentar em clubes distantes, descobriram que os fãs vinham atrás, não importando as dificuldades de transporte. E a banda, que nunca ficou mascarada, sempre dava um jeito de dar uma carona para alguns que ficavam sem jeito de voltar para casa.

Quando o Maiden retornou à cena com Paul Di'Anno, seus seguidores se tornaram ainda mais fanáticos. Instalados no Ruskin Arms (que virou assim uma espécie de "base" de ação do Maiden), o conjunto tinha um sucesso fenomenal. Enquanto que o Maiden conseguia tocar lá três ou quatro noites numa semana e enchia o lugar em todas elas, as outras bandas do pedaço só conseguiam fazer um show por semana. A banda recebia a "preciosa" soma de 30 libras por noite, o que queria dizer que todo mundo no Maiden tinha que se manter firme nos seus empregos durante o dia.

A PRIMEIRA GRAVAÇÃO

Mas Harris estava longe de se contentar em ser apenas o líder da banda herói do local. Queria expandir, crescer, não importando as dificuldades. Gravar uma demo tape por conta própria para conseguir shows fora do circuito da East London pareceu o caminho mais lógico. Impressionado com a fita demo que Wilcock e Terry Wapram haviam gravado com sua nova banda V-1 nos estúdios Spacewood em Cambridge, Steve resolveu fazer o mesmo. Custaria mais caro e o estúdio ficava mais longe que outros, mas Harris queria uma fita de qualidade e resolveu não economizar nos palitos.

O dia 31 de dezembro de 1978 era a única data que conseguiram e resolveram ir adiante, embora não tivessem lugar para ficar. Mas graças ao charme e lábia de Paul Di'Anno, que arranjou uma namorada enfermeira, tudo se resolveu. A boa moça deu um jeito de levar toda a gangue para uma festa e conseguiu com que, muitas cervejas depois, também dormissem por lá. As sessões duraram dois dias, ao preço de 200 libras, e conseguiram a gravação de quatro músicas de Harris: "Iron Maiden", "Invasion", "Prowler" e "Strange World".

A banda voltou para casa com a intenção de retornar aos estúdios duas semanas depois, quando teriam mais grana, para poder polir um pouco o produto, corrigir alguns pequenos erros e fazer uma remixagem de algumas passagens. Infelizmente a banda não dispunha de dinheiro suficiente para comprar a fita original e, quando retornaram duas semanas depois, ficaram sabendo que ela tinha sido apagada! Assim sendo tiveram que ficar com a cópia gravada "direto" e foi ela que mais tarde se tornaria o primeiro registro em vinil do Maiden, prova irrefutável do incrível entrosamento e capacidade dos músicos desde aqueles tempos. Logo depois eles levariam esta fita para Neal Kay, o disc Jóquei mais quente da área de Heavy Metal que conheciam, dono de um lugar chamado Soundhouse em Kingsbury.

UM LUGAR DIFERENTE: SOUNDHOUSE

Neal Kay era uma figura esquisita, para dizer o mínimo: longos bigodes e cabelos, baixinho e usando botas altas, parecia um refugiado de Woodstock. Até sua maneira de falar era hippie, coisa totalmente fora de moda no fim dos anos 70. Mas era um cara que amava apaixonadamente o Heavy Metal. E o Soundhouse era a prova disso.

Havia outras discotecas que tocavam este tipo de música na época (1979), mas o Soundhouse era O local, o point de encontro de todos os que realmente conheciam o que era o melhor. E não só porque tinha uma aparelhagem de som muito maior do que qualquer outra disco, caixas de som empilhadas até o teto, que mais pareciam indicadas para uma banda do que para uma danceteria.

O que tornava o Soundhouse uma coisa única era realmente seu dono, guru e luz guiadora: Neal Kay, o homem que estabelecera a fama do local em termos nacionais. Havia outros DJs que tocavam Heavy Metal na época, mas absolutamente ninguém com a sua capacidade ou garra. Para ele o Soundhouse não era apenas uma discoteca - era uma missão. Kay não queria saber nem tocava velhos standards do gênero. Nem modismos. Ele estava interessado nos últimos lançamentos, nas novidades e em fitas demo promissoras. Queria também usar o Soundhouse como base para promover novas bandas. Kay tinha uma atitude meio messiânica em relação ao metal.

Foi numa tarde daquele ano que um tímido Dave Murray trouxe-lhe uma cópia da demo que gravaram no ano-novo, tentando conseguir arranjar uma apresentação no local. Kay se lembra bem da ocasião: "Eu disse: 'Ok, vocês e cinco milhões de outros'. Aí eu falei para ele deixar a fita comigo e talvez eu tivesse a chance de ouvi-la umas duas semanas depois. Eu realmente me recrimino por ter dito aquilo!" Mas quando Kay resolveu por a demo para tocar, ficou impressionado com o potencial da banda. Ficou louco com o som e tocava-o sem parar. No outro dia telefonou correndo para onde Steve Harris estava trabalhando: - "Vocês têm algo aqui que vai te render milhões!" Steve só podia rir. Achou que ele estava passando um trote.

Mas Kay tinha razão: "Eles tinham uma impressionante unidade de som. Tá certo, havia umas notas erradas aqui e ali, mas Steve e Cia sabiam que precisavam de um estúdio decente. Não perderam tempo, foram lá e trabalharam duro. E a coisa toda foi costurada muitíssimo bem. Fizeram o melhor que podiam na época. E musicalmente era impressionante. Era a melodia somada à porrada que me impressionou. Bandas agressivas existem às dúzias desde então, mas nenhuma com aquelas canções. A combinação de peso, velocidade, as mudanças de andamento, e as linhas melódicas de Dave Murray realmente me derrubaram. Era um som muito original e muito impressionante... Definitivamente a mais impressionante demo que jamais me mandaram."

Kay costumava mandar uma "parada de sucessos” para a prestigiosa revista Sounds desde 1978. Como tudo que se relacionava com HM, ele levava isso muito a sério e era baseada exclusivamente nos pedidos dos garotos que frequentavam o Soundhouse. Logo Kay começou a tocar a fita do Maiden no PA. E ninguém ficou mais surpreso que os membros do grupo quando viram "Prowler" aparecer em vigésimo lugar na revista, na edição de 17 de fevereiro de 1979. Steve recorda: "Eu e Paul fomos então no Soundhouse para ver como era aquele lugar. Ninguém nos conhecia, éramos somente mais dois headbangers bebendo no bar. Quando começaram a tocar 'Prowler' a gente ouviu aquela gritaria. Foi muito estranho ver aqueles garotos batendo as cabeças pra gente!"

Em 21 de abril, Prowler atingia o número um da parada da Soundhouse e lá ficaria por meses. Uma semana depois a banda estreava no lugar. O público enlouqueceu e o único senão ficou por conta do cenário, que não coube direito no fundo do palco e a cabeça de Eddie, ficou bem acima da bateria. Quando o sangue jorrou da boca durante a música "Iron Maiden", Doug Sampson levou um banho que não estava esperando.

Vale a pena notar aqui que quase que a banda vai pelo ralo logo no início de 1979 quando um caminhão, com todo o equipamento que possuíam, foi roubado em Fletching Road, Clapton. A banda chegou a mandar um anúncio na Melody Maker, sem muita esperança, avisando do roubo e oferecendo uma recompensa para quem conseguisse encontrar o material. Felizmente, poucas semanas depois os ladrões foram presos pela polícia antes que conseguissem passar à diante o que tinham roubado e o Maiden conseguiu quase todo seu equipamento de volta intacto.

Foi seu sucesso nas paradas da Soundhouse que deu ao Maiden o primeiro gosto de atenção nacional. Mas seria Neal Kay quem realmente daria o "empurrão" necessário. Ele resolveu levar alguns de seus protegidos para a estrada para provar que o Heavy Metal, longe de ser um gênero ultrapassado, estava vivo e bem e tinha uma fornada de novas bandas prontinhas para arrebentar o mundo com suas guitarras. Foi Geoff Barton, através do seu editor da Sounds Alan Lewis, e meio de brincadeira, que acabou batizando a empreitada num termo que ficaria na história da música pesada: New Wave Of British Heavy Metal (NWOBHM).

Foi numa terça-feira à noite, em maio de 1979, que se deu a estréia de três bandas escolhidas por Kay: AngelWitch, Samson e Iron Maiden. Kay em pessoa cuidou da apresentação das bandas, sendo o DJ da noite. Geoff Barton, que não estava muito convencido de que veria algo especial, foi lá ver o que seria a primeira apresentação pública do novo fenômeno. O Maiden passou fácil como a melhor banda da noite, colhendo todos os maiores elogios no quesito originalidade, composições e presença de palco. Impressionado, Barton saiu de lá cunhando o termo NWOBHM e iniciando uma série de artigos sobre o fenômeno. Estes artigos deram origem a uma revista paralela, que chamaram de Kerrang!, hoje uma das mais prestigiosas revistas de Heavy Metal do mundo. A bola de neve tinha começado a rolar.

SURPRESAS DO ACASO: UM EMPRESÁRIO NADA COMUM

Foi nessa mesma época, no verão (europeu) de 1979, que outra figura importante entra em cena: um certo Roderick Charles Smallwood. Smallwood chegou a estudar na Trinity College de Cambridge durante três anos, pulando de uma matéria para outra e aproveitando seu tempo para ir a festas, jogar Rugby ou ficar de porre, perdendo provas e trabalhos até receber ordem de pular fora da faculdade ou correr o risco de ser expulso. Antes disso tinha começado a trabalhar no grêmio local num evento anual chamado May Balls, junto com outro colega seu, George Andy Taylor, que, ao contrário de Rod, terminou a faculdade e continuou parceiro dele durante os anos seguintes. No May Balls, meio por acaso, ajudou a organizar eventos musicais e tomou gosto pela coisa.

Logo depois de cair fora de Cambridge, Rod conseguiu um emprego numa agência que cuidava dos interesses de várias bandas de rock famosas naquela época, a MAM. Entre seus contratados estavam os Kinks, Judas Priest, Golden Earing e outros. Depois resolveu dar um tempo sem fazer nada para logo em seguida se arriscar como empresário pela primeira vez com o bom grupo Cockney Rebel, do cantor e jornalista Steve Harley. Após uma frustrante experiência, em que acusou a gravadora RCA de sabotar o grupo (além de ter que lidar com o ego incontrolável de Hartley), Rod se encontrou desiludido com o mundo do showbusiness. Chegou mesmo a pensar em desistir de tudo completamente e voltar à faculdade para estudar Direito.

Aconteceu no entanto, que um amigo seu trabalhava num escritório de arquitetura e conhecia a família de Steve Harris. Sabendo do passado musical de Rod passou-lhe um dia a fita demo que o Maiden tinha gravado em abril de 1979. Mais tarde Rod se lembraria de ter ficado impressionado com o que ouviu, mas sem ter certeza se haveria algum futuro nesse tipo de música. Além disso, já tinha programado uma turné de rugby na Califórnia. Mas na volta em junho, depois que a namorada lhe deu um tremendo pé na bunda, se viu livre e solto de novo no mundo. E, nessas alturas, as reportagens da revista Sounds sobre as novas bandas sugeria que o Metal poderia estar voltando.

"Eu nunca estive nesta de punk ou coisa parecida" Comentaria Rod alguns anos depois: "Meu negócio era rock e é por isso que fiquei desiludido com essa coisa toda em primeiro lugar. Eu pus pra tocar a fita do Maiden mais algumas vezes, gostei do que ouvi, telefonei para Steve Harris e lhe disse que estava interessado em ver a banda ao vivo. Não queria ir ao East End, porque eu tinha ouvido muitos boatos da má fama do lugar e era tão preguiçoso quanto esses caçadores de talento para ir por lá."

Então Rod arranjou dois lugares para o Maiden dar shows de demonstração. Um deles seria no castelo de Windsor na região norte de Londres e outra no Swan, em Hammersmith. Nada aconteceu de acordo com os planos. No Castelo de Windsor a banda teve problemas com a autoridade local, o equivalente a prefeito, que ficou tentando coloca-los para tocar antes que a maioria de seus fãs tivesse chegado. Não sabendo bem de quem se tratava, a banda mandou o prefeito enfiar suas exigências naquele lugar, o que lhes custou uma boa temporada sem poder aparecer em North London.

As coisas estavam melhores no show em Swan, com tudo nos lugares até que cinco minutos antes de subirem ao palco. Steve chegou até Rod para dizer, muito sem graça, que Paul Di’Anno tinha sido preso. Aparentemente a polícia o achou suspeito de drogas e o revistou, achando uma pequena faca (que o mascarado cantor usava para aparecer palitando os dentes). Paul foi detido como suspeito e os policiais não quiseram saber dos desesperados pedidos da banda que tinha uma apresentação em minutos. Sabendo que teriam de enfrentar um clube cheio de gente e um empresário em potencial, o Maiden resolveu arriscar tudo e mandou ver como um trio, num set quase todo instrumental, com Steve Harris arriscando um pouco como cantor. Di’Anno ainda chegou a tempo de participar das últimas músicas depois de pagar pequena fiança. Rod achou o máximo.



"Eu fiquei muito impressionado". - Relembraria anos mais tarde "Eu nunca tinha visto uma banda que olhava a platéia nos olhos e estavam curtindo tão descaradamente o show quanto o público. Então ficou muito claro para mim naquela primeira experiência que eles seriam do tipo que poderiam ir longe, porque eles tinham uma boa estrutura, atitude, muita integridade, e a energia e o carisma no palco só do Steve e do Dave era muito, muito poderosos. Eu acho que foi a honestidade deles que me impressionou mais. Eles eram verdadeiros."

NOVAS PORTAS SE ABREM

A primeira coisa que resolveu fazer pela banda foi arranjar para ver como se comportariam diante de platéias de outros lugares. Assim sendo, através de seus contatos adquiridos durante os tempos na agência londrina, arranjou apresentações em cidades como Blackpool e Aberdeen, na Escócia. Para isso precisariam de um meio de transporte. Até então as distâncias maiores eram percorridas com uma velha pick up caindo aos pedaços. Quem veio salvar a situação foi uma tia de Steve, Janet, que devia ter muita fé no sobrinho cabeludo, pois emprestou três mil libras (quase toda a sua poupança), para que pudessem comprar um caminhão de três toneladas, logo batizado de Green Goddess (a Deusa Verde). Vic Vella, que fazia parte junto com Dave Lights da ‘entourage’ do Maiden na estrada, teve dois dias para transformar o caminhão em um ônibus que pudesse levar a turma toda mais o equipamento com o mínimo de conforto na estrada. "Ele fez um ótimo trabalho". - Relembra Steve - "Tinha até um interfone, de modo que a gente podia avisar o motorista que queríamos parar para ir ao banheiro. Nós não tínhamos dinheiro para pagar um hotel, então tínhamos de fazer o show e depois dormir no ônibus. Me lembro uma vez quando tocamos no Birkenhead Gallery Club e estava tão frio que quando acordamos estávamos cobertos por uma fina camada de geada! Mesmo assim era divertido."

Vic Vella lembra-se de algumas aventuras desses tempos. Uma delas chegou a ser bastante séria: "Paul era o tipo do cara que adorava começar uma encrenca mas não gostava de ficar para termina-la. Eu me lembro de uma vez que ele arranjou uma briga com duas pessoas em Rock Garden. Eu fui para ver se conseguia acalmar as coisas e quando eu olhei em torno, o Paul tinha desaparecido e a última coisa que eu me lembro é alguém me acertando uma garrafa." Outro incidente menos violento aconteceu quando eles resolveram parar num lugar calmo durante a noite, depois de um show, para dormirem. Só na manhã seguinte descobriram que o lugar calmo era na verdade um estacionamento e que estavam cercados de carros por todos os lados, levando duas horas para conseguirem sair.

Ainda se apresentavam no Soundhouse com regularidade para um público cada vez mais alucinado. Mas o interesse das gravadoras continuava morno, se tanto. "Olheiros" não apareciam com frequência. Mesmo quando Rod Smallwood usou todo o seu prestígio para conseguir que a banda tocasse no famoso clube Marquee, houve pouca resposta desses senhores. Uma das primeiras vezes que isso aconteceu foi quando a banda deu alguns shows de graça nos dias 3 e 4 de outubro no The Swan.
(Rod Smallwood se lembra de ter ficado a noite inteira acordado desenhando os posters do show, para economizar. Vale a pena apontar que o pão-durismo do senhor Smallwood se tornou tão notório durante a carreira do Maiden que ele ganhou o apelido de Smallwallet [carteira pequena]).

Naquelas alturas a banda continuava com o problema de um outro guitarrista para melhorar o som ao vivo. Paul Todd passou no teste mas ficou só dois dias. Tony Parsons o substituiria durante umas dez semanas e apareceria em algumas das primeiras fotos promocionais do maiden. Nos shows os representantes das gravadoras continuavam devagar: o da A&M nem deu as caras. O da CBS viu algumas apresentações mas achava que as músicas não tinham "Força suficiente" (!). Os irmãos Warner também não se impressionaram. Aliás, demoraria algum tempo antes que as gravadoras descobrissem o que estavam perdendo com o renascimento do metal e irem atrás de qualquer bandinha que soubesse tocar alguns acordes que lembrassem Deep Purple.

Mas nem todas estavam tão alienadas. A EMI sentiu que algo estava acontecendo e um dos diretores, Ashley Goodall, resolveu lançar uma coletânea com as novas bandas para testar o mercado. Ela se chamaria Metal For Muthas. Desde o princípio ficou claro que o Maiden era uma banda única, especial. Ao contrário das outras, o Maiden negociou sua participação na coletânea de forma extremamente profissional e dura. Rod se lembra: "Tínhamos que fazer as coisas do nosso jeito ou não o faríamos. Isso queria dizer que teríamos pelo menos dois dias para gravarmos no estúdio Manchester Square da EMI. E nós insistimos em termos duas faixas incluídas, sendo que uma delas seria a primeira do lado A. Nossa atitude era: ou do nosso jeito ou de jeito nenhum."

Rod mostrou a Goodall um show do Maiden no Marquee e este ficou maravilhado com a performance da banda e da reação quase histérica da platéia. Ao voltar, contou a seu chefe, o diretor de talentos Brian Shepherd, o que viu. Shepherd foi pessoalmente na Soundhouse para ver a tal maravilha do Metal em primeira mão. Acontece que ele se perdeu no meio do caminho e só conseguiu chegar ao Soundhouse no meio da apresentação, onde o Maiden estava arrasando como de hábito. Shepherd não iria tentar lutar por um lugar na frente no meio de um pub lotado de garotos alucinados.

Ficou atrás, mas não pôde ver muito: em minutos um fã mais atirado levantou uma bandeira que impediu o baixinho empresário de ver qualquer coisa. Nem era preciso: só alguém muito insensível não notaria a atmosfera elétrica que a banda produzia e a resposta imediata do público. Era uma mina de ouro. Shepherd voltou convencido e em pouco tempo o Maiden tinha um contrato com tudo que pedira, assinado oficialmente em 15 de dezembro daquele ano.

O contrato foi um golpe de mestre de Rod Smallwood. Ao invés de ficar satisfeito com um disco e um bom adiantamento, como a maioria das bandas sempre fazem, Rod arrancou da EMI um raríssimo contrato de cinco discos (três garantidos) em troca de um adiantamento bem pequeno - Apenas o estritamente necessário para pagarmos dívidas e trocar algum equipamento caindo aos pedaços – dizia ele. Rod sabia que o Maiden levaria uns três LPs para conseguirem sucesso a nível mundial e a banda concordou em segurar as pontas financeiramente durante mais algum tempo. Assim, a gravadora não poderia dispensá-los, cheios de dívidas, se não dessem certo no primeiro disco.

Só então é que Rod decidiu oficialmente se tornar o empresário do Iron. Não era o caso de conseguir um contrato e sim de conhecer mais o pessoal da banda e saber se eles não seriam como outros que encontrara no caminho e que tinham mascarado completamente uma vez que conseguiram alguma fama. Acertadamente, Rod concluiu que eles eram profissionais com os pés no chão e que não iam entrar numa trip de superstar. Pouco tempo depois do contrato, conversando com Steve Harris sobre planos futuros, o baixista perguntou então: "Quer dizer então que você vai nos empresariar?" e ouviu a resposta do homem de Yorkshire: "Yeah, fucking right I am!"

O novo contrato fez com que Rod começasse a lutar para lançá-los em escalas maiores, conseguindo um empréstimo de 8000 libras de várias fontes (segundo a lenda, de algumas até bem suspeitas). No final de outubro ele tinha fé suficiente no sucesso para convencer os membros do Iron Maiden a deixar seus empregos diurnos - todo mundo no Maiden ainda trabalhava (ou, como no caso de Paul, vivia de seguro desemprego) - para embarcar em sua primeira tour como atrações principais que foi de primeiro de novembro até dezesseis de dezembro, em clubes e faculdades por toda a Inglaterra.

THE SOUNDHOUSE TAPES

E, no dia 9 de novembro, para saciar um pouco a sede dos fãs, o Maiden decidiu lançar três das músicas que tinham gravado no último dia de 1978, como um EP, que se chamaria The Soundhouse Tapes - "Iron maiden", "Prowler" e "Invasion" - através de seu próprio selo, Rock Hard Records, prensando somente 5000 cópias. Usando fotos tiradas no Soundhouse e de alguns shows no Music Machine, o disco trazia as proféticas palavras do profeta DJ Neal Kay na contracapa: "(...) As faixas deste EP são as primeiras coisas gravadas pela banda e são as autênticas músicas não-remixadas tiradas da fita demo gravada em 30 de dezembro de 1978, e que foram apresentadas ao Soundhouse uma semana depois. Depois de uma ouvida ficou claro que o Iron Maiden se tornaria um dos líderes do Heavy Metal atual, combinando um tipo de talento e energia dirigida que o mundo da música jamais poderá ignorar!"
(E como o senhor Kay acertou na mosca!)

Steve Harris pessoalmente escreveu à mão todo o projeto gráfico, incluindo o selo, títulos e créditos - foi ele quem criou o famoso logotipo do Maiden. The Soundhouse Tapes, como ficou conhecido o EP, nunca foi vendido em lojas, sendo distribuído exclusivamente por Keith Wilford: um dos mais antigos fãs do grupo e que teve o mérito de ser o primeiro a aparecer num show do Maiden com uma camiseta com o nome da banda (feita de improviso por ele mesmo). Keith, que tempos depois viria a trabalhar no escritório do Maiden e cuidar do fã-clube oficial durante muitos anos, estocou as cópias na casa em que vivia com sua mãe. Em uma semana já tinham vendido 3000 exemplares, o que dá alguma idéia da demanda. E poderiam ter sido muito mais, pois Rod recebeu chamados das grande cadeias de lojas de discos pedindo quantidades enormes de cópias (20.000 só em uma semana). Mas banda e empresário se recusaram a atende-los. Embora o dinheiro oferecido tivesse chegado numa hora de necessidade, era desejo do Maiden que o disco fosse uma coisa muito especial, um presente para os fãs mais fiéis, que tinham acreditado neles desde o princípio.

Enquanto o EP era vendido rapidamente, a banda também excursionava rapidamente em torno da Inglaterra, fazendo shows memoráveis. Na volta, uma apresentação do Maiden entrou como atração principal no Music Machine ficou na memória da banda e de muitos outros pelos motivos errados. Batizada de Bonfire Night (a Noite da Fogueira), a banda, e mais particularmente, Dave Lights, resolveu fazer uma apresentação cheia de pirotecnias. No momento fatal em que Dave apertou o botão todos os fogos de artifício dispararam ao mesmo tempo, estourando também todos os fusíveis do lugar e deixando tudo às escuras!

E, para variar, a banda já estava procurando outro guitarrista. Segundo consta, Tony Parsons era bom, mas sua figura paradona no palco não era muito estimulante. Até nas primeiras fotos promocionais do grupo ele parecia deslocado e sem jeito. Também para variar, buscaram o substituto via anúncio na Melody Maker: "Precisa-se: segundo guitarrista solo para começar imediatamente. Base totalmente profissional. Precisa ser fanático por HM, tenha 22 anos ou menos. Apenas os mais pesados devem ser apresentar. NADA DE DISCOTHEQUE, POP, MOD, etc..." Curiosamente, o escolhido não seria nem um fanático por Heavy Metal nem tinha 22 anos ou menos, como veremos um pouco adiante.

ON THE RADIO

No dia 14 de dezembro, sem Parsons e como um quarteto, fizeram sua primeira apresentação no Rádio, na Friday Night Rock Show da Radio One. Tocaram seus futuros clássicos: "Iron Maiden", "Sanctuary", "Transylvania" e "Running Free". Depois ainda fizeram mais dez shows antes do ano terminar, sendo o maior destaque uma noite particularmente inspirada no Marquee. Malcolm Dome do Record Mirror se babou todo sobre aquela apresentação e anotou no final: “Estes caras vão arrebentar a velha geração de metaleiros para fora de suas suítes presidenciais nos próximos meses." Outro show no Music Machine, no dia 19, mostrou o senso de humor da banda, com amplificadores cobertos de neve falsa e até um papai noel headbanger. Foi um final muito engraçado para um ano sensacional para a banda.

Em um ano eles tinham conseguido muito mais do jamais tinham sonhado: tornaram-se atrações principais nos prestigiosos Music Machine e Marquee. Tiveram muita e boa cobertura da imprensa, arranjaram um empresário de verdade, uma agência e um contrato de gravação com uma gravadora multinacional. Os dias em que trabalhavam duramente no Ruskin Arms por 30 libras por noite ficariam para trás. A banda ria ao pensar que no início tudo o que queriam era ser o número de abertura para algum medalhão no Marquee. Seu dono, Jack Barry, tinha se recusado a aceitá-los várias vezes antes de outubro de 1979. Nunca mais cometeu tal erro.

OS HERÓIS DA NOVA DÉCADA

O Maiden inaugurou os anos 80 com uma nova formação. Primeiramente conseguiram como guitarrista um cara de 27 anos chamado Dennis Straton, veterano de algumas bandas locais. Na realidade sua primeira escolha foi o velho amigo e companheiro de guitarra de Dave Murray chamado Adrian Smith. Mas Smith, que liderava o Urchin, acreditava na sua banda e não quis deixá-la numa hora em que parecia que seria bem sucedida - tinham até conseguido um contrato de gravação antes do Maiden. Entretanto, Straton não ficava nada atrás em habilidade musical. Melhor: no palco era animado e ágil como seus companheiros. Fora do palco era um palhaço: embora fosse mais velho que todos os outros, agia como um garoto de 17 anos. Parecia ser o cara ideal.

A segunda mudança ocorreu por outros problemas: Doug Sampson estava com a saúde meio abalada e todos sentiram que não estava bem o suficiente para os rigores das futuras turnês: meio a contragosto ele acabou concordando que não estava bom o bastante para ir adiante. Seu substituto era um garoto louro, simpático e muito bom nas baquetas chamado Clive Burr. Burr tinha tocado por um breve período no Samson e dizia a lenda que vinha recomendado por Neal Kay. Na verdade foi Dennis Straton que o indicou para uma audição. Clive foi aprovado rapidamente depois que demonstrou sua habilidade na difícil Phantom Of The Opera.

AS PRIMEIRAS GRAVAÇÕES "SÉRIAS"

A primeira coisa que a banda queria fazer era gravar um compacto e, para isso, precisavam de alguém capaz de mexer nos controles e conseguir o som que os representasse bem. Inicialmente tentaram Gary Edwards, do East End Studios, mas não ficou muito bom, só sendo aproveitada uma gravação, 'Burning Ambition', que viria a ser o lado B de Running Free. Entraria para a história tanto por ser uma das primeiras coisas que Steve escreveu, como também a única gravação, fora o Soundhouse Tapes, em que Doug Sampson aparece. Nessa música, ainda sem Straton, Dave Murray toca todas as guitarras.

Nova tentativa foi feita com o antigo guitarrista do Sweet, Andy Scott, mas deu tudo errado. Para começar, Scott tentou convencer Steve a usar uma palheta ao invés de sua fantástica técnica de dedos no baixo, e foi informado onde deveria enfiá-la. Depois seu empresário quis arrancar da banda a garantia de produção do LP e eles lhe disseram para onde ir. Por fim, foi Brian Shepherd, da EMI, quem sugeriu Will Mallone, que tinha no seu currículo produções de discos do Black Sabbath e Meatloaf. Ele acabaria produzindo tanto o compacto quanto o primeiro álbum da banda. A gravação foi feita no Morgan Studios, com uma boa ajuda do engenheiro Martin Levan.

Antes que lançassem o sensacional single contendo "Running Free", no entanto, a EMI pôs no mercado a coletânea "Metal For Muthas" ansiosamente aguardada por todos. Foi um vexame. O que deveria ser uma amostragem abrangente do muitos grupos novos do Metal virou uma colcha de retalhos com conjuntos fraquíssimos como Toad The Wet Sprocket e Ethel The Frog. Apenas o Maiden, que compareceu com "Wrathchild" e "Sanctuary", era completamente convincente. O disco, longe de mostrar o potencial do New Wave Of British Metal, apenas reforçou a opinião de quem acreditava que o metal estava morto e enterrado.

A única vantagem dessa coletânea foi uma série de apresentações da tour "Metal For Muthas" como atrações principais, tendo seus velhos amigos do Praying Manthis como grupo de abertura. Quem organizou tudo foi o sempre eficiente Neal Kay, que sofreu com seus pupilos que fizeram muitas brincadeiras de gosto duvidoso, como trocar os discos de capas e colar o braço de seu aparelho de som com Super Bonder. Dave Lights foi com eles levando novos equipamentos. A equipagem ia num caminhão enquanto que os músicos e road crew iam num ônibus de 52 lugares. Muitas vezes acabavam dormindo no banco, já que o motorista era tão devagar que raramente conseguia chegar no hotel em tempo.

Mas a turnê foi um sucesso. O Maiden sabia conquistar novos adeptos a cada apresentação, com Steve Harris e seus asseclas se movendo todo o tempo enquanto uma barragem de som pegava a platéia em cheio. Ainda que as condições das viagens não fossem das mais confortáveis, o grupo mostrava um profissionalismo à toda prova, o que sempre marcou a carreira do Maiden.

RUNNING FREE NA TV, AO VIVO!

Enquanto o Maiden conquistava novas platéias, a EMI finalmente tinha algo para mostrar ao mercado: o compacto Running Free. Rod Smallwood teve uma rápida conferência com o pessoal encarregado da promoção só para dizer-lhes que se a banda fosse convidada para o programa "Top of The Pops" (uma espécie de Globo de Ouro de lá), eles não o fariam de jeito nenhum. - Eles devem ter pensado que eu era algum retardado. - Lembra-se Rod rindo - Em primeiro lugar porque bandas de Heavy metal não tinham compactos de sucesso então, especialmente o primeiro compacto e em segundo lugar, se acaso o tivesse, era uma loucura recusar a tocar no Top Of The Pops".

O pessoal da promoção levou um susto, pois a banda de Heavy Metal teve o seu compacto entrando nas paradas logo na primeira semana de lançamento, no número 44. Foi uma surpresa, mesmo para quem conhecia o Maiden e via seu potencial de vendas como no caso do Soundhouse Tapes. Assim sendo, Iron Maiden foi de fato convidado a se apresentar no Top Of The Pops, provavelmente a única banda nova a ser oferecida essa honra na primeira semana de lançamento de seu primeiro compacto. Para uma banda de rock pesado isso era ainda mais sensacional.

Naturalmente o pessoal da gravadora entrou em pânico quando o grupo confirmou que não tocaria no programa. Explicação: não fariam play back. Só fariam o programa se pudessem tocar de verdade. Para a surpresa de muitos, a direção concordou e o Maiden se tornou o primeiro grupo a tocar ao vivo no programa desde que o The Who o tinha feito oito anos antes. Claro que não foi sem aborrecimentos, tendo que tocar bem mais baixo do que estavam acostumados. Ainda assim foi uma apresentação energética, bem diferente dos popinhos insossos que tocaram antes e depois deles.

Infelizmente as rádios continuaram boicotando bandas de HM e se recusaram a acreditar no novo compacto. Ainda assim "Running Free" chegou ao nª 33, no princípio de março, quase que só na base do boca a boca.

DEREK RIGGS E EDDIE ENTRAM EM CENA

O compacto, cuja letra foi escrita por Paul Di’Anno e, segundo ele mesmo, baseada nos seus primeiros tempos de adolescente rebelde, trouxe uma novidade que marcaria toda a carreira do Maiden e ajudaria a estabelecer sua reputação: a capa desenhada por um cara chamado Derek Riggs.

Tudo aconteceu por acaso. Rod Smallwood estava discutindo com um agente amigo chamado John Darnley sobre como deveria ser a arte da capa (era outubro de 79, bem antes de conseguirem o contrato) quando viu um poster de jazz na parede. Rod ficou impressionado com o desenho de Riggs e queria ver mais. Derek então foi convidado a trazer seu book para o escritório do Maiden. Na maioria seus desenhos eram sobre ficção científica, muito bons, mas não era esse tipo de imagem que a banda tinha em mente. Mas um deles chamou a atenção de todos: um mutante com o olhar louco que combinava perfeitamente com a idéia de Eddie, the Head, (só precisou que Derek mudasse seu cabelo para ficar mais HM e menos parecido com um punk). Ficaram tão fissurados com o desenho que o escolheram para a capa de seu primeiro LP, embora ainda não tivessem nem sequer assinado o contrato.

Na capa do compacto 'Running Free' um fã de rock foge de uma figura do Eddie armado de uma garrafa quebrada, num beco escuro. A idéia foi de Paul, mas a banda pediu para Derek esconder a cara de Eddie nas sombras porque não queriam tirar o impacto da capa do LP quando saísse, quando introduziriam a figura de forma apropriada.

O LP enquanto isso foi gravado na Kingsway Studios e mixado no Morgan Studios, em fevereiro. 'Running Free' tinha sido lançado e a banda conseguiu uma chance de abrir para o Judas Priest, na honrosa condição de "convidados especiais". Mas quase tudo foi por água abaixo quando o boca grande Paul Di’Anno deu uma declaração na Sounds dizendo que iam "arrebentar com o Priest". Assim, quando a banda foi ao ensaio carregados de presentes (isto é, cervejas), um irritado K K Downing os colocou para fora sem cerimônia. Mais tarde, trabalhando juntos, as relações ficaram OK e a tour deu muito certo.

Durante a turnê o Maiden tinha um set de 45 minutos, sendo muito bem recebidos. Sua popularidade pôde ser medida quando, numa votação de melhores do ano da Sounds em janeiro, conseguiram o quarto lugar como a melhor nova banda antes de lançado qualquer coisa!

THE IRON MAIDEN!

Logo depois da tour com o Judas Priest, saía o primeiro LP da banda, chamado apenas de Iron Maiden. Lançado no dia 11 de abril de 1980, foi um sucesso absoluto, superando todas as expectativas, indo direto parar no nª 4 dos mais vendidos em uma semana e dando à banda um disco de prata em apenas um mês. Nem mesmo Steve Harris acreditou quando ouviu falar que o disco tinha chegado lá - Esperávamos chegar aos top 40 ou mesmo até 14... não no 4 de cara!

A crítica especializada amou o disco, se desmanchando toda, embora insistissem num ponto que irritou a banda, chamando-os de "cruzamento de Heavy Metal com Punk" (uma expressão muito em voga na época). Os críticos ignoravam que as músicas haviam sido escritas anos antes do punk aparecer e que nunca houve um cruzamento entre o Maiden e os punks. Ambos os tipos se desenvolveram paralelamente e o Maiden era um autêntico herdeiro das bandas precedentes do heavy setentista (Deep Purple, UFO, Scorpions, etc.). Mas os críticos amavam os punks, eles ainda estavam na moda e a maioria havia ignorado o estilo HM até o Maiden estourar na cara deles. Erros como este continuariam a acontecer.

Mas o disco era uma maravilha e ainda hoje impressiona desde os primeiros acordes de 'Prowler’ até a última nota do hino 'Iron Maiden’, com uma variedade de sonoridades raramente ouvida numa estréia. Embora nos anos seguintes Steve Harris reclamasse muito que a produção foi ruim, a qualidade das músicas e a energia das interpretações faziam disso um detalhe mínimo. A banda não deixava dúvidas quanto à sua versatilidade seja nas variações de 'Phantom of The Opera', no instrumental 'Transylvania' ou na linda 'Strange World', onde provavam que eram capazes de tocar coisas mais leves e fazê-lo bem. Claro que ajudou muito a capa, um primor, impossível de se ignorar. A falta de duas músicas favoritas de shows, 'Sanctuary' e 'Wrathchild', foi uma decepção para o público, mas aconteceu da banda estar guardando a primeira para o próximo compacto, enquanto uma versão mais bem produzida da segunda apareceria no álbum seguinte, Killers. (obs. Quando Iron Maiden foi relançado em CD, algumas edições incluíram 'Sanctuary', mas não a brasileira. Posteriormente, em 98, um novo relançamento incluíu definitivamente nos CDs essa música).

Voltando para a estrada em abril, o Maiden arrebentou em duas apresentações no Marquee, antes de retornarem ao Ruskin Arms para um show beneficente. Logo depois partiram para sua primeira turnê nacional como atrações principais para promover o LP. Foi uma maratona de 42 apresentações, que, pela primeira vez incluía a presença de um Eddie de corpo inteiro (na forma de Rod Smallwood ou outros roadies mascarados). O único problema que pintou foi que tiveram de cancelar algumas datas devido à perda de voz de Paul. Em Grimsby ele ficou afônico bem no dia da apresentação e a banda não quis decepcionar os fã que esperavam: tocaram um set instrumental e pediram para que as 500 pessoas conservassem seus tickets porque eles voltariam à cidade para um show completo. Sempre orgulhosos de sua honestidade e fidelidade, a banda cumpriu a palavra voltando em outubro e fazendo o show sem cobrar nada deles.

Em Edinburgh foi a vez de Clive, que sofreu uma intoxicação alimentar. Mas, levando em consideração que eles não podiam tocar sem um baterista, os roadies o carregaram da cama para o palco. Burr desmaiou um minuto depois que o show acabou (isso é que é profissionalismo!). A tour incluiu a primeira apresentação no Finsbury Park Rainbow, onde tiveram lotação esgotada, e o clímax foi numa festa arranjada pela EMI no Museu de Horrores de Madame Tussaud.

A POLÊMICA: SANCTUARY

Durante a tour a gravadora lançou o single 'Sanctuary', que causou muita polêmica por causa da capa: um Eddie armado de uma faca, tendo a seus pés a vítima: uma Margaret Thatcher (a primeira ministra da Inglaterra na época), que havia arrancado da parede um poster do Iron Maiden. Para o azar da banda, o lançamento coincidiu com pelo menos dois incidentes desagradáveis: importantes figurões conservadores tinham sido espancados por arruaceiros. Deu muita conversa nos jornais e uma ameaça de censura. A gravadora então colocou uma tarja nos olhos, embora ainda ficasse bem visível de quem se tratava. A banda não estava muito atenta a toda esta conversa e sim no seu grande segundo amor: o futebol, torcendo para o West Ham no final da Copa.
(Vale aqui uma nota: se você é fanático pelo Iron e percebeu em várias capas os dizeres 'Up The Hammers!', fique sabendo que não é nenhuma mensagem demoníaca e sim o slogan do West Ham. Nos Estados Unidos muitos ficariam decepcionados ao saber disso. Um fã americano mais radical chegou a tatuar a frase antes de saber do que se tratava.)

Enquanto isso o compacto, que tinha 'Drifter' e 'I've got The Fire' no lado b, chegou ao nª 29 das paradas. Isso queria dizer que seriam convidados para o Top Of The Pops de novo, mas o pessoal da TV estava no meio de uma greve. Para compensar a banda tocou em julho no Marquee para serem filmados num especial sobre a "Nova Onda de Heavy Metal", onde o Maiden era, desnecessário dizer, a atração principal e teve uma cena hilária onde o DJ Neal Kay declarava: "Eu detesto o termo Heavy Metal", ao mesmo tempo em que usava uma camiseta com os dizeres: Heavy Metal Soundhouse!

Depois foram tocar no Reading Festival onde dividiram a noite principal com seus heróis do UFO. A crítica amou, claro: "Iron Maiden provou que são os heróis do Sábado à Noite" escreveu Robin Smith do Record Mirror "Deram um trabalhão danado ao UFO para se equipararem." Também entre os vários grupos que se apresentaram no festival, houve um que se destacou: o veterano Samson, por causa de um cantor muito bom, chamado Bruce Bruce.

E a turma nem teve tempo de respirar direito: nova turnê européia, 40 shows, junto com os americanos do KISS. Foi de matar, pois enquanto os yankees podiam se dar ao luxo de viajar de jatinho de compromisso em compromisso, nossos heróis tinham que enfrentar enormes distâncias num ônibus meio capenga. O crítico Geoff Barton, que escreveu sobre a maratona, conta que parece que só o veterano Dennis Straton aguentou razoavelmente bem o terrível stress.

A tour incluía Itália, Suíça, Noruega, França, Suécia, Dinamarca, Alemanha, Holanda e Bélgica. Muitas bandas iniciantes não teriam aguentado e ficariam felizes em desistir de tudo e voltar correndo para casa. Não o Maiden. Exceto por uma breve estada na Bélgica, nunca tinham excursionado fora da Inglaterra. Ainda assim eles encontraram fãs enlouquecidos onde quer que fossem. Até em cidadezinhas como Leiden, na Holanda, foram recebidos por bandos de convertidos que tinham até bandeiras improvisadas e usavam camisetas com o logotipo do Iron.

Arrebentados de cansaço que estavam, ainda assim conseguiam surpreender. Barton foi um dos que escreveu sobre suas apresentações: "Eles estão tocando com tanta velocidade que periga deles começarem a segunda música antes de terem acabado a primeira". E, a contragosto, era forçado a declarar: "Por mais que isso seja difícil de engolir, tenho que admitir que eles deram muitíssimo trabalho para as atrações principais se equipararem". Nada mal esse comentário vindo de um crítico que amava o KISS ao ponto de se considerar seu "quinto membro"!



Ao contrário do que era de se esperar, o KISS não ficou enciumado com a banda de abertura. Gene Simmons chegou mesmo a entrar no camarim do Maiden e elogiar o disco da banda. "Aposto que você nem o ouviu". Soltou Paul, desconfiado. Gene então se virou para ele e citou o disco faixa por faixa, na ordem correta. Gene chegou mesmo a pedir uma camiseta da banda. Sabendo que o pessoal do Kiss não usava camisetas que não fossem do próprio Kiss, o boca grande Paul mandou essa: "Para que você quer uma, se nunca usa de outra banda?" "É verdade". - Respondeu Simmons - "As pessoas não me vêem usar muito outras que não sejam camisetas do Kiss. Mas se eu tivesse uma que teria o nome de uma banda que vai ser uma das maiores do mundo, eu não me importaria em usar". Falando nisso, as bandas se deram tão bem que o KISS nem se importou quando Maiden jogou tortas na cara deles no palco durante a última noite de turnê...

SURPRESAS, DEMISSÕES E ENTRADAS

Voltando para casa, o Maiden ficou chocado ao saber que Neal Kay tinha sido despedido da Soundhouse. Com seu temperamento irrascível e uma autoconfiança que beirava a arrogância, Kay havia atraído muitas antipatias tanto quanto seguidores. A banda chegou a escrever uma carta de protesto e até incentivou uma greve contra o lugar, mas nada adiantou. Neal Kay então levou seu show para a estrada e se dedicou a descobrir novos talentos.

A banda não teve muito tempo para se lamentar, já que enfrentava novos problemas internos, que nunca ficaram totalmente esclarecidos, em relação a Dennis Straton. Aparentemente Straton estava se afastando demais do resto do pessoal da banda - preferindo viajar com os roadies, quando estava na estrada - além de ter gostos musicais muito diferentes (Straton amava country-rock como os Eagles, p.ex.). Dennis chegou mesmo a mexer em Phantom Of The Opera no estúdio tornando-a mais pop, o que deixou Harris furioso, mandando-o apagar tudo ("Parecia Queen tocando Bohemian Rhapsody ao contrário.") Apesar de, mesmo na época, o próprio Straton admitir que tinha sido um erro, isso só reforçou a idéia de que tinham objetivos e conceitos musicais bem divergentes.

Assim sendo, apesar do guitarrista dizer que estava "110% integrado" isso não foi o suficiente para convencer Steve e Rod numa reunião e Dennis foi convidado a se retirar. Straton saiu para formar o Lionheart, mas deitou na imprensa contra o Maiden, dizendo quão injustamente tinha sido tratado, chamando Steve com frequência de "Sargento Harris".
(Obs. Em muitas biografias, inclusive brasileiras, é dada a informação de que Stratton teria saído por se considerar muito velho para a banda. Tal afirmação não tem nenhum sentido).

Com uma guitarra a menos, o Maiden voltou a procurar o velho amigo de Dave Murray, Adrian Smith. Ambos continuaram mantendo contato através dos anos e Dave chegou mesmo a tocar como convidado no segundo compacto do Urchin, 'She's A Roller'. O Urchin não conseguiu o sucesso esperado e acabou. Smith estava tocando no Broadway Brats, mas andava chateado, sem dinheiro e desiludido (e, de certa forma, como ele mesmo admitiu, com um pouco de inveja do amigo Dave). Apesar de sua notória indecisão, quando recebeu o convite para um teste, não vacilou um segundo. Vinte minutos depois de uma jam o grupo e Rod anunciaram que ele estava aprovado. "Foi ótimo ouvir isso. Me senti como se estivesse sendo aceito dentro de uma família, quase. De fato, a impressão que me passavam era a de que eles eram como uma família. Eles cuidavam uns dos outros e, uma vez que eu estava dentro eu não tinha que me preocupar com mais nada além de tocar. É o sonho de todo músico." (nem tanto: mais tarde ele afirmaria que entrar para o Maiden foi mais difícil do que esperava porque as músicas de Harris eram muito diferentes e mais complexas do que as que estava acostumado a tocar. Ele também sempre tinha sido o cantor e líder das bandas que tocava até então.)

Aqui vale uma nota interessante: se Adrian novamente não estivesse disponível, a banda já tinha outro nome em mente: um velho amigo de Paul Di'Anno, guitarrista do grupo Girl, Phil Collen. Collen pouco depois entraria para o multiplatinado sucesso Def Leppard.

Mais curiosidades para Maidenmaníacos: No breve período que esteve fora do Maiden depois de ter brigado com Dan Wilcock, Dave Murray tocou com o Urchin e eles já apresentavam ‘Charlotte The Harlot' ao vivo naquela época, além de uma canção muito boa, que viria a ser '22 Acacia Avenue'.

A banda já tinha material e datas para gravar seu segundo LP, mas resolveram fazer uma mini-tour para que Adrian tivesse tempo de se entrosar antes de encararem o estúdio. Foi duro para ele. Logo a primeira data foi na Universiade de Brunel tão perto de Londres que atraiu todo o staff da EMI e grande parte dos fãs radicais do East End. Adrian admite que ficou "apavorado", com os nervos à flor da pele com a expectativa. Não precisava: passou no teste com louvor e a dupla Smith-Murray ficaria para sempre na memória de qualquer fã como sendo uma das mais ricas da história do Metal. Curiosamente, vale dizer que Dave costuma ser o mais espontâneo, criando muita coisa de improviso, enquanto Adrian é mais cerebral e costuma compor seus solos antecipadamente. Juntos funcionavam como um relógio suíço.

Para promover a mini-tour eles precisavam de um novo compacto, mas nenhuma das novas composições parecia servir a este propósito. Foi quando sua editora musical, a Zomba, sugeriu que regravassem 'Women In Uniform', do grupo australiano Skyhooks, que tinham tido sucesso na sua terra natal com ela. O grupo gravou-a com 'Invasion' no lado b, sendo que Dennis Straton ainda estava no Maiden. A banda mais tarde renegou esta atitude, dizendo ter sido um erro. Ainda assim o compacto chegou ao número 35 das paradas. Foram chamados ao Top Of The Pops de novo mas deu tudo errado: brigaram com o cara do som que insistiu em colocar o volume muito baixo e ficaram ainda mais aborrecidos quando proibiram a aparição de Eddie naquele horário familiar. O Iron então jurou nunca mais por os pés naquele programa: mesmo com mais de vinte hits nesse meio tempo, eles só voltaram a se apresentar lá depois de quinze anos, em 1995, com Blaze Bayley (quando então tinha mudado toda a diretoria da emissora).
(Obs. Em relação a essa música o Maiden foi um pioneiro, já que chegaram a gravar um vídeo promocional para ela [último trabalho com Dennis Straton]. Isso foi antes da MTV, e a única banda de Rock que tinha feito algo semelhante antes foi o Queen com a famosa "Bohemian Rhapsody'. Nesse aspecto o Maiden estava um ano da frente de todos!)

KILLERS

Depois da tour de novembro, o Maiden correu para o Battery Studios para gravar seu segundo LP, Killers. A banda já tinha tocado a faixa-título no festival de Reading e foi muito bem recebida. De modo que estavam ansiosos para gravar, ainda mais que tinham conseguido ninguém menos do que Martin Birch para a produção. Birch tinha produzido alguns dos mais famosos álbuns do Deep Purple, Rainbow e Whitesnake, entre outros. E, curiosamente, já tinha ouvido falar do Iron Maiden já há algum tempo. A banda teria desejado tê-lo como produtor desde o princípio, mas não tiveram coragem de convidar uma figura tão ligada a seus ídolos logo para o primeiro trabalho. Uma pena pois o surpreendente Birch (Chamado "The Headmaster" [diretor], por causa de sua disciplina no estúdio) lhes comunicou que teria aceito trabalhar com eles já naquele tempo.

Vale a pena citar aqui que a capa de Killers também teria um considerável impacto na mídia. Hoje em dia talvez não passasse de mais um disco de Heavy Metal, mas na época, assim como o primeiro LP, era extremamente original e violenta: um Eddie sorrindo macabramente segurando uma machadinha ainda pingando de sangue, enquanto a vítima (só as mãos ainda segurando a camiseta do assassino aparecem no desenho) agoniza. Essa capa, idealizada por Dave Lights, trazia alguns detalhes só percebidos pelos fãs de primeira hora: o local é uma das ruas do East End (dá pra ver o letreiro do famoso clube Ruskin' Arms) e Charlotte The Harlot observa a cena através da cortina de seu quarto.

O PRIMEIRO VÍDEO

Para finalizar o ano uma equipe da EMI contratou cinegrafistas para fazer o primeiro vídeo ao vivo de uma das novas bandas a aparecer no mercado. Durante um show triunfante no Rainbow o Maiden arrasou, como de costume, mesmo com um exército de ‘camera-mens’ em volta deles. O som falhou na filmagem durante números-chaves como 'Iron Maiden' e ‘Phantom Of The Opera’. Depois que o show acabou, Paul explicou ao público o que tinha acontecido e que iriam repetir algumas músicas e se alguém quisesse ficar, seria bem vindo. Resultado: nem uma única pessoa deixou o teatro até o final! Duas horas de HM de primeira para os alegres sortudos da noite que viram a primeira filmagem de um show do Maiden. A única reclamação era de que o vídeo, de apenas meia hora, era muito curto. Mas quem naquela época, fora os fãs mais radicais, podia prever que o Maiden iria crescer tanto?

Logo depois das gravações a banda tirou o mês de janeiro de 1981 para um bem merecido descanso depois da loucura das tours do ano anterior. As férias foram boas mas não o suficiente para prepará-los para o que estava por vir quando saíram as primeiras críticas do novo LP. A crítica o achou decepcionante em relação ao primeiro e deixou isso bem claro: Robbi Millar da Sounds rotulou Killers de medíocre chamando-o de "mais um fracasso do que um triunfo". E depois foi ainda mais longe, insinuando que o primeiro disco tinha chegado onde chegou somente com ajuda de publicidade.

Outros críticos também não foram muito gentis, embora a maioria não descesse o pau com tanta força. Alguns elogios aqui e ali não tiraram o mal estar do pessoal do Maiden, que ficou muito chateado, principalmente com a história da publicidade, totalmente falsa. Olhando para trás, dá pra notar que Killers não era tão ruim assim, mas em certos pontos os críticos (na época) pareceram ter razão em temer pelo futuro do Maiden. Em Killers as melhores músicas eram, sem dúvida, as antigas 'Wrathchild', 'Drifter' e 'Innocent Exile', sendo que entre as novas apenas a faixa-título se destacou o suficiente para permanecer como clássico da banda. Killers não chega perto do impacto do primeiro disco em termos de versatilidade e originalidade (embora ganhe muito em termos de produção, mas isso se deve ao fato de terem o produtor certo desta vez). Muitos temiam que Steve Harris tivesse usado todas as boas idéias no primeiro disco e não estivesse dando conta de manter o nível de suas composições. O álbum seguinte, The Number Of The Beast, mostraria que essa suposição era um tanto precipitada. Talvez refletindo as críticas, Killers estreou no décimo segundo posto da parada inglesa, bem abaixo de Iron Maiden.
(Obs. A edição brasileira do LP não incluía uma faixa, 'Twilight Zone', erro esse infelizmente repetido quando da edição nacional do disco em CD, só em 98 o erro foi reparado com o lançamento da discografia com faixa-multimídia)

A PRIMEIRA TOUR INTERNACIONAL

Melhor ou pior do que a estréia, Killers foi o disco que serviu de cartão de visitas para a primeira tour realmente internacional do Maiden. A Killers World Tour levou a banda a tocar uma inacreditável maratona de 125 apresentações através da Europa, Japão, Austrália e América do Norte. Em todos, exceto no Estados Unidos, o Maiden seria atração principal. Começou na própria Inglaterra no dia 17 de fevereiro e incluía uma apoteótica apresentação no famoso Hammersmith Odeon, em 15 de março. A estafante tournê com o KISS pareceria um passeio de carro de final de semana comparada a essa tour, mas foi imensamente bem sucedida levando os discos do Maiden a vender pela primeira vez mais de um milhão de cópias.

Na Inglaterra o compacto escolhido foi 'Twilight Zone' para coincidir com a tour e lançado em Março. Tinha sido originalmente gravada como um lado b em potencial, mas a banda gostou tanto que acabou dividindo o crédito de lado A junto com 'Wrathchild'. O compacto chegou ao nª 31 das paradas. Um vídeo com 'Wrathchild' ao vivo no Rainbow teria ajudado as vendas, caso uma nova greve não tivesse ocorrido na TV naquela época.

A turnê européia foi tão dura e rápida que algumas vezes a banda se esquecia ou não sabia onde estavam. Adrian Smith se lembra de Paul Di'Anno tentando falar com a platéia num francês de colégio uma vez: o problema era que estavam na Itália naquele dia! Outra consequência foi a voz de Paul falhar ao ponto da banda ter que cancelar nada menos que dez apresentações: quatro shows finais na Alemanha e todos que deveriam dar na Escandinávia. Para não decepcionar demais os fãs alemães, a banda decidiu dar algumas tardes de autógrafos, onde os garotos ficaram tão entusiasmados que a polícia foi chamada para conter quebradeiras.

MAIDEN JAPAN

A voz de Paul melhorou o suficiente para poderem encarar suas primeiras apresentações no Japão no final de maio.

Aqui vale dizer que a conexão japonesa com o Maiden era antiga. Aconteceu por uma dessas coincidências do destino quando um cara chamado Masa Ito ficou sabendo da existência do conjunto durante a apresentação da banda no Music Machine, em setembro de 1979 como número de abertura do Saxon. Ito, que estava na Inglaterra, ficou impressionado com a performance da banda e, sendo ele uma pessoa de grande renome na mídia japonesa, tratou de dar uma boa cobertura de imprensa sobre o Iron, mesmo antes do primeiro LP ter sido lançado. Essas reportagens despertaram a curiosidade dos japoneses na banda, tanta curiosidade de fato que o LP "Iron Maiden" ganhou o disco de ouro lá e foi o primeiro disco de ouro que a banda ganharia em sua carreira. A importante publicação Player votou o Maiden como sendo a melhor do mundo. Só para se ter uma idéia como tinham fãs na Terra do Sol Nascente, basta dizer que os ingressos para os shows se esgotaram em menos de duas horas. Isso foi em fevereiro, três meses antes da banda tocar por lá!

O grupo fez um exaustivo vôo de 27 horas até o Japão, onde chegaram, como era de se esperar, completamente arrebentados. Mas a recepção foi tão positiva, com fãs seguindo-os por toda parte, com muito saquê disponível para animá-los e todos os shows totalmente lotados, que o grupo acabou passando bem a semana que estiveram ali. Tão bem que acabou resultando num EP, ao vivo, chamado Maiden Japan com as músicas 'Killers', 'Innocent Exile', 'Running Free', 'Remember Tomorrow' e 'Wrathchild'. (obs. A versão inglesa e algumas outras edições tem apenas 4 músicas, tendo 'Wrathchild' ficado de fora. No Brasil o disco foi vendido como se fosse um LP comum e pelo mesmo preço. Pobres de nós!) A produção desta vez ficou a cargo do próprio Maiden (mas principalmente por Harris) e do soundman Doug Hall. O EP dá uma dimensão do estado das cordas vocais de Paul Di'Anno e elas ficariam ainda piores ao fim da turnê.

ENCARANDO A AMÉRICA

A banda tirou dois dias de folga antes de enfrentarem o maior dos desafios: A América. É bom frisar que naqueles tempos pré-MTV, a promoção de um artista dependia muito da programação de rádio. E a música poderosa do Maiden não era o padrão FM que os DJ yankees estavam tocando na época. Apenas quatro estações tinham tocado o primeiro LP, isto entre mais de duzentas rádios espalhadas pelo país. Uma pena, visto o sucesso imenso que as bandas HM tiveram na década de setenta quando Led Zeppelin era simplesmente endeusado pelos americanos, além de Deep Purple, Black Sabbath e outros.

Talvez o imenso fracasso comercial dos Punks pouco tempo antes tenha feito os chefões das rádios pensarem que o gosto do público jovem houvesse mudado e que os adolescentes não gostassem mais de música pesada. Não tinha: Rush, Heart e outras bandas pesadas continuavam a fazer sucesso, embora com muito menos cobertura jornalística do que na década anterior. Mas, tal como na Inglaterra, as vozes das ruas demoraram a ser ouvidas e só quando ficou evidente para todo mundo é que acordaram as gravadoras.

O Maiden encarou o desafio como tinha feito na sua terra natal: com garra e profissionalismo. Abriram shows para o Judas Priest, além de tocarem em dois clubes em Chicago e Detroit e um festival em Milwaukee. Depois foram para o Canadá, onde o primeiro LP tinha se tornado disco de ouro, o que queria dizer que podiam ser a atração principal em lugares como Toronto (em teatros com capacidade de 1500 pessoas), além de clubes em Montreal e Quebec.

As dificuldades eram que a banda já conseguia viajar de avião quando as distâncias eram maiores que 300 milhas (uns 450 quilômetros), sendo que distâncias menores que estas tinham que ser percorridas de carro alugado. O resultado foi que nas alturas do Canadá todo mundo estava moído até os ossos, especialmente os motoristas, que eram o tour manager Tony Wigens e o relutante SmallWood. Eles tinham que sair de uma cidade, chegar na outra até as quatro da tarde para aprontar tudo e ter que sair às sete da manhã. Wigens comentou: "Rod e eu estávamos nos mantendo vivos à base de café puro". Inevitavelmente houve incidentes. Tony estava saindo do palco uma noite, tão cansado que não viu que saía pelo lado errado, onde não tinha escada e levou um tombo de quase quatro metros. Foi levado às pressas ao hospital mais próximo, coberto de hematomas e suspeita de fraturas, mas voltou à tempo para cuidar do equipamento para o show daquela noite.

Smallwood acabou achando que aquela economia não adiantava nada e, relutantemente, concordou em alugar um ônibus para a tour. Tocaram com Whitesnake, Humble Pie, e seus velhos ídolos do UFO depois dos shows no Canadá. A banda estava na Philadélfia tocando seus últimos shows com o Priest quando receberam o convite de tocar com o UFO no Long Beach Arena, na Califórnia, no outro lado do país. O Maiden achava estes shows tão importantes que fretaram todo o seu equipamento para poderem chegar a tempo. Essa atitude custou uma nota preta mas a reação da platéia fez tudo valer a pena.

Vale dizer que o Maiden, que não aceitou a sugestão de modificarem sua música, tornando-a mais "palatável" para tocar nas rádios, tornou-se rapidamente num cult band underground. Killers vendeu por conta da turnê, e chegou a respeitáveis 200 mil cópias (quatro vezes a de 'Iron Maiden"). Por todos os cantos encontravam garotos que os seguiam fanáticamente, comprando ou arranjando camisetas com o logotipo e a figura de Eddie numa velocidade de dar inveja a bandas muito mais estabelecidas. Encontraram um garoto que tinha o logotipo tatuado nos dois braços e outro com uma cabeça de Eddie gravada no peito. Mas o melhor de tudo foi o cara que tinha a capa do single 'Sanctuary' (aquela do Eddie matando a Margaret Thatcher) tatuada no braço, com os dizeres "Up The Hammers" embaixo. Harris contou que quando lhe explicou que aquilo era um grito de guerra de um time de futebol, ele ficou decepcionado. "Acho que ele esperava que isso fosse um tipo de encantamento mágico ou coisa parecida."

Terminada a tour americana, o Maiden voltou à carga na Europa para honrar os compromissos que faltaram devido aos problemas com a garganta de Paul. Tocaram em três grande festivais ao ar livre na Alemanha durante este processo, com Foreigner, Kansas, Blue Oyster Cult, Motorhead e outros. Logo depois atravessaram a ‘Cortina de Ferro’ pra tocar na Iugoslávia, onde o disco Killers também tinha ganho o disco de ouro. Nada menos que 5000 garotos estavam esperando por eles dormindo ao relento durante a noite anterior só para garantir os lugares. Com o dinheiro conseguido por lá, a banda refez os esquemas para se apresentarem na Escandinávia, para honrar as datas canceladas. Seriam as últimas apresentações da banda com Paul Di'Anno.

MUDANÇAS RADICAIS

Boatos sobre as dificuldades do vocalista com o resto da banda já estavam se espalhando desde os problemas de voz que Paul teve durante a primeira parte da tour. Pouco tempo depois que voltaram para a Inglaterra, a Sounds publicou uma matéria de capa: "Di'Anno fora do Maiden". Apesar de dizerem que a separação foi "totalmente amigável" e por diferenças em torno de música e tours, a coisa não foi bem assim. Durante muito tempo aceitou-se como verdadeira a tese de que Paul andava cansado das longas excursões da banda. Essa notícia chegou a ser dada em algumas biografias que saíram até no Brasil. O próprio Paul Di'Anno a negou pouco antes de se apresentar no Brasil em 97 além de acusar Steve Harris de ser o dono da banda, um "fuhrer" (ditador).

O grande problema foi que Paul adorava o estilo de vida rock'n roll. E não cuidava bem do seu instrumento: sua voz. Paul fumava, bebia demais e era largamente indisciplinado. Com isso sua voz sofria e a banda perdia shows importantes e levava a culpa. Os membros do Maiden sabiam se divertir, mas se cuidavam, eram profissionais e tinham orgulho de se apresentar para a platéia um show sensacional, dando do melhor de si. Não é pra menos que ficavam zangados quando um deles podia estragar tudo por descuido. Paul também não tinha a mesma ambição de vencer mundialmente como Steve e se dizia assustado com a proporção gigantesca que o Maiden estava alcançando, sentindo que era muito grande o peso de tanta responsabilidade.

Paul saiu da banda e foi uma grande perda, ainda que por sua própria culpa. Um cantor carismático, com um timbre diferente e marcante. Na sua carreira posterior, mostrou-se tão irregular e errático quanto a vida que escolheu, alternando grandes momentos com outros absolutamente medíocres. Parece que resolveu finalmente fazer algo direito tendo recentemente reunido sua melhor banda, o Battlezone, e lançando em 99 um CD digno do grande cantor que é. Seu trabalho seguinte seguiu a mesma linha, sendo gravado no Brasil com músicos brasileiros. O resultado, Nomad, foi um disco brilhante, talvez seu melhor trabalho pós Maiden.

UMA SUBSTITUIÇÃO FELIZ

O substituto de Paul foi, como todos sabemos, Bruce Bruce, do Samson, que tanto havia impressionado Harris no festival de Reading um ano antes. Ao contrário do que diz a lenda, não foram ouvidos uma série de cantores antes de chegarem a Bruce Bruce, isto é, Bruce Dickinson. Quando Paul saiu, foi o próprio Steve Harris, com sua habitual objetividade que o convidou para um teste. Steve pediu que ele decorasse seis músicas. Dickinson sentiu a oportunidade e não perdeu tempo: decorou 15. No teste tocaram dez direto e dali saíram para o bar mais próximo para comemorar.

Em muitos aspectos Bruce Dickinson era diferente da banda: estudou em escolas particulares e se formou na faculdade em História. Ao invés de se tornar um chato intelectual, Bruce se mostrou perfeito em todos os sentidos para o Maiden: profissional rigoroso, ambicioso, nem um pouco chegado à trips de superstar e com um senso de humor à toda prova. Mais importante: cuidava muito bem das cordas vocais. E que cordas! Dizem as lendas que ele ganhou o apelido de "Sirene de Ataque Aéreo" quando, durante um show do Samson no Chelsea College, ele trincou um enorme globo de vidro com um grito bem colocado.

Paul Bruce Dickinson (ele sempre preferiu usar o segundo nome, mesmo quando criança) teve seus primeiros contatos com o showbusiness logo depois de entrar na faculdade, através do grêmio estudantil, ajudando a organizar apresentações de bandas por lá. Um pouco depois entrou como cantor num conjunto local. "Eu queria tocar bateria" - contaria ele mais tarde - Mas eu nunca tive o dinheiro para comprar uma. - O destino não deixaria Bruce cair no anonimato nem nesses primeiros tempos. Logo uma apresentação com o grupo acabou virando notícia no jornal local. Não tanto pela música, que ainda tinham muito a aprender, mas pelo fato de terem sido atacados em pleno palco por um cidadão que morava por perto e tinha sido acordado por eles. "Ele acertou uma garrafa no guitarrista e chutou o kit da bateria fora do palco. Então eu o ataquei com uma cadeira". - relembra Bruce.

Nos tempos de faculdade, Bruce cantou em duas bandas: no Speed, que tinha teclados e faziam um som estilo Stranglers e no Shots, que era um pouco mais pesado e com quem excursionaria durante boa parte de 1978. Seus exames finais na faculdade puseram uma pausa na carreira com o Shots. Pouco depois seria chamado por Paul Samson, que o tinha visto se apresentar na Soundhouse (sempre lá). Assim, depois de fazer sua última prova da faculdade na parte da manhã, Bruce passou a tarde ensaiando com o Samson. Ele ficaria com eles durante dois anos e meio, gravando três LPs (entre eles o bom Head On). O apelido Bruce Bruce foi dado pelo empresário e se referia a um personagem famoso do grupo de comédias Monty Python. Bruce até recebia seu pagamento em cheques com esse nome.

Mas logo ficou claro que as idéias musicais entre Paul e Bruce iam por linhas divergentes. Samson seguia pelo lado do blues mais tradicional, enquanto que Bruce era obviamente um cantor de HM. Assim, a saída não foi tão difícil no ponto de vista artístico. Infelizmente os processos legais de separação foram muito mais complexos: houve a quebra da gravadora do Samson, a Gem records e má administração dos negócios da banda. Essa confusão legal impediu que Bruce pudesse incluir alguma canção sua no seu primeiro ano no Maiden.

Assim que sua entrada na banda foi tornada oficial, eles partiram para a Itália para fazerem quatro apresentações por lá, apenas para testar a reação da platéia e deixar Bruce se acostumar. Todos os shows lotaram, o público ficou doido como sempre e ninguém parecia notar alguma diferença. Londres seria um teste mais duro. A banda tinha agendado um show no Rainbow, com o Praying Mantis abrindo. Naturalmente, Bruce se deu muito bem. Claro, teve aqueles retrógrados que gritaram de vez em quando um "Tragam Di'Anno de volta!", mas a maioria reconheceu que estavam diante de um grande cantor e aprovou. Depois do show foi dada uma festa pelo Pão-Duro Smallwood em que Paul Di'Anno esteve presente, provando que não havia mais ressentimentos.

Dessa forma, 81 se fechou como um ano de mudanças e muita, muita batalha na estrada. Mas foi altamente recompensador em termos de carreira: mesmo com más críticas e muito por causa dos excelentes shows, Killers chegou ao top 10 de vários países: Inglaterra, França, Alemanha, Japão, Suécia e Bélgica (chegou ao número 80 nos Estados Unidos). E disco de ouro no Canadá, Inglaterra e Japão. Na França se tornou disco de ouro duas vezes. Nada mal. Mas o melhor ainda estava por vir...

A BESTA ESTÁ SOLTA

1982 entrou com a banda gravando seu terceiro LP na carreira e o primeiro com o novo vocalista. E as coisas começaram de forma bem negativa nos estúdios Battery, em fevereiro. Segundo Bruce, os equipamentos pareciam enlouquecer, com luzes acendendo e apagando a todo o momento sem nenhuma razão aparente, com a aparelhagem de gravação deixando de funcionar e ruídos estranhos ocorrendo com amplificadores e instrumentos da banda. Parecia que o grupo tinha mexido com o oculto, como numa das músicas que gravariam por lá e que daria o nome ao novo disco: The Number Of The Beast (como boa parte das canções de Steve Harris, baseado num filme: Omen II [no Brasil: A Profecia 2]).

Como se para confirmar tal loucura, o produtor Martin Birch teve um acidente de trânsito quando dirigia-se para o estúdio numa noite. O motorista do outro carro era um fanático religioso e a conta do mecânico foi 666,66 Libras! Embora pareça uma das várias histórias para promover discos, todos os envolvidos garantem que é verdadeira (tanto as biografias oficiais quanto o documentário Twelve Wasted Years o mencionam como fato): "Aquilo mexeu com a gente e o Martin ficou apavorado." Relembra Steve Harris "Ele fez com que o pessoal arredondasse a conta para 667 libras!"

Apesar de todos esses incidentes bizarros e inexplicáveis, o álbum resultante seria um triunfo e catapultaria definitivamente o Maiden para seu lugar como os reis do novo Metal. Um sinal de que as coisas seriam bem maiores ficou claro quando a banda lançou o primeiro compacto resultante das gravações com a música 'Run To The Hills': nele estava provado que o novo cantor era simplesmente sensacional e que possuía uma técnica e potência à altura do muro de som que Harris & co estavam elaborando.

Como prova, o disco chegou ao número 7 nas paradas de compactos, mesmo com a habitual recusa das rádios de tocar o estilo. Foi a primeira vez que a banda conseguia chegar tão alto em termos de singles. O vídeo que a banda fez para promover o disco também ajudou a torná-los mais conhecidos nos Estados Unidos, já que agora existia a MTV e a necessidade de novos vídeos ainda fazia passar por cima de velhos preconceitos. De qualquer forma o clip da banda mostrava bem que a turma tinha humor, alternando cenas deles no palco e extratos de uma velha comédia de Buster Keaton, tornando mais leve a música, cuja letra amarga falava do massacre que os brancos perpetraram aos índios americanos.

Mas se o compacto já era muito bom, o LP resultante era simplesmente o máximo. Quando foi lançado no dia 22 de março o disco estabeleceu novos parâmetros para o Heavy Metal. Os críticos que temiam que a banda estivesse ficando sem inspiração e que tinha esgotado todas as suas fichas nos dois primeiros discos, ficaram estupefados. A nova fornada de músicas era espetacular: Não tendo mais material antigo para utilizar, as novas composições vieram mais maduras, mais ousadas e com uma nova perspectiva, por causa do vocal mais técnico e poderoso de Bruce Dickinson. Da primeira faixa à última (e principalmente a última, a sen-sa-cio-nal Hallowed Be Thy Name), ninguém tinha dúvidas de que se tratava de um clássico absoluto, tão ou mais surpreendente quanto ao magnífico disco de estréia. The Number Of The Beast lançaria o grupo definitivamente no cenário mundial (leia-se, Estados Unidos).

Até a capa, uma obra-prima, contribuiu, embora não fosse específica. Derek Riggs a tinha desenhado com intenções ao compacto Purgatory, mas a banda gostou tanto do desenho que resolveram deixá-la para o LP. Purgatory então recebeu um outro desenho (uma figura do diabo apodrecendo para se transformar no Eddie) e foi o menos bem sucedido single da banda, chegando só ao número 46 das paradas, fato esse talvez explicável por já se incluir no LP Killes, que todo fã já tinha comprado.

A crítica especializada amou The Number Of The Beast e o colocou no seu devido lugar: um disco tão importante e renovador para os anos 80 quanto In Rock do Deep Purple tinha sido para os anos 70 (uma comparação para grupo de HM nenhum botar defeito). E, só para confirmar, o LP foi direto ao topo da parada inglesa, chegando ao primeiro lugar e ficando lá por duas semanas. The Number Of The Beast bateu Killers em vendas em todos os lugares que foi lançado.
(Obs.: Curiosamente, Steve Harris não considera o disco tão bem assim. Segundo ele mesmo as gravações foram muito corridas, não deu tempo para polir melhor as músicas e que se arrepende de não ter substituído a faixa Gangland por Total Eclipse – que acabou sendo o lado b do compacto Run To The Hills – e de não ter algo melhor do que Invaders para abrir o disco. Imaginem o que seria esse clássico se ele tivesse tido tempo para essas melhoras!)

A banda ficou sabendo das boas novas quando estavam indo da Suíça para Paris e o ônibus tinha quebrado no meio do caminho. Como os roadies já tinham ido na frente para montar o equipamento, o pessoal do Maiden não teve outra alternativa a não ser sair fora e começar a empurrar. Tony Wiggins se lembra da ocasião: "Então lá estavam aqueles caras, cujo álbum tinha chegado ao topo das paradas da Inglaterra, empurrando o ônibus para ver se ele pegava. E ninguém pensou duas vezes antes de fazê-lo. Não houve reclamações, ninguém entrou numa de superstar. Depois que o ônibus voltou a funcionar todo mundo voltou a seus lugares como se nada tivesse acontecido."

Isso aconteceu, claro, na parte européia da "Beast On The Road 1982" , a segunda tournê mundial do Maiden, que iniciou-se em fevereiro e iria até o dia 20 de dezembro daquele ano, cobrindo nada menos do que 18 países e um recorde de 180 apresentações! Foi nessa época que o importante jornal New Musical Express pediu uma entrevista. Vale dizer que o referido tablóide detestava (e provavelmente ainda detesta) rock pesado, sendo formado principalmente por elitistas que nunca viram o HM como algo a se considerar seriamente.



Rod concordou, mas com a condição de toda a entrevista ser na forma de perguntas e respostas (para não haver interpretações por parte do entrevistador) e que estariam na primeira página. Relutantemente o jornal aceitou e mandou um dos mais hábeis entrevistadores que possuíam, na certa esperando encontrar pessoas que não estariam à altura das perguntas. E o cara começou logo com as provocações perguntando sobre a "complacência moral e intelectual" das músicas. Acontece que ele trombou de frente com Dickinson e Harris, inteligentes e articulados, que viraram o jogo a seu favor. Eddie apareceu assim na capa do NME e a entrevista ajudou a abrir muitas cabeças para o novo Metal.

ANDY TAYLOR

Nessa tour Andy Taylor, sempre parceiro de Smallwood, ainda não envolvido diretamente com o Maiden, entrou como co-empresário de forma integral. Andy e Rod são completamente diferentes: Rod mais parece um membro da banda: cabeludo, sempre usou jeans, tênis e camisetas da banda, além de ser famoso pelo humor. Andy, ao contrário, sempre pareceu o típico executivo inglês: alto, gorducho, quase totalmente careca, de óculos e sempre vestindo terno e gravata. Rod é um fã de Heavy Metal, enquanto Andy prefere músicas mais leves para ouvir no carro.

Curiosamente a dupla sempre se deu muito bem, unindo forças e provando que os opostos podem agir para o bem comum (e fazer uma fortuna juntos!). Ambos demonstram um recíproca admiração mútua e, como Rod gosta de lembrar, as aparências enganam: "Andy é um grande cara, sempre foi. Tem uma mente brilhante e cheia de surpresas". Andy Taylor foi ver o Maiden pela primeira vez num show em Newcastle, 1980. Ele apareceu na apresentação de terno e foi parado pelo porteiro, que perguntou se ele sabia quem iria se apresentar ali. Andy Taylor respondeu que sim, que sabia. - Oh - retrucou o porteiro - É que não vem muita gente de terno aqui. - Taylor então disparou essa: "O que demonstra mais ou menos que tipo de relação eu tenho com a banda." Uma das primeiras providências que Taylor cuidou logo que assumiu sua nova função foi tratar de acabar com a pirataria que se espalhava como uma praga envolvendo todo o merchandising da banda. O Maiden tinha orgulho de vender apenas material de alta qualidade para os fans.

A turnê européia foi um sucesso absoluto: embora fosse a primeira vez que fossem à Espanha, isso não os impediu de conseguirem lotar as três noites seguidas que deram em estádios de 8.000 lugares. França, Alemanha, Holanda, Bélgica, Suíça, seguiram-se antes do grande desafio: Os Estados Unidos. Principalmente porque a banda ganhou a fama de satanista por causa da capa e do conteúdo da música The Number Of The Beast. A maioria dos americanos parecia não ter prestado a mínima atenção de que somente aquela canção podia ser considerada de teor demoníaco, e ainda assim era baseada apenas num filme. Harris teve que gastar muita saliva em entrevistas para tentar esclarecer o óbvio: o Maiden não tinha uma linha de pensamento fixa, nem eram adoradores do diabo. Levou muito tempo para conseguirem mudar essa imagem errônea na terra dos yankees.

Um segundo compacto, com a faixa-título, também chegou ao Top 20 das paradas inglesas. O vídeo que vincularam para a música também ajudou e, pela primeira vez, um Eddie de mais de três metros de altura fez sua primeira aparição. Uma pena que o fizessem numa época de Margaret Thatchers e Ronald Reagans: a parte do Eddie foi editada do vídeo, depois que cidadãos conservadores o acharam muito assustador para aparecer na MTV.

BACK IN THE USA

O Maiden começou a parte americana da tour em Michingan, no dia 11 de maio, e seria a primeira de 102 apresentações no continente (com apenas um intervalo para poderem tocar no Reading Festival). The Number Of The Beast ficaria nas paradas da Billboard durante 8 meses, atingindo o 33ª lugar e vendendo só nos EUA 350.000 cópias (o que queria dizer que o Maiden, em termos mundiais, tinha vendido mais do que tudo que conseguiram no ano anterior [1 milhão de discos] em apenas 5 meses!).

Nos Estados Unidos o Maiden abriu shows do Rainbow e do 38 Special, para depois, na condição de 'convidados especiais', dividirem o palco primeiro com os Scorpions (com o Girlscholl na abertura) e depois com o Judas Priest. Para variar, os shows foram excelentes, com o Maiden dando muito trabalho para as outras bandas se equipararem ao seu espetáculo. De nota vale mencionar uma partida de futebol, para relaxar, entre os alemães do Scorpions e os ingleses do Iron que, depois de um jogo muito disputado, terminou num cavalheiresco 0 X 0. Em alguns shows o Maiden tocou na frente de 57.000 (Oakland) e 75.000 (Anaheim) pessoas.

No Canadá, assim como todos os outros países fora os EUA, o Maiden foi a atração principal. Naquele país do norte o novo LP tinha ganho disco de platina e o pessoal do grupo ficou muito feliz em saber que as rádios por ali não tinham tanto preconceito contra Heavy Metal quanto seus vizinhos americanos. Em Quebec tocaram em um estádio com capacidade de 9.000 e o lotaram, apesar da população ser muito menor do que nos Estados Unidos.

De volta aos EUA, novos problemas com o velho assunto: o pessoal da God Squad (Patrulha de Deus) no Arkansas queria que o disco tivesse tarjas avisando sobre a natureza satânica do conteúdo. "As pessoas levaram isso tudo muito além da conta". Reclamou Steve Harris numa entrevista. "Eles acham que se trata de um álbum sobre um tema e isso obviamente não é o caso. Há apenas duas faixas sobre o assunto e as duas são claramente escapistas".

Na mesma entrevista ficou claro que Steve não parecia saber ou se importar com a enorme proporção do sucesso e da fama que o Maiden havia atingido. Para ele as coisas continuavam as mesmas e se considerava um fã de rock, mesmo tendo mais projeção do que as bandas que o inspiraram. "É esquisito." Admitiu Steve "Eu ainda gosto destas bandas e pagaria para vê-los tocar, mas eu me sinto estranho em poder encontrar com eles em termos de igualdade como um músico ao invés de fã. Acho que é por isso que o Maiden se relaciona tão bem com os garotos. Eles devem pensar: se eles podem nós também podemos. Isso faz o sonho ficar muito mais perto."

Harris saiu pela tangente quando perguntado porque tanta gente os compara com o Deep Purple: "Eu não sei ao certo. Martin Birch diz que 'Innocent Exile' têm o mesmo feeling de 'Into The Fire'. Ele trabalhou com eles, então ele deve saber." O entrevistador foi mais longe e tocou num ponto sensível: teria Steve copiado o estilo de palco do baixista Pete Way do UFO? "Eu não quis copiar o Pete." - Respondeu - "mas ele é o único outro baixista que eu posso me lembrar que se comporta no palco como um baixista deveria. Eu sempre pensei que o baixista não deviam ficar ali parados tocando no fundo do palco. Tocar baixo não faz esse efeito em mim - o baixo me faz querer pular o tempo todo."

O Maiden só parou a sua turnê monstro para tocar no Reading Festival, na Inglaterra, o que os fez viajar nada menos que 12000 milhas ida e volta só para um show! mas o festival era importante, tão importante que Bruce admitiu estar "petrificado de medo" só com a expectativa. O equipamento também não ajudou, com nenhum dos músicos conseguindo ouvir o que estavam tocando. Mas foi um sucesso absoluto e serviu para solidificar a fama do Maiden na sua terra natal ainda mais.

Assim que terminaram a turnê americana, que incluiu uma apresentação lotada no Madison Square Garden (junto com o Judas Priest), os incansáveis rapazes partiram para a Austrália. Lá foram recebidos como heróis (era a primeira grande banda inglesa a tocar lá desde o Rainbow seis anos antes) e ganharam disco de platina (por The Number Of The Beast, que vendeu nada menos do que 27 vezes mais do que Killers). Depois partiram para o velho conhecido Japão, mais outro disco de ouro, antes de retornarem para casa para um merecidíssimo descanso. Três semanas inteirinhas sem fazer nada antes de uma nova blitz de gravações e shows.
(Obs.: É justo contar aqui uma história engraçada para se conhecer a figura interessante do empresário Smallwood. Bruce e sua namorada Jane chamaram Rod para uma ceia de Natal na sua nova casa. Não contente em chegar tarde, Smallwood comeu o equivalente a três pessoas e depois tirou um baralho para um joguinho de cartas, a dinheiro, com os convidados. Depois de limpar cada centavo de todo mundo, levantou-se dizendo: "Com licença, tenho que ir, tenho um compromisso" e saiu. Pela primeira vez, desde que entrou para o Maiden, Bruce Dickinson ficou sem fala.)

PIECE OF MIND: A CONQUISTA QUE FALTAVA

1983 começou com uma má notícia para os fãs: Clive Burr saía da banda. Ele deu declarações que estava saindo por 'razões pessoais’ e que pretendia deixar o mundo artístico permanentemente (Obs.: nem tanto. No ano seguinte ele formou o Clive Burr's Scape, que depois passou a se chamar Stratus). Tudo indicava que sua saída foi amigável, chegando a receber o recado de "Boa sorte, companheiro" na capa do Piece Of Mind. Mas não foi bem assim. Somente muitos anos depois é que se soube que Clive havia tido problemas muito parecidos com os de Paul Di'Anno. Na tour americana ele andou exagerando nas festas e nas bebidas e, conseqüentemente, começou a tocar mal. Depois de avisado várias vezes - e continuar se excedendo - a banda teve a dura tarefa de convidá-lo a se retirar. Tão dura que seu melhor amigo na banda, Adrian Smith, sentiu que seria o próximo e tratou de moderar nas festas. "Eu ainda me divertia muito, mas parei de me "socializar" tanto nos dias de apresentações. Além disso, eu estava cansado de subir no palco com dor de cabeça". Clive Burr até hoje se recusa a falar sobre o assunto. Todos lamentaram a perda de um músico tão talentoso, mas a banda não podia comprometer sua carreira por causa de uma pessoa só.

Encontrar um substituto à altura não era coisa fácil (Burr chegou a ser votado na prestigiosa Kerrang! como o terceiro maior baterista do mundo), mas o Maiden tinha em mente um cara muito bom que tocava na banda francesa Trust. O Trust tinha aberto vários shows do Iron Maiden e resolveram checar sobre aquele inglês.

Para a sorte geral, Michael 'Nicko' McBrain, tinha saído pouco antes do Trust e estava pronto para começar outra. Ele era natural de Londres, bem humorado e tinha muita experiência, tocando bateria desde os 12 anos com inúmeras bandinhas de colégio e algum trabalho de estúdio. Sua primeira banda importante foi o Streetwalker, quando tinha 20 anos, antes de tocar com Pat Travers. Foi Billy Day, do Streetwalker que criou seu apelido quando, caindo de bêbado, errou o nome ao apresentá-lo a um chefão de uma gravadora: Neeko. O nome pegou desde então. (seu apelido original era Nicky, desde criança, por causa de um ursinho de estimação. Ele mudou a grafia para Nicko quando o adotou profissionalmente).

McBrain era um músico mais técnico e com uma pegada mais leve do que Burr, mas também tinha uma energia inesgotável. Fã assumido do Maiden e desempregado, ele não perdeu a oportunidade quando lhe foi oferecida a vaga. Mesmo adorando festas e sendo como ele mesmo admite "O mister excesso em qualquer lugar", nunca deixou que isso afetasse sua performance, o que muito surpreendeu o resto da banda através dos anos. Sua alegria contagiante e sua técnica irrepreensível o fizeram perfeito para dar o show energético que Steve Haris havia desejado para o Maiden. A dupla se transformou numa das cozinhas mais imitadas do Heavy Metal.

Logo no início de janeiro a banda foi para Jersey, uma das ilhas do canal da mancha, para ensaios e composições tendo em vista o que seria o LP Piece Of Mind. A turma se instalou no hotel Le Chalet durante cinco semanas, onde alugaram máquinas de vídeo games, uma mesa de sinuca, outra de tênis de mesa e um jogo de dardos para tornar a vida tolerável naquele lugar frio e cinzento. Steve em geral prefere trabalhar sozinho, na tranquilidade de seu quarto (interessantemente ele costuma escrever suas músicas no baixo, daí resultando aqueles riffs característicos). Já Dickinson e Smith costumavam escrever suas canções na sala de ensaios, com amplificadores no talo. O Maiden sempre escreve tudo e faz os arranjos antes de ir ao estúdio. Nenhuma de suas músicas é feita de última hora.

Martin Birch esteve lá nos últimos dez dias para conhecer o material. Derek Riggs também apareceu para trabalhar a arte da capa. De Jersey a turma se mandou para Nassau, nas Bahamas, para gravarem no Compass Studios. As gravações ocorreram de forma regular embora enfrentassem dois problemas. Um era a constante queda de energia cada vez que chovia. Por pouco as fitas de Piece of Mind não foram apagadas num desses blecautes. Outro era a falta de dinheiro: a banda descobriu que lá os cartões de crédito não eram aceitos. Era difícil obter ordens bancárias, que demoravam demais. Assim, com as últimas cinquenta pratas que dispunham, apelaram para as lendárias habilidades de Rod Smallwood nas cartas para conseguir alguma grana. Os membros da banda contam que durante seis noites em seguida ele foi ao Cassino com 50 dólares e voltava com 300! Seis noites em seguida!

O disco que sairia dessas sessões teria a capa mais elaborada de todas até então: Um Eddie lobotomizado, mas raivoso, arrebentando a camisa de força numa cela acolchoada. A capa abria com uma fantástica foto da banda na mesa, pronta para o jantar (um cérebro, cru, com salada). Todos os rapazes tomando vinho, exceto Harris, fiel à sua cervejinha.

A turma resolveu dar o troco aos fanáticos religiosos americanos mandando mensagens "secretas": na contracapa do LP a citação de um trecho das revelações da Bíblia está alterado, com a palavra brain (cérebro) ao invés de pain (dor). Quase ninguém notou na época (o que prova que esse pessoal religioso não presta a devida atenção). Outra foi gravar uma mensagem de trás para frente (entre The Trooper e Still Life, no lado b), com esperança que os otários religiosos perdessem tempo tentando entender o que queria dizer. De fato, Nicko McBrain era quem falava umas bobagens concluindo com a frase: "Don't Meddle Wid t'ings you don't understand" (“Não mexam com coisas que vocês não entendem"). Steve & cia esperavam que muitos desses caras estragassem seus toca-discos forçando-os a tocarem de trás para frente.

Antes do lançamento do LP, marcado para maio, um compacto com a música "Flight Of Icarus" foi lançado. Boa parte dos fãs estranhou: a música era muito "comercial", muito parecida com várias bandas de metal farofa, que começavam a infestar os EUA. É certo que ao vivo ela ficava mais pesada e ganhava alguma vida extra, mas era bem mais 'soft' que todo o material lançado antes em compacto. Foi o primeiro single deles nos Estados Unidos e apesar de ter seu lado comercial, não tocou nas rádios, para variar. Na Inglaterra chegou ao número 11. Talvez por causa dele, o LP entrou no número 3 das paradas inglesas ao invés de ser um número 1.

Piece Of Mind é um excelente disco com algumas canções memoráveis: 'Where Eagles Dare' era um épico com as guitarras propositadamente soando como metralhadoras e, acredite se quiser, levando apenas dois takes para ficar pronta. 'Revelations' seguia a linha de 'Children of The Dammed' e era tão boa quanto. 'The Trooper', 'Die With Your Boots On' e 'Still Life' eram brilhantes canções, cheias de energia e maravilhosamente executadas. Apenas 'Sun and Steel' e 'Quest For Fire', meio fracas, não estão à altura das outras, enquanto que 'To Tame A Land', ainda que musicalmente excelente, não conseguiu ser muito convincente na letra (sejamos justos: como sintetizar um livro complexo, de mais de 500 páginas, como 'Duna' numa música de pouco mais de 7 minutos?).

Ainda que não tivesse o impacto nem a musicalidade revolucionária do The Number Of The Beast, Piece Of Mind seria o disco que abriria definitivamente as portas do Maiden para os Estados Unidos (Talvez por isso Steve Harris viva dizendo que prefere a ele do que The Number Of The Beast). A revista Circus e outras publicações americanas anotaram como as músicas desse disco eram menos "virulentas" do que as anteriores, o que provava a notável ignorância dos críticos americanos ao material do Maiden desde o princípio.

OS EUA SE RENDEM: HEADLINERS NA AMÉRICA

A 'World Piece 83' Tour começou em 2 de maio na Inglaterra. No final do mesmo mês eles começaram o que seria sua primeira tour pelos Estados Unidos e Canadá como atrações principais. Era um passo audacioso, principalmente se levarmos em conta que as rádios continuavam boicotando o Maiden como sempre. Mais desafiadoramente ainda era o fato de Rod e a banda deixarem para lá lugares menores e partirem logo para estádios. Também já levavam seu próprio equipamento de som, o que facilitava uma qualidade mais regular nos shows.

E, como a fortuna sorri aos audazes, eles conseguiram de novo. Lugares como Seattle, em junho (12.000 lugares), Long Beach (14.000) e San Antonio no Texas (15.000!) tiveram lotação esgotada, provando de vez que o Metal tinha um público muito maior do que se imaginava, e a mídia queria. Nessa primeira fase da tour o Maiden teve como abertura o Fastway, e o Saxon como convidado especial. Depois Saxon saiu e Coney Hatch assumiu a abertura.

Mas a tour não foi só um sucesso em termos de estádios lotados: Piece Of Mind entraria na parada da Billboard no dia 2 de junho na posição número 127. Em oito semanas, subiria até chegar à 15ª posição. Lá ficaria durante 5 semanas chegando a subir mais um ponto, o número 14. Ganharia o disco de ouro depois de dez semanas. O sucesso foi tão grande que trouxe até o 'The Number Of The Beast' de volta às paradas, onde voltou no número 79 e também virou disco de ouro. Ao final desse tour The Number Of The Beast se tornaria disco de platina, tendo ficado nas paradas durante 43 semanas.

O RETORNO DO PODER: POWERSLAVE TRIUNFA!

O Maiden voltaria a Londres no final do ano para umas rápidas férias (e o casamento de Steve Harris no dia 29 de dezembro) antes de encararem o habitual estúdio para escreverem e ensaiarem as novas músicas no estúdio Le Chalet. Depois partiram para para Nassau de novo, onde gravariam no Compass Studios e no The Waterloo, sempre com Martin Birch produzindo.

Apesar da capa, mais 'simpática' e menos agressiva de todas até então (o Eddie como o deus egípcio Horos não convence mesmo. Muito menos assusta), o conteúdo era pura adrenalina. Muita gente esperava que o Maiden fosse suavizar seu som depois de Piece Of Mind, mas não podiam estar mais enganadas. Nada de canções 'fáceis' como 'Flight of Icarus': Powerslave era heavy metal em estado bruto do início ao fim, sendo um bloco de sons de difícil assimilação no início.

Músicas como '2 Minutes To Midnight', 'Aces High' e a faixa-título (realmente impressionante) se tornariam clássicos absolutos, com a banda ainda mais entrosada, coisa que parecia impossível. 'Rime Of The Ancient Mariner' era uma extensão lógica das longas faixas épicas de Steve Harris, mostrando influências do rock progressivo, que iria marcar os futuros trabalhos da banda. Embora o restante do material não conseguisse seguir no mesmo nível (bem mostrado na instrumental 'Losfer Words') 'Powerslave' foi para muitos o ápice da carreira da banda, que ostentava um fôlego criativo muito acima da média de seus contemporâneos.

Foi também o "disco da moda" nos Estados Unidos, onde a banda consolidou de vez sua carreira. Nunca mais deixariam de ser a atração principal, onde quer que se apresentassem. O LP tornou-se o segundo a vender mais de um milhão de cópias por lá, atingindo o décimo segundo lugar na parada da Billbord. Na Inglaterra só não chegou em primeiro por conta de uma coletânea que segurou-os no segundo posto.

O disco chegou em boa hora, já que muitos críticos insistiam em dizer que o Metal tinha se esgotado e já dera tudo que podia no início da década. Numa época em que a guerra fria havia voltado com toda a força e o conservadorismo da chamada 'era Reagan' imperavam, o anticonformismo e as letras críticas do Heavy Metal não eram bem vindas de jeito nenhum. Já haviam começado as infames campanhas pela 'moralização' das artes em geral e da música em particular. O Iron viria provar que o Metal continuava vivo e bem. Ignorando os conservadores e fanáticos religiosos, se lançaram à sua mais nova tour pelo mundo.

E a 'World Slavery Tour' seria ainda mais longa que as antecedentes: 300 apresentações em 13 meses, abarcando 28 países no processo. Poucas, muito poucas bandas tão bem sucedidas aguentariam e manteriam a qualidade de som num período tão longo e estafante. Para a sorte dos brasileiros, o grupo concordou em se apresentar no Rock In Rio, apesar do Brasil não estar no programa inicial. Assim, nós sortudos tivemos a chance de ver a banda no auge, ainda que por apenas um show.

SEM PAUSA PARA RESPIRAR

Por melhor que tenha sido a recepção do novo disco e a enorme demanda de ingressos para ver "a última novidade" (nos Estados Unidos), esta quase foi a tour que acabou com o Maiden. Bruce Dickinson sintetizou muito bem o sentimento geral com uma frase: "Esta foi a nossa melhor tour e a nossa pior tour. Quase que nós terminamos de vez”.

A banda foi para a estrada levando um cenário ao mesmo tempo simples e impressionante, que ganhou a aprovação geral da banda, pois servia para qualquer ambiente. Os próprios membros do Maiden consideram que foi o cenário mais bem sucedido deles até hoje e quem viu o sensacional vídeo "Live After Death" (dirigido com rara competência por Jim Yukich) pode conferir. Os shows foram um 'must' para o verão de 1985, onde a banda desfrutava uma fama sem precedentes nos EUA. Todo mundo parecia querer ver a "última moda". Powerslave tornou-se o disco que todo mundo tinha, mesmo que nunca comprassem outro LP do Maiden, como Bruce comentou tão acertadamente. Com isso a demanda para shows extras aumentou de forma assustadora, obrigando a banda a aguentar um esquema ainda mais pesado do que vinham enfrentando até então.

O número de apresentações foi crescendo tanto que Bruce teve que, literalmente, chegar até Rod e ordenar que parassem ou "eu teria pulado fora. Eu acho que foi a primeira vez que eu realmente pensei em cair fora - e não digo só do Iron Maiden, mas desistir até da carreira musical. No final daquela tour eu estava me sentindo como se fosse só uma parte da maquinaria, assim como os fios do equipamento de luz."

Adrian Smith confirma a dureza: "Parecia que ia continuar para sempre... seis meses, tudo bem... nove meses, tudo bem. E então era estendida. (...) Você perdia o ano inteiro, perdia contato com as pessoas... eu me lembro de quando eu fui visitar meus pais quando voltamos para a Inglaterra e eu bati na porta errada! Sério!"

Até mesmo os incansáveis Nicko McBrain e Steve Haris acharam que a coisa estava fora de controle e deram um basta para Rod Smallwood que, sendo um ex-agente, parecia achar que estava mantendo todo mundo feliz enchendo a agenda com novos compromissos.

Da tour resultou o primeiro 'verdadeiro' álbum ao vivo do Maiden: "Live After Death". Um impressionante álbum duplo gravado no Long Beach Arena, durante duas noites das quatro em que tocaram por lá durante a World Slavery tour. Ao contrário da maioria dos discos ao vivo, esse não possuía nenhuma regravação ou melhoria feita em estúdio, como é de costume. Foi gravado quase todo direto num único show, o que o torna ainda mais raro. "Nós queríamos um verdadeiro disco ao vivo, porque é isso que somos, afinal de contas. Uma banda ao vivo”. - Disse Steve Harris na época. Até mesmo o vídeo foi todo filmado usando apenas dois shows, sendo que apenas umas poucas partes do segundo foi usado na edição final, a fim de que o público tivesse uma boa idéia do que seria uma apresentação verdadeira da banda.

O sucesso tanto do álbum (o terceiro a virar disco de ouro em seguida nos EUA) quanto do vídeo, deu o necessário descanso para que a banda se recuperasse da estafante maratona. Mas os efeitos dessa loucura continuariam a afetar a banda por muito tempo ainda no futuro, atingindo principalmente Bruce Dickinson.

CAUGHT SOMEWHERE IN TIME

A pausa que deveria durar seis meses acabou sendo de apenas quatro. Logo a banda estava preparando material para gravar seu sexto álbum de estúdio. O disco mostraria bem a divisão em que a banda se encontrava internamente: enquanto Steve, Adrian e Dave se atiravam de cabeça na mais avançada tecnologia das novas guitarras sintetizadas, Bruce estava interessado em fazer algo mais acústico. Suas composições acabaram rejeitadas pelos outros, embora neguem que fosse pelo fato de serem acústicas. Para piorar a situação, Adrian Smith voltou a escrever suas próprias letras durante as férias. O resultado foi que nenhuma composição de Dickinson entrou no novo disco. Adrian também teve uma música sua, Reach Out, ejetada do álbum por ser muito pop ("parecia Bryan Adams" comentou Martin Birch), sendo aproveitada apenas como lado b de um compacto.

Somewhere in Time foi o disco mais caro que a banda já tinha gravado até então. Baixo e bateria foram gravados em Nassau, guitarras e vocais na Holanda e a mixagem final foi feita em Nova York. Tudo feito sem pressa e com muito cuidado, com a preciosa ajuda de Martin Birch, claro. O resultado foi um disco espetacular, com grandes clássicos do Maiden, como Heaven Can Wait, a faixa-título, e Wasted Years, enquanto Alexander the Great continuava a linha de grandes épicos de Steve Harris. A levada de baixo meio funk de Stranger In A Strange Land era outra surpresa. A capa também é uma obra-prima e revela muito do conteúdo do disco: num cenário futurístico, bem à Blade Runner, um Eddie meio máquina, meio humano, liquida um adversário usando armas de raios, enquanto a banda os observa ao longe.

A recepção do novo trabalho não foi unânime: a crítica se dividiu, uns elogiando a audácia dos músicos e sua tentativa de estender os horizontes do Heavy Metal, outros execrando a "sofisticação excessiva" do disco. Comercialmente, no entanto, foi o LP mais vendido até então, tendo ultrapassado a barreira dos dois milhões de cópias só nos Estados Unidos (alcançou o número 3 nas paradas britânicas). A tour que se seguiu também foi altamente bem sucedida, além de cuidadosamente planejada e, graças a isso, muito menos stressante que a anterior. Ainda assim, Bruce não engoliu totalmente a rejeição de suas composições, embora tivesse escondido bem seus sentimentos na época.

TEMPOS RADICAIS: SEVENTH SON OF A SEVENTH SON

O sétimo álbum do Iron Maiden foi, ao mesmo tempo, um triunfo e uma polêmica. Deve-se apontar aqui que os tempos haviam mudado muito em relação ao Metal. Depois do sucesso imenso a partir do início dos anos 80, muitas bandas que pouco ou nada tinham a ver com o estilo passaram a ser chamadas de metal apenas para aproveitar a moda. Assim, grupos "fabricados" ganhavam a mídia, em geral fazendo um som mais comercial, com letras mais leves e visual mais colorido (as famosas bandas "farofas"). A reação do verdadeiro Metal foi radicalizar totalmente, com bandas de Black Metal, Speed Metal e Trash. Qualquer um que não fizesse um som rápido, violento e cru era tido como vendido. O som do novo Metal fazia a música do Maiden parecer, como o próprio Steve Harris comentou, "quase comercial".

Nada mais injusto. O novo disco, Seventh Son Of A Seventh Son, era ainda mais sofisticado do que Somewhere In Time, com o uso extensivo de teclados na maioria das faixas. Era pesado e melódico como tudo que o Iron Maiden havia feito antes, mas as influências de rock progressivo (o primeiro amor de Steve Harris quando começou a gostar de música) ficaram mais evidentes. Na época muita gente pensava que o uso de teclados era um pecado imperdoável para uma banda de Metal. Na verdade o Iron Maiden esta um pouco à frente do seu tempo e o disco antecipava a rica combinação de Progressivo com Metal, que geraria tantas bandas importantes nos anos 90.

Gravado na Alemanha, no Musicland Studios, entre fevereiro e março de 1988, o disco seria o primeiro desde The Number Of the Beast, a atingir o primeiro posto da parada britânica. Apesar de toda a polêmica por causa do novo som, foi também dele que saíram os compactos mais bem sucedidos da carreira do Maiden, sendo que um deles, Can I Play With Madness, chegou ao terceiro posto da parada e, mais incrível ainda, lá ficou por três semanas. Foi o LP que mais vendeu na discografia do Maiden em termos mundiais. Só nos Estados Unidos o disco vendeu menos ("apenas" 1,2 milhões de cópias). Steve Harris têm frequentemente comentado ser este um de seus discos favoritos. De fato, ele possui um belo número de grandes músicas como a Infinite Dreams, The Clairvoyant e The Evil That Men Do (as duas últimas também chegaram ao top ten da parada inglesa). O disco quase todo falava sobre a vida após a morte e temas espirituais, mas os membros garantem que, assim como Somewhere... “tinha uma temática sobre o tempo, tudo não passou de coincidência, que nada foi planejado”.

A tour que se seguiu foi igualmente bem planejada e mais calma (mas ainda assim carregada: 25 países em 7 meses). Steve Harris, casado e então pai de duas meninas até deu um jeito de carregar a família a partir dessa excursão. Também foi a primeira vez que tiveram um músico de fora dando força, o tecladista Michael Kenney. Kenney, um americano, na realidade era um velho conhecido da banda tendo sido contratado por Steve Harris desde 1979 como o técnico responsável por seu equipamento. No palco ganhou o apelido de The Count (O Conde), por conta de uma ridícula capa escura que usava nas apresentações.

Surpreendentemente, começaram a tour nos Estados Unidos para depois irem para a Inglaterra. Isso porque a banda estava orgulhosa de ser a atração principal no maior festival de rock do mundo o Castle Donnington (que havia superado em prestígio o até então inabalável Reading Festival). Tocaram encerrando a noite depois de Kiss, David Lee Roth, Megadeth, Guns N'Roses e Helloween. Foi uma noite apoteótica: Por quase duas horas 100.000 fãs cantaram com o Maiden seus maiores clássicos (o maior público já registrado no evento, antes ou depois daquela noite), ficaram encantados com a chuva de fogos de artifício no final e continuaram pulando e aplaudindo uma boa meia hora depois que o Iron deixou o palco. Infelizmente a banda ficou arrasada ao saber que dois fãs haviam morrido sufocados na lama depois de uma forte chuva durante a apresentação do Guns. A imprensa sensacionalista se aproveitou disso: futuros festivais foram muito cerceados e tiveram um limite fixo de público determinado pelas autoridades.

Mesmo abalados, os membros do Maiden deram prosseguimento à tour britânica, que deu muito certo. Tão certo que um dos shows, gravado no NEC de Birmingham, virou um dos melhores vídeos de rock de toda a história, o Maiden England. Steve co-dirigiu e editou o vídeo, que foi aclamado por críticos e fãs como ainda melhor do que o clássico Live After Death. Foi também uma das fitas de vídeo mais vendidas no ano de 1989. O que ninguém sabia era que aqueles shows na Inglaterra seriam os últimos com Adrian Smith.

PROJETOS PARALELOS

Oficialmente, 1989 era para ser um ano de "folga" para as atividades da banda, mas os eventos acabaram modificando esta expectativa. Steve Harris se trancou em estúdio para fazer a edição do que viria a ser o vídeo de Maiden England, enquanto Dave Murray cuidava de arranjar residência no Havaí, com sua mulher Tamara. Nicko McBrain então resolveu fazer umas jams com Adrian Smith. Estas jams evoluíram para algumas pequenas apresentações com músicos convidados em bares locais. Depois Adrian resolveu aproveitar músicas suas que não seriam gravadas pelo Maiden para lançar seu próprio projeto solo chamado ASAP (as inicias de Adrian Smith Album Projects).

A idéia foi aprovada por Rod Smallwood que via com bons olhos o plano de promover um membro do Iron nos Estados Unidos e assim conseguir alguma publicidade extra para o grupo. Mas, apesar de ter conseguido até mesmo um grande adiantamento da EMI, o disco foi um fracasso total. Nem uma série de entrevistas, nem uma pequena tour promocional (com o filho de Ringo Starr, Zak, substituindo Nicko) conseguiram atrair interesse. - Aquele material não era pesado o suficiente para fãs do Metal - Explicou o guitarrista. - E o fato de eu pertencer ao Maiden não me ajudou a entrar em outros mercados.

Já a tentativa solo de Bruce Dickinson teria outro caminho e mudaria os rumos da banda dali em diante. Tudo aconteceu meio por acaso quando Rod estava procurando alguém para escrever o tema do filme Nightmare On Elm Street - part 5 e perguntou a Bruce se ele tinha alguma coisa. Bruce mentiu dizendo que sim, achando que isso seria uma boa oportunidade para dar uma força a um amigo seu que andava sem emprego e deprimido: um guitarrista descendente de poloneses chamado Janick Gers.

Janick já havia tocado com o antigo vocalista do Deep Purple, Ian Gillan, mas estava sem trabalho há bastante tempo e pensando em desistir da música para voltar a estudar. Bruce o conhecia de longa data e admirava seu talento. Ambos se encontraram pela primeira vez quando Bruce cantava no Samson e Gers era guitarrista da boa banda White Spirit. Bruce achava que era um desperdício alguém como Gers ficar parado e o chamou para fazerem uma pequena apresentação ao vivo no Prince Trust, em 1988. Em seguida mostrou-lhe o novo tema para o filme. Janick ajudou a acabar a música e ela foi aprovada para a película: a canção chamava-se Bring Your Daughter... ...To the Slaughter.

A gravadora gostou tanto da música que sugeriu fazerem um álbum com material parecido. Bruce achou boa a idéia de fazer algo diferente do Maiden e topou na hora, embora não tivesse nenhuma outra coisa pronta. Em duas semanas fizeram tudo "as duas semanas mais rápidas da minha vida" - diria Janick: entre originais e covers, Tatooed Millionaire, foi lançado e provou que Bruce podia viver sem o Maiden. O cover de David Bowie "All The Young Dudes" chegou ao top 20 da Inglaterra. Bruce conseguiu mesmo arranjar uma mini-tour de quatro semanas nos Estados Unidos com Gers, mais o baixista Andy Carr e o baterista Fabio Del Rio. Não tocaram nenhuma música do Maiden, preferindo outras covers como 'Black Night' do Deep Purple e 'Sin City' (AC/DC).

Curiosamente, a música que iniciou todo esse processo não está incluída em Tattoed Millionaire. Quando Steve Harris ouviu a gravação gostou tanto que tratou de convencer Bruce a incluí-la no disco seguinte do Maiden. Bruce naturalmente ficou com o ego massageado e topou. Apenas a versão americana do disco do filme incluiu uma versão solo (com Janick Gers) de Bring Your Daughter to The Slaughter.

MUDANÇAS RADICAIS

O disco seguinte seria gravado na Inglaterra (o primeiro desde The Number Of the Beast), usando o estúdio móvel pertencente aos Rolling Stones, instalada num galpão ao lado da mansão de Steve Harris, em Sussex, no início de 1990. Antes que as gravações começassem, no entanto, aconteceu outra baixa no Maiden e das mais sérias: Steve Harris conta que a banda questionou Adrian Smith, dizendo que ele não parecia feliz em estar no grupo. Adrian confirma que estava chateado com a idéia de gravarem um disco "de volta às bases" ao invés do material mais sofisticado que andavam fazendo nos dois discos anteriores.

Também tinha gostado de ter completo controle no seu projeto solo, de voltar a cantar e compor todo o material. Sentindo que não estava 110% integrado no grupo (um pecado para Steve Harris e que já havia custado o mesmo posto à Dennis Stratton), banda e guitarrista acharam melhor não começarem disco e tour nesse clima. Adrian estava fora. Apenas uma música de Smith entraria no novo disco (a diferente Hooks In You).

Como as gravações iam começar logo, Bruce Dickinson sugeriu o nome de Janick Gers para o posto vago. Janick foi chamado, fez uma audição relâmpago (onde tocaram The Trooper, Iron Maiden e The Prisioner) e deu tão certo que Steve Harris declarou que ele estava aceito e que as gravações começariam no dia seguinte. Gers ficou pasmo, mas era verdade. No dia seguinte começariam a gravar o novo disco do Maiden, intitulado No Prayer For The Dying.

Martin Birch estava produzindo novamente, mas o resultado foi bem diferente. Gravado rápido e sem usar a vasta tecnologia dos dois anteriores, No Prayer For The Dying, soa como uma demo bem produzida. O grupo tentou fazer o som sair mais ao vivo possível, como se fosse num show. As críticas variavam muito, alguns gostando outros detestando, mas muito poucos adorando. Sem dúvida houve uma grande perda com a saída do elegante estilo de Adrian Smith e sem tempo de Gers se adaptar devidamente. Ainda assim o disco tinha seus momentos, com Steve Harris escrevendo algumas de suas melhores letras. O lado progressivo também não ficou totalmente de fora em canções como a faixa-título e Mother Russia. Outro destaque foi a hard rock esperto Holy Smoke (com a letra descendo o pau nos pregadores televisivos), que chegou ao top 10 das paradas inglesas em setembro de 1990. A grande surpresa, no entanto, foi Bring Your Daughter to The Slaughter: seria o primeiro compacto da carreira do Maiden a atingir o primeiro posto na Inglaterra, apesar da letra algo pesada com seu humor negro de filmes de terror. Fato ainda mais extraordinário se levarmos em conta que a rádio estatal inglesa, BBC, se recusava a tocar o disco em horários "familiares".

Lançado no dia primeiro de outubro de 1990, o novo disco alcançou o segundo posto da parada inglesa e se deu bem no resto do mundo, exceto nos Estados Unidos, onde, apesar de ganhar disco de ouro, vendeu apenas 500.000 cópias (uma queda considerável se levarmos em conta os cinco discos de platina consecutivos anteriores). Os americanos andavam, como se veria, recusando tudo que representavam os anos 80 em troca de um som mais largadão, produzido basicamente em Seattle: o Grunge.

A banda iniciou nova tour, com um palco mais simples e básico, seguindo a nova filosofia contida no disco. A boa surpresa para os fãs foi ver que Janick Gers era um animal no palco, animadíssimo. Isso acabou contagiando o resto da banda e até o tímido Dave Murray. Mas o maior desafio que a banda iria enfrentar em sua carreira ainda estava para acontecer.

FEAR OF THE DARK

Os anos 90 não foram bons para a turma que fez a fama na década anterior. O cenário Heavy Metal estava sendo tomado pelas bandas trash (Metallica, Slayer, Megadeth, etc.) e a moda do som Grunge (Nirvana, Perl Jam, Soundgarden) atingia não só os Estados Unidos, mas boa parte do mundo. O hard rock e o metal tradicional começaram a ser encarados como "coisa ultrapassada". Ricos e famosos, o pessoal do Maiden podia ter simplesmente pendurado as chuteiras e viver de renda. Ao invés disso encaram as mudanças e foram em frente. Lançaram Fear Of The Dark, em maio de 1992. Bem mais entrosados com Gers agora e com uma nova fornada de canções fortes, o novo disco estreou no posto número um da parada britânica (a terceira vez que a banda conseguia este feito). Pouco antes o potencial do novo disco era mostrado com o sucesso de um single rápido e pesado: Be Quick Or Be Dead (chegou ao número dois das paradas).

Para os fãs de longa data a novidade inicial era a capa: a primeira sem Derek Riggs. A banda estava achando que o Eddie precisava ser renovado e por isso escolheram o desconhecido Melvyn Grant para o trabalho. O resultado foi algo muito parecido com as anteriores, mas sem o humor nem a classe de Riggs. "Era apenas nossa tentativa de fazer algo novo" Diz hoje Harris dando os ombros.

O disco no entanto continha um bom material: doze faixas inéditas gravadas no novo estúdio de Steve Harris, instalado em sua casa de Sussex. Com a nova tecnologia de CDs o grupo resolveu aumentar no número de músicas. O resultado foi consideravelmente superior ao No Prayer For The Dying, com músicas certeiras como Be Quick Or Be Dead, a épica faixa título, a balançante From Here To Eternity e até uma balada, Wasting Love. Havia um pouco de tudo no disco e parecia que o Maiden havia se acertado afinal na nova década. Só parecia. Para um bom observador a letra de Wasting Love começava com uma frase que parecia dizer como andava o espírito de Bruce: "Talvez algum dia eu me torne um homem honesto / Até agora eu estou fazendo o melhor que posso..."

A tournê promocional de Fear Of The Dark começou na Escandinávia , em maio, e continuou por boa parte do verão europeu, sendo que muitos shows foram gravados já que a banda teve a idéia de lançar um disco ao vivo no meio da tour. Um dos melhores momentos que tiveram foi quando se tornaram pela segunda vez a atração principal do festival do Donnington Castle. Embora com menos estrelas que em 88 (Skid Row, Sepultura e Thunder), o Maiden surpreendeu a todos com um show ainda melhor do que aquele. Todo ele foi filmado para um disco ao vivo e vídeo para serem lançados no ano seguinte. O público era menor e mais controlado, devido aos tristes acontecimentos da vez anterior, mas a animação foi total e o sucesso imenso.

Mas havia pelo menos uma pessoa na platéia estranhando aquilo tudo: Adrian Smith. "Me senti esquisito vendo a banda tocar músicas que eu escrevi e participei" - comentou Adrian. O pessoal do Iron no entanto o chamou para a última música e tocaram juntos "Running Free". Pouca gente então podia acreditar ou sonhar que aquela formação completa, com três guitarras, iria se reunir de forma permanente muitos anos depois. Infelizmente o vídeo Iron Maiden At The Donington Castle, que apareceria tempos depois com a espetacular apresentação, seria o pior de toda a filmoteca do Maiden: cheio de efeitos esquisitos, muitíssimo mal dirigido, câmeras que corriam de um lado para o outro , não parecendo saber o que filmar, cores entrando e saindo como se o videocassete estivesse defeituoso. Lamentável.

A primeira parte da tour terminou no dia 4 de novembro, no Japão. A idéia era tirar dois meses de férias, durante os quais Steve Harris cuidaria de fazer a mixagem do disco ao vivo e lançá-lo a tempo de pegar a segunda parte das apresentações, no ano-novo.

INSATISFAÇÕES INTERNAS

Apesar do sucesso de Fear Of the Dark e do triunfo no Donington Castle. Bruce não andava feliz da vida: "Eu estava entediado e desesperado para fazer alguma coisa diferente" e se ressentia de "ter que me adaptar sempre aos moldes do Maiden". A situação não melhorou nada com as férias forçadas por conta do trabalho de mixagem de Steve Harris. Bruce já tinha começado suas atividades extra Maiden há algum tempo, lançando dois livros de ficção, praticando esgrima com dedicação e trabalhando ocasionalmente em Rádio e TV como apresentador. Quando durante o intervalo da tour recebeu um convite da Sony Music para fazer uma continuação de Tatooed Millionaire, não foi preciso que pedissem duas vezes.

Fez algumas gravações na Inglaterra com os membros do grupo Skin atuando como acompanhantes, mas achou que não ficaram boas. Bruce então se mandou para os EUA, indo trabalhar com o produtor Keith Olsen, nas demos do que seria seu segundo disco solo, Balls to Picasso. Segundo o próprio, Bruce andava decidido a fazer um disco diferente, explorar novos sons e se arriscar mais. Depois que começou as gravações percebeu que suas idéias estavam indo para muito longe de tudo que fazia no Maiden. Uma das faixas que gravou nessas sessões "Original Sin", que falava sobre seu relacionamento com seu pai, se tornou um momento de decisão para ele.

Vendo que não poderia dar tudo o que tinha no Maiden (e que este não iria mudar o seu som por sua causa), achou que era hora de sair. Mesmo sabendo que era um tremendo risco tanto financeiro quanto artístico, Bruce resolveu seguir seu caminho. Depois de muito pensar, contou a novidade para Rod Smallwood, que tinha ido visitá-lo em Los Angeles. Rod decidiu que ele daria a notícia aos outros.

Embora a decisão estivesse tomada, Bruce e a banda se viram numa situação difícil: e o resto da tour? Praticamente todos os ingressos já estavam vendidos, as datas marcadas, locais alugados, etc. Deveriam cancelar tudo e decepcionar os fãs? Segundo Steve Harris a proposta era de que Bruce daria tudo na tour, sem problemas, se eles quisessem honrar os compromissos. Embora a saída do vocalista não tivesse pego Steve totalmente de surpresa, a hora não poderia ser pior: Steve estava passando por um processo de divórcio e andava muito deprimido. Chegou mesmo a pensar em desistir de tudo e encerrar a carreira e banda quando soube da novidade sobre o vocalista. Mas recebeu muito apoio do resto do grupo, especialmente de Dave Murray, que segurou as pontas e o encorajou a continuar.

"Mas, mesmo assim, eu falei: como fazer a tour e olhar nos olhos do público, quando eles sabem que há uma pessoa ali que não gostaria de estar ali?" Relembra Steve. Rod garantiu: 'Ele disse que quer fazer a tour, vai dar tudo por ela e que deixará a banda no final. E que será um bom encerramento’. Steve acabou concordando mas, como ele próprio diria mais tarde: "Claro que hoje eu me arrependo disso”.

O restante da tour foi um período difícil para todos, para dizer o mínimo: houve muita polêmica sobre as atuações de Bruce. Segundo o pessoal do Maiden (menos Janick Gers) e várias testemunhas, Bruce estaria se esforçando apenas em shows mais importantes, sendo que algumas vezes nem cantava direito, simplesmente ruminando ao microfone. O tour manager Dickie Bell se lembra: "Quando ele estava bem, ele era muito, muito bom. Mas quando ele estava mal, ele era horrível. Ele nem se importava em cantar algumas partes, tanto quanto eu pude perceber. Bruce era sempre o último a chegar para o show e o último a deixar o camarim para ir para o palco, o que, pela minha experiência, era sempre um mal sinal. Eu comecei a achar, simplesmente, que a hora tinha chegado para ele sair. Ficar por ali não estava fazendo bem a ninguém."

Bruce nega tudo, embora admita que ficou numa posição difícil, como frontman. "Eu não iria colocar uma máscara de cara feliz. Provavelmente eu fui ingênuo em ter me colocado naquela situação, mas eu estava tentando. Eu tentei o melhor de mim mas eu vi que não dava para ser a mesma coisa. Em algumas noites, por mais que eu tentasse, realmente não dava. Um concerto de rock deveria ser uma celebração e não um velório". O clima ficou tenso, com o profissionalismo, Harris louco para torcer o pescoço de Bruce e o resto da banda ressentida com todo o affair. Assim sendo, todo mundo ficou aliviado quando a tour finalmente acabou. A última apresentação do cantor com a banda seria num especial para TV, Raising Hell (que depois viraria vídeo), com a presença do mágico performático Simon Drake, em agosto de 1993. A presença do teatral Drake deu um sabor diferente, sem dúvida, mas a performance em geral deixou muito a desejar (é óbvia a divisão entre Bruce e os demais. Ele só se arrisca a brincar com Janick Gers). Apesar de uma estupenda versão de Transylvania, de todos os truques de ilusionismo e do humor negro do convidado especial, é um vídeo melancólico e não acrescentou muito na carreira da banda.

Naturalmente lidar com a imprensa não foi fácil: antes de começar a segunda parte da tour, uma coletiva anunciou a separação usando o velho termo de "diferenças musicais". Depois que acabou a excursão e Bruce saiu, começou a esperada troca de farpas, com o vocalista tentando se afastar o máximo possível da sombra do Maiden. Mas nada do que foi dito, ou justificado, retirou a impressão (muito incômoda para ambas as partes) de que eram perfeitos um para o outro. Bruce mesmo deixaria escapar numa entrevista: "Eu acho que basicamente as coisas se desgastam depois de um tempo, especialmente dentro de uma banda. Quero dizer, ficamos juntos 12 anos e eu penso que algumas vezes eu deveria ter saído em 1986, antes de Somewhere In Time, sabe? Mas isso agora é passado”.

NOVO VOCALISTA?

No meio de toda a confusão com a saída de Bruce Dickinson da banda a boa notícia foi a chegada de dois discos ao vivo (ambos da primeira parte da turnê Fear Of The Dark): A Real Live One (com músicas da fase pós 1985) foi lançado em 22 de março de 1993, e A Real Dead One que seguiu em 18 de outubro do mesmo ano (com material mais antigo). Dos dois o primeiro é, de longe, o melhor, pois pegou muito bem a fase pós Powerslave e tem algumas interpretações muito inspiradas. O segundo deixou a desejar: Bruce Dickinson e a banda estão longe de conseguir performances tão boas quanto Live After Death. Mas ambos se deram bem nas paradas, os dois atingindo o top 10 da Inglaterra. (na versão mais recente da discografia do Maiden os dois foram juntados num CD duplo).

A maior novidade desta fase foi a notada ausência do produtor Martin Birch. Birch, depois de 25 anos produzindo disco após disco, achou que estava na hora de se retirar de cena como um todo, e não só do Maiden. "Eu já tinha tomado a minha decisão na época da saída de Bruce, e uma coisa nada tinha a ver com a outra” - comentou ele - "De fato, já no Fear Of The Dark eu fiquei pensando que talvez fosse a hora de uma mudança de produtor para eles. Mas uma vez que eu comecei o trabalho, eu mergulhei de cabeça nele. Eu adorei cada minuto e acho que ficou um álbum muito bom”. Mas assim que terminou o trabalho, Martin perguntou a Steve Harris se não estava na hora de mudarem. Na verdade Martin já queria parar completamente: "Naquele ponto, eu achava que já tinha tido o bastante de produzir discos. E pouco depois parei de trabalhar na área. Eu senti que se eu não queria ir para o estúdio, então não seria justo para eles eu ficar forçando. Eu não queria dar menos do que 100% para Steve e o Maiden. Nós fizemos álbuns durante anos juntos, mas chega uma época em que você tem que seguir outro caminho”.

Steve Harris andava trabalhando muito no estúdio em anos recentes e havia aprendido bastante com o mestre. Nada mais natural que ele assumisse a nova função, com a ajuda de um fiel escudeiro, o engenheiro de som Nigel Green (que vinha trabalhando há anos nos discos do Maiden). Harris confirma: "Martin queria se aposentar e fazer suas próprias coisas e jogar golf. Eu já estava basicamente co-produzindo os dois últimos discos do Maiden com Martin, então eu sabia onde eu estava entrando. Foi um crescimento natural, mesmo”.

Mas o problema mais sério continuava: como substituir alguém como Dickinson, alguém que tinha se tornado tão lendário quanto seus heróis Ian Gillan ou Ronnie James Dio? A banda anunciou que estava procurando um novo cantor e foi, literalmente, inundada de fitas, vídeos e CDs de candidatos de todo o mundo. Steve Harris garante que ouviu todo o material, mas já estava de olho num vocalista desde o princípio. Um cara que cantava numa banda de Birmingham, que havia aberto alguns shows do Maiden na Inglaterra em 1990, chamada Wolfsbane.

Blaze Bayley (nome verdadeiro: Bayley Cook) já tinha sido convidado a fazer um teste logo depois da saída de Bruce, mas ele recusou inicialmente ao convite, já que sua banda tinha sua própria tour agendada e um disco ao vivo para ser lançado. Blaze agradeceu dizendo que estava lisongeado com a oferta. Steve entendeu perfeitamente: ele muito apreciava pessoas leais às suas bandas. Mas Blaze logo se arrependeu, sentindo que o Wolfsbane nunca seria um grande sucesso (já tinham lançado quatro álbuns, um EP e alguns singles), conseguindo sempre boas críticas, mas pouca vendagem. A gota d'água aconteceria com o novo disco de estúdio, onde o Wolfsbane estava se afastando do Heavy Metal e Blaze sentiu que "não havia mais lugar para uma voz do meu tipo." Ligou então para Steve para saber se ainda procuravam um novo cantor.

Naquelas alturas o Iron só tinha um outro candidato: um cantor novo muito bom chamado Dougie White. A banda resolveu deixar que ambos cantassem duas músicas do Maiden com a voz de Bruce retirada para ver como se saíam. Apesar de Dougie ter uma voz muitíssimo mais privilegiada e ser mais técnico, ficaram com Blaze. Uma das decisões mais polêmicas (ou desastrosas, dependendo do ponto de vista) da história do Metal. White mais tarde entrou para o Rainbow e quem quer que tenha ouvido o disco que ele gravou com o grupo de Ritchie Blackmore, Stranger In Us All, deve ter se perguntado se o pessoal do Maiden realmente tinha se dado ao trabalho de ouvi-lo cantar.

DISCO INTROSPECTIVO E CRÍTICAS

Blaze foi anunciado oficialmente como membro do Iron Maiden em janeiro de 1994. E logo partiram para a produção do novo disco, a ser chamado The X Factor. As gravações ocorreram no estúdio da casa de Steve Harris, agora ainda mais bem equipado e batizado como "The Barnyard" (o celeiro). O CD seria lançado em outubro de 1995, sob muitas expectativas. Depois de um ano dando duro no trabalho, a banda ficou bastante confusa e magoada com a chuva de críticas que o disco recebeu assim que foi posto no mercado.

Harris particularmente o considerava um dos "três melhores trabalhos da banda - os outros dois seriam Piece Of Mind e Seventh Son of A Seventh Son". No entanto, desde Killers que a imprensa do Metal não malhava tanto o Maiden. E isso incluía críticos que eram fãs do Maiden, como David Ling, que não pouparam o disco, mesmo três anos depois: "Pessoalmente eu achei o CD um grande erro. E eu ainda acho isso." Apenas na França e na Alemanha, onde o disco ganharia prêmios de álbum do Ano, as opiniões foram melhores.

The X Factor é, sem dúvida, o disco mais sério e "adulto" do Maiden. Não há historinhas de terror nem ficção científica, muito menos bom humor. Da capa até a última faixa, tudo reflete o momento difícil que passava a banda, especialmente Steve Harris. Ainda abatido pelo doloroso divórcio de sua mulher Lorraine, que tinha sido sua namorada desde a adolescência, e com quatro filhos pequenos para cuidar, Steve não se sentia nada à vontade para escrever canções animadas. "Foi provavelmente o período mais difícil que tive que encarar na minha vida" - Admitiu ele mais tarde - "Não fosse pelo Dave (Murray) e os outros rapazes da banda terem me dado tanta força eu não sei se teria me recuperado".

Assim sendo não é nenhuma surpresa que as músicas do principal compositor tenham saído algo amargas, muito pessoais e introspectivas. Era um disco mais para si mesmo, para poder exorcizar seu demônios. Mesmo as músicas em parceria com Blaze ou Gers pareciam "contaminadas" pelo mesmo tom. Em Judgement of Heaven a letra não podia ser mais explícita: "Senti vontade de me suicidar uma dúzia de vezes ou mais / mas este é o caminho fácil, o caminho do egoísta / a parte mais difícil é levar sua vida adiante". A parte musical seguiu o clima das letras, sendo que muito raramente se via toda a força explosiva do Maiden. Visto por este ângulo não é também de surpreender que o primeiro single lançado para promover o CD tenha sido a única música que Steve não escreveu ou co-escreveu no disco: Man On The Edge (De Gers e Bayley), a mais "pra cima" (musicalmente) de todo o X Factor.

O single se deu bem nas paradas, chegando ao décimo posto e permitindo a volta do Maiden ao Top Of The Pops. A banda, mais flexível, até aceitou fazer mímica para o playback (só Blaze cantou ao vivo). Mas o álbum não foi tão bem, chegando apenas ao oitavo posto, o primeiro desde Killers a não chegar no top cinco. A banda ficou chateada, claro (exceto Blaze, que nunca tinha ido tão longe em sua carreira até então). Mas Rod Smallwood mesmo admitiu que o disco era "muito sombrio" para ser um sucesso popular. Steve insiste que, pelo menos para ele, o disco é um dos seus melhores: "eu gosto que ele leve mais tempo para você se acostumar. Os melhores discos geralmente são assim". De fato, X Factor têm sido reconsiderado por muitos críticos com o passar dos anos. Mas na época pegou mal.

O Iron Maiden sempre gostou de tocar em lugares diferentes e abrir novos horizontes. E, claro, acharam que seria bom começarem a primeira tour com Blaze indo para onde nunca tinham tocado antes, a fim de que o novo vocalista pudesse ir se acostumando: até então Bayley nunca tinha feito tours com mais de três semanas de duração. E o Wolfsbane só tinha tocado dentro da Inglaterra. Assim sendo a banda começou a tour com três shows em Israel, três na África do Sul, antes de seguirem para o leste europeu, tocando na Bulgária, Eslovênia, Romênia e Tchecoslováquia. A tour começou no dia 28 de setembro de 1995 e terminou quase um ano depois, em 7 de setembro de 1996, abarcando meio mundo e tocando inclusive no Brasil, onde a banda pode lotar o estádio Pacaembu em São Paulo. O Iron adorou: enquanto que nos Estados Unidos eles ficaram em lugares menores, entre 1.500 e 2.000 lugares, devido ao mercado ruim para o Metal, aqui eles puderam tocar para 55.000 pessoas numa única noite.

Por melhor que pudesse parecer o quadro - o que não era o caso - um problema continuava: Blaze tinha sido mesmo a melhor escolha? Ficou na cara que o novo cantor era um cara extremamente simpático, bem-humorado e modesto. Era inclusive um vocalista muito bom, mas para uma banda como o Maiden, muito bom não era o bastante. Tinha que ser brilhante.

Nessa tour ficou claro que Bayley podia dar conta do novo material, mas não convencia nos clássicos. Muito diferente quando Bruce substituiu Paul Di'Anno. Mas, pelo menos por hora, a banda deu apoio total ao novato e insistiram Run To The Hills tinha sido tirada não porque o cara não conseguia cantá-la, mas somente porque tinha sido o primeiro hit com Bruce. Poucos acreditaram.

ENQUANTO ISSO...

O Maiden tentava ainda convencer com a nova formação. Para sua sorte, ou azar, o cenário mundial do metal começava a mudar de novo: o som de Seattle começou a decair enquanto bandas metálicas de todas as partes do mundo (e que tinham sido direta ou indiretamente influenciadas pelo Iron) começaram a aparecer fazendo justamente o metal rápido, pesado e melódico que era a raiz do Maiden, apenas com uma ótica e tecnologia mais anos 90.

Mesmo nos Estados Unidos a cena musical foi lentamente mudando para um som mais pesado (o chamado Alterna Metal): Machine Head e Korn, entre outras, estreavam nas paradas. Muitas bandas antigas que tinham tentado mudar o seu som (e se dado muito mal), voltaram a fazer o que sabiam fazer de melhor. Aí incluídos alguns antigos relacionados do Maiden.

Dennis Straton, depois de formar e ter algum sucesso com o seu Lionheart, sumiu de cena até o início de 1990, quando participou junto com o velho Praying Mantis (acrescentado temporariamente com Paul Di'Anno) para as comemorações dos dez anos da NWOBHM. Fizeram uma tour muito bem sucedida pelo Japão, lotando todos os lugares onde tocaram e gerando um disco ao vivo: "Praying Mantis featuring Paul Di'Anno and Dennis Straton Live In Japan", que chegou ao top dez japonês. Paul e Dennis conseguiram reativar suas carreiras, mas outros não se deram tão bem: Doug Sampson se tornou motorista de empilhadeiras e Clive Burr, que se recusa a falar com a imprensa, diziam estar ganhando a vida como taxista.

THE BEST OF THE BEAST

O Maiden, pego no meio da "nova nova onda" do novo Metal, resolveu lançar pela primeira vez uma coletânea oficial, enquanto dava um tempo para o decisivo segundo trabalho com Bayley. The Best Of The Beast, um CD duplo, lançado em novembro de 1996, foi saudado por público e críticos, ainda que apenas por motivos saudosistas.

Certamente qualquer "maidenmaníaco" deve ter ficado felicíssimo de ver algumas faixas raras incluídas, especialmente a versão original de Strange World (gravada na sessão de Soundhouse Tapes, mas excluída do vinil. Paul canta maravilhosamente desafinado). A prensagem inicial incluía um belíssimo encarte com fotos raras e letras. Também trazia, como atrativo extra, uma música nova (e muito boa): Vírus.

Gravada em setembro de 1996, nos estúdios de Steve Harris, essa peça de 6 minutos era a resposta de Steve para os críticos que malhavam a banda impiedosamente havia um ano. Na frente de uma base poderosa, Blaze cuspia a letra que ele e Steve haviam escrito: "Eles querem afundar o barco e partir / o jeito que eles riem de você e eu / você sabe que isso acontece o tempo todo". O CD, mesmo duplo, foi o décimo quarto trabalho do Maiden a vender mais de um milhão de cópias em seguida.



A turma então resolveu tirar uma folga: entre gravações e tours tinham sido já dois anos com Blaze. Levaria alguns meses para que o grupo se reunisse novamente na mansão de Steve para iniciarem as composições e ensaios do novo disco.

BRUCE E ADRIAN

Bruce Dickinson enquanto isso se manteve durante um bom tempo distante do Heavy Metal em geral, e de qualquer ligação com o Iron Maiden em particular. Mas depois de dois discos meio esquisitos, Balls to Picasso e Skunkworks, finalmente percebeu que sua praia era mesmo a música pesada. Ambos os CDs eram válidos como experimentos, mas não convenceram nem os fãs antigos, nem conquistaram novos mercados.

Em paz com o passado, casado pela segunda vez e pai de três filhos, parou de criticar o Maiden e voltou para onde estavam suas raízes. Sua volta foi triunfal: além de uma banda afiadíssima (destaque para o guitarrista, compositor e produtor Roy Z), convidou o antigo companheiro Adrian Smith para ajudá-lo. A química continuava intacta e o disco resultante foi o fantástico Accident Of Birth, lançado em 1997, um sucesso de crítica e público. Bruce estava tão reconciliado com o passado que até arranjou para que Derek Riggs desenhasse a capa e criasse uma "paródia" do Eddie, que ele teve a cara dura de chamar de Edison. "Eu fiz tudo isso deliberadamente" admitiu Bruce "Eu queria soar mais Maiden do que o Maiden". E, segundo muitos, conseguiu. Até mesmo o cavalheiresco Steve Harris, provavelmente ainda magoado com as críticas que a banda vinha recebendo (enquanto acontecia o inverso com Bruce), soltou um raro comentário venenoso: "Bruce gravaria um disco de Country, se ele pensasse que isso ia vender".

No meio desse tiroteio, Adrian Smith admite que levou tempo para recomeçar a tocar: "Eu acho que não fiz absolutamente nada durante os dois primeiros anos depois que deixei o grupo". Financeiramente ele não tinha que se preocupar pelo resto da vida depois de sete anos de gravações e tours gigantescas em seguida. Ao invés disso, ele se mudou com a mulher, a canadense Natalie, para o interior da Inglaterra e começou uma família. "Acho que eu nem olhei para uma guitarra durante um tempo". Admitiu ele.

Foi só depois de ir ver o Maiden tocar no Donington Castle em 1992 (e fazer uma jam com eles no final do show), que finalmente decidiu voltar à ativa. Um ano e meio depois apareceu com uma banda chamada Psycho Motel, dando início à gravação de seu primeiro disco auto intitulado. O CD seria lançado em 1996, depois que Rod Smallwood - sempre ele! - arranjou um contrato com uma gravadora independente, Castle Communications (a mesma de Bruce, depois que deixou o Maiden). Mas o Psycho Motel não deu muito certo. E, apesar de Adrian dizer que ia continuar e até começar a gravação de um segundo disco, acabou deixando um pouco de lado o projeto ao aceitar o convite de Bruce para fazer Accident Of Birth.

Aqui vale dizer que Adrian, ao contrário de Bruce, continuou amigo do pessoal do Maiden e a manter contato: "Eu continuei querendo saber tudo sobre eles desde que saí. Parte por causa de curiosidade e parte por causa de alguma devoção esquisita. Eu ainda me importo com eles. Acho que sempre me importarei. Você não pode escapar disso". Disse ele na época. Adrian seria também um dos poucos a apoiar publicamente o Maiden pós Bruce e a elogiar The X Factor.

EM ESTADO DE EBULIÇÃO

A grande prova da nova formação do Maiden seria seu segundo CD, que começaram a gravar em fins de 1997. O primeiro já tinha levado bastante fogo antiaéreo e não aguentariam uma segunda artilharia. O novo Metal se expandia e novas bandas fazendo um som próximo do Iron competiam no mercado. O sucesso do mais recente trabalho solo de Bruce só tornou as coisas mais tensas. O retorno do Metal nos anos 90 foi gradual, não a explosão que tinha sido no início da década de 80, onde grandes bandas dos anos 70 acabaram ficando para trás, meio esquecidas (como seus ídolos do UFO).

Desta vez muitos artistas que estavam decadentes ou tinham acabado puderam reativar suas carreiras graças a este renascimento em meados da década (Metal Church, Angel Witch, Twisted Sister, entre dezenas de outros). Mesmo assim, e ainda que somado ao fato das pessoas estarem com a mente mais aberta, público e críticos começaram a ficar impacientes com o Maiden, achando que a nova formação não honrava o nome e a fama da banda.

O grupo apostou todas as suas fichas no CD Virtual XI (o título se referindo à paixão do grupo tanto ao futebol quanto a jogos de computadores). Infelizmente o resultado, lançado no início de 1998, foi longe do que precisavam: razoável, no máximo. Menos sombrio e mais "para cima" do que The X Factor, o disco mostrava muito pouco para uma banda que se orgulhava de sempre apresentar trabalhos primorosos.

Faixas boas como Futureal ou Lightning Strikes Twice conviviam com outras que não convenciam de jeito nenhum, coisas como The Educated Fool. Embora The X Factor tivesse um certo "charme" sombrio e diferente, neste não dava para disfarçar a falta dos duelos de guitarra, a duração excessiva de algumas faixas, o uso indevido dos teclados e o que parecia ser uma notável falta de inspiração.

A banda ainda tentou defender o novo disco com uma barragem de entrevistas na imprensa, rádio e televisão. Até uma biografia oficial, Run To The Hills, foi lançada em abril de 1998, onde, na parte final, todos faziam a maior babação de ovo para Blaze e o novo trabalho. Mas todo este esforço não foi suficiente. Para piorar, na mesma época Bruce e Adrian lançariam um disco ainda mais pesado e vibrante do que o anterior: The Chemical Wedding. Outro sucesso de crítica e público. Consequentemente a situação da banda em geral - e de Bayley em particular - ficou crítica. A tour subsequente com os alemães do Helloween abrindo, só tornou as coisas ainda mais difíceis. Notícias de cancelamentos por falta de interesse do público (principalmente nos Estados Unidos) escapavam para a imprensa. Nesse clima não ficou difícil para que alguém levasse a culpa e se tornasse o bode expiatório do período.

Dados sobre o que realmente aconteceu nessa épocas não estão disponíveis: só no futuro poderemos saber exatamente o que rolou. O certo é que público e imprensa culpavam Bayley em maior escala e Gers em menor pela "decadência" da banda. Há quem diga que Blaze não estava dando conta do esquema pesado das tours do Maiden, perdendo a voz e forçando o cancelamento de apresentações importantes, justamente como Paul Di'Anno havia feito tantos anos antes.

Testemunhas falam do clima tenso entre o vocalista e o resto da banda no que seria sua última tour com o Iron. Independente do que aconteceu internamente, o destino de Blaze estava selado desde o começo das apresentações. Era preciso uma mudança radical. E rápida.

UM SONHO QUE SE TORNA REALIDADE

Notícias da iminente saída de Blaze começaram a correr pela imprensa. O metal melódico e o Power Metal tradicional estavam voltando com toda a força. Um CD tributo ao Maiden, chamado A Call To The Irons, com bandas underground (na maioria de Death ou Doom Metal), foi um grande sucesso, tanto que levou a um segundo volume em 1999. Outros tributos apareceriam em seguida. Bandas veteranas como o Saxon lançaram grandes discos na segunda metade dos anos 90 provando que havia espaço para todos no novo cenário. O "som do Maiden" estava retornando com força total.

Mesmo antes da saída oficial de Blaze, muito se especulou sobre quem seria o novo vocalista do Maiden: Dougie White, que havia sido preterido em favor de Blaze, era uma possibilidade. Falava-se também em Michael Kiske (ex-Helloween). Mas a grande notícia pegou meio mundo de surpresa: Bruce Dickinson estava de volta ao Maiden! E, melhor ainda, trazia junto consigo Adrian Smith! Janick Gers, que manteve intacta sua amizade com aquele que lhe dera a mão quando mais precisava foi o principal articulador da reunião, aparando devidamente as arestas entre Steve Harris e o vocalista.

Numa série de encontros feitos secretamente em Paris, todos tiveram a oportunidade de conversar e chegar a um acordo. Vale dizer que durante todo este tempo, mesmo quando criticavam abertamente um ao outro, nenhum dos dois deixou de destacar o respeito mútuo pelo talento de parte a parte. Bruce em particular sempre deixou claro que considerava Steve um "cara muito talentoso e honesto".

Blaze, um bom vocalista, com talento e elegância, deixou o Maiden sem falar mal dos seus antigos companheiros e tratou de se concentrar em sua carreira solo, o resultado do trabalho é o magnífico 'Silicon Messiah', um disco 100% heavy metal com guitarras pesadas e letras de primeira, Blaze sempre se mostrou um cara bem heavy metal, o resultado não poderia ser outro, seu disco também por algumas vezes mostra marcas da sua passagem pelo Maiden, como 'The Launch' que lembra muito 'Man on the Edge', do Maiden.

BRAVE NEW WORLD?

A tour de reunião coincidiu com o lançamento do game Ed Hunter, um velho projeto do pessoal do Iron, sempre apaixonados por vídeo games. Quem apostava numa turnê "caça níqueis", onde a banda só teria se reunido para conseguir dinheiro, se deu muito mal. Com três guitarras o som ficou ainda mais poderoso e mesmo os críticos mais ferrenhos se renderam, admitindo que todos no Maiden pareciam rejuvenescidos e cheio de energia vibrante. "O Maiden nunca soou tão brilhante e Bruce Dickinson está tão animado quanto durante a World Slavery Tour de 1984!"

Escrevia um jornalista americano que viu os primeiros shows da nova formação. A excursão foi um sucesso absoluto e provou de vez que havia mais do que simples ambição com a reunião dos músicos. Mas se provariam no estúdio? Ainda haveria inspiração para trabalhos inéditos? As três guitarras funcionariam num disco do Iron Maiden ano 2000? A resposta seria um trabalho que calaria a boca dos piores pessimistas.

Bruce e Steve disseram que o novo disco seria o mais importante da carreira do grupo. Era uma bravata, claro. Mas não deixou de surpreender. Gravado em Paris, com a produção desta vez dividida entre Steve e Kevin Shirley (Dream Theater, entre outros) foi lançado finalmente em maio de 2000. Brave New World veio ao mundo sob muitas expectativas e não é um disco tão revolucionário quanto The Number Of The Beast, por exemplo. Mas é, sem dúvida, seu melhor desde Seventh Son Of A Senventh Son. Um trabalho elaborado, surpreendente e, melhor de tudo, muito superior a tudo que lançaram na década de 90, com faixas mais diretas (The Mercenary, Fallen Angel) e outras mais viajantes (como a brilhante Nomad).

As três guitarras mostram um trabalho sutil e elaborado, muito longe da guerra de egos que se poderia imaginar com músicos tão bons, dando uma textura rica e diferente para o já consagrado "som do Maiden". Até mesmo Steve Harris está mais discreto, suas intervenções tanto no baixo quanto nos teclados mostrando um músico mais preocupado em fazer seus instrumentos funcionarem dentro do contexto do que simplesmente aparecer. Bruce canta com paixão e brilhantismo, mostrando que sempre foi a melhor voz que o Iron Maiden já teve.

Enfim, um disco que valeu toda a espera. Brave New World foi a prova final de que o Maiden ainda era capaz de ser criativo, surpreendente e relevante mesmo depois de todos os anos passados e com todas as crises musicais e pessoais que enfrentaram. E tal qualidade não pode ser ignorada. A mágica ainda está lá e a banda soa tão boa quanto sempre. Mas isso também não teria a menor importância nessas alturas. Mesmo que não desse certo. Mesmo que fosse um total fracasso, já teriam deixado para sempre a marca dos grandes nomes da história musical da humanidade. E não há dúvida que Steve e companhia tentariam de novo e de novo. Não se acaba com uma turma assim tão fácil.

A VOLTA POR CIMA

O que poderia então, representar melhor a volta as raízes do que um festival para mais de 200 mil fans enlouquecidos no último show da turnê? Pois este foi o cenário do Rock In Rio, em janeiro de 2001.

Antes porém, devemos mencionar a longa jornada que se seguiu após o lançamento do Brave New World, com lotações esgotadas em quase todos os países por onde a banda passou. Nunca o Maiden vendeu tanto ingresso em tão pouco tempo, nunca a banda esteve tão bem na mídia quanto em 2000, exceto nos tempos áureos da década de 80, mas a mídia não era nem metade do que víamos neste novo milênio, neste novo mundo, neste bravo novo mundo...

A banda conseguiu retomar o sucesso de onde supostamente havia parado para os fãs mais radicais. Voltou a locais consagrados de antes, tornou a vender como antes, tanto em ingressos quanto em discos, e tudo isso de uma forma que os fãs realmente desejavam, a banda arrasando em cada apresentação.

A cena musical e tecnológica porém era outra, se o impacto de um álbum já não impressionava tanto por haver mp3 (e vasamento de algumas canções), o Iron precisava inovar, precisava criar algo que desse ao público novo a dimensão real do que era o Iron Maiden e ao mesmo tempo agradar os mais tradicionais.

Ainda em turnê a banda divulgou que gravaria e lançaria algo inédito para eles até então: um DVD de um show. Para felicidade geral da nação tupiniquim o local escolhido para tal seria o último show da tour, em janeiro de 2001 – o Rock In Rio. Tão logo a notícia se espalhou criou-se um alvoroço em terras brasileiras como jamais visto. Caravanas do país inteiro viajavam de simples 30km até cansativos 1.500km de distância. Houve grupos vindos até de Teresina, Piauí!

O show, não é preciso dizer, foi antológico, fenomenal, um marco na história da banda, como os próprios integrantes admitem. Vale lembrar que a banda estava no fim da tour e o cansaso poderia ser visível, mas não foi. Poderíamos lembrar também que os shows do Maiden já estavam sendo vistos e revistos pelo mundo afora, o que não tornava o set list uma novidade. Poderíamos também citar as poucas falhas técnicas como a cruz que não subiu ou os microfones que não captaram o som do público como deveriam, mas nada disso atrapalhou a banda e o que se viu foi uma apresentação digna de um verdadeiro medalhão do HM. O Iron Maiden não estava de volta, o Iron Maiden estava dando um passo a frente, mais uma vez.

Que as três guitarras soavam harmoniosamente no palco todos já sabiam, mas nesta turnê o que se viu foi absurdamente revolucionário. De fato não há de se recordar nenhuma banda que tenha imposto três guitarristas solos, juntos no mesmo palco e a sonoridade não se tenha perdido ao menos um pouco, mas ao contrário do que seria normal, o que se viu (e ouviu) foram clássicos como The Trooper, The Evil That Man Do e 2 Minutes to Midnight sendo executadas ainda mais vibrantemente do que de costume, com solos de fazer chorar até o fã mais acostumado. Hallowed Be Thy Name, The Number of The Beast, The Clansman, Sign Of The Cross... todas, inclusive as novas músicas estavam realmente sensasionais. O trio de guitarras passara com louvor no segundo e mais difícil teste, e depois disso, tiraram um descanso merecido.

Durante todo o ano de 2001, enquanto a banda se divertia ou trabalhava em seus projetos pararelos, Harris se encabeçou na produção do novo álbum ao vivo: o já anunciado Rock In Rio.

A produção esteve longe de ser um primor, mais por causa das “inintendíveis” colagens no vocal de Bruce do que por qualquer outra coisa. De fato, seria muito difícil superar um álbum ao vivo como o Live After Death, mas o Rock In Rio chegou perto. Alguns insistem em dizer que se não fosse o “estrago das colagens” este seria “o álbum” da banda, mas na verdade não é pra tanto. Um fã novo que talvez escute o Rock In Rio possa não se interessar pelos A Real Live ou A Real Dead One, mas certamente vai entender o “pequeno abismo” que há entre ele e o Live After Death.

Voltando as atenções para o DVD, este sim é, de fato um item raro. Bem produzido visualmente, mostra mais do que somente um show da banda, mostra a essência do Iron em uma de suas melhores apresentações. Com um menu bem elaborado, cortes de cena bem feitos e extras interessantes, é sem dúvida um item indispensável para o bom amante do HM. Não é preciso nem dizer que tanto Cd quanto Dvd foram sucessos de venda, calando a boca dos que já contavam com a “morte” do Iron Maiden e do Metal.

SOLIDARIEDADE E MAIS LANÇAMENTOS

Abrimos aqui um “parênteses” nas férias da banda para citar as 3 noites de shows na Brixton Academy, em março de 2002.

A banda estava parada há mais de um ano e só uma coisa conseguiu a tirar de seu descanso: a solidariedade. Clive Burr, meio sumido desde a década passada, quando boatos indicaram que ele chegou a trabalhar de taxista, apareceu em entrevista para dizer que tinha esclerose múltipla. Desde então foram feitos vários esforços para que sua dor fosse minimizada e um deles, talvez o mais importante, foi a realização destes três shows na Brixton Academy.

Os eventos, claro, tiveram lotação esgotada e só em merchandising arrecadou mais do que todas as noites daquele ano no local. O show foi muito bom, nos moldes da Brave New World tour e com a inclusão de Children of The Damned, uma das músicas que Clive mais gostava. Além dos shows, foi relançado o single Running Free, com os lucros da venda revertidos para a campanha de combate a esclerose múltipla.

Ainda em 2002 a banda anunciou o lançamento de algo muito especial para os fãs: a Eddie´s Archive, uma caixa contendo três CDs duplos, um pergaminho com a árvore da banda e um mini cálice bem trabalhado. Para os mais fanáticos aquilo não foi nenhuma novidade, já que a maioria do material estava disponível em singles, vídeos e bootlegs, mas com certeza gerou um grande impacto entre todos pelo brilhante trabalho de produção tanto no áudio quanto no visual.

Os Cds presentes na caixa eram o Beast Over Hammersmith, o registro completo de um dos melhores shows da turnê do The Number of The Beast; o BBC Archives, uma coletânea com músicas da participação da banda no Rock Friday Night, Reading Festival de 1980 e 82 e do Monsters of Rock de 1988, realmente de mais! O último CD era a coletânea de B-sides, chamado Best of The B-Sides.

Além do caixão (destinado aos mais fanáticos) foi colocado um novo item substituindo o Best of The Beast, que sairia de catálogo. Seu nome: Edward The Great. Que nada mais é do que uma coletânea com algumas das melhores músicas da donzela.

De volta ao trabalho em 2003 a banda já abre o ano com boas surpresas. Um novo álbum já estava em fase de composição e as gravações logo se iniciaram. O cd, ainda sem nome, seria lançado em maio daquele ano mas devido a alguns atrasos (que muitos especulam ter sido motivado pelo lançamento do novo disco do Metallica) só acabou saindo em setembro.

Durante esse período (de janeiro a setembro) muita coisa rolou, muitos boatos foram inventados e desmentidos e muitas promessas foram dadas. Pra começar, o nome do novo álbum era uma incógnita. A banda afirma que seu nome foi guardado em segredo assim como as músicas, que ao contrário do álbum anterior não conseguiram ser postas na internet até a semana do lançamento. De fato as gravações foram finalizadas muito cedo e o álbum certamente poderia ter cumprido a data planejada mas a banda guardava alguma coisa na manga...

Com a chegada do verão no hemisfério norte Harris e Cia lançaram um item para testar o mercado: Visions of The Beast, um Dvd bem produzido visualmente com todos os clips da banda e mais algumas versões desenvolvidas pela Camp Chaos. O item é muito bom, sem dúvida, e estava programado para ser lançado em VHS desde 1997 (mas por algum motivo ainda oculto não o foi).

EDDIE ATÉ MORRER: A BANDA VOLTA A ESTRADA

Tanto o ‘Visions’ quanto ‘Edward’ não chegaram a render bons frutos como talvez os fãs esperavam, mas para a banda foi o suficiente para motivar uma nova turnê, a Gimme Ed ‘Til I´m Dead. Esta tour não foi grande, passou apenas por alguns países europeus e norte-americanos aproveitando a enorme quantidade de festivais que surgiam. A banda na verdade queria duas coisas: se aquecer para a turnê do novo álbum e aquecer o mercado e os fãs para o que estava por vir.

Durante toda a turnê, o Iron tocou uma música inédita, que só estaria no novo CD, Wildest Dreams. Essa música acabou se tornando alvo de polêmicas muito mais pelo motivo que levou a banda a toca-la do que por sua musicalidade. No palco, sempre antes de cada execução desta música, Bruce criticava muito o fato de algumas bandas estarem processando seus fãs por troca de MP3 via internet. A frase, claro, era destinada principalmente ao Metallica, com quem a banda tem certa inimizade.

Apesar deste fato o que se viu na prática foi o oposto. O conteúdo e nome do novo CD tiveram tratamento de um segredo de estado, guardado a 7 chaves desde sua gravação no começo do ano, e após lançado, suas músicas eram protegidas de forma a dificultar a gravação digital.

Se o álbum era guardado em segredo, as apresentações não. Apesar de pequena esta foi uma turnê que gerou uma grande quantidade de bootlegs, mas a banda parecia não se importar. “Gravem, divulguem, mostrem o show e a nova música para seus colegas...” – dizia Bruce – “tudo o que pedimos é: se gostam realmente do que ouvem, comprem o novo CD. É ele que faz o trabalho da banda continuar”. E Bruce realmente estava de bem com a vida. Além deste, outros bons “discursos” rolaram durante a turnê, principalmente apontando suas armas para a mídia em geral, que nunca boicotou tanto a banda como nestes tempos modernos(?) de ‘new metal’.

Paralelamente aos eventos rolavam inúmeros boatos sobre discussões em geral. Bruce x Steve; Janick x Adrian... chegaram até a falar coisas a respeito de Dave! Claro, nenhum confirmado.

No meio de sua excursão nos EUA um fato curioso: o atropelamento de um funcionário do Tommy Hilfiger, em Nova York, por Nicko McBrain. A confusão supostamente teria começado porque o sujeito insistia em não deixar Niko passar sem crachá. O baterista então, irritado, teria passado com o carro por cima do pé do infeliz e o jogado no chão, causando-lhe alguns machucados não muito sérios. O show atrasou mas Nicko conseguiu tocar. Depois foi levado à delegacia, prestou depoimento e foi liberado. Meses depois, foi julgado e condenado a uma pena leve. A banda não se pronunciou sobre o caso.

DANCE OF DEATH

Finalmente, 9 dias após o fim da Gimme Ed... a dança começa! Em setembro, (e sem mais atrasos) é lançado o novo álbum: Dance of Death. Um álbum diferente, dinâmico, estranho! Sim, por que não dizer... soou estranho no começo. Dance of Death é um ótimo álbum, na certa um dos melhores, mas até se acostumar foi estranho aceitar os riffs diferentes em No More Lies, Gates of Tomorrow, Paschendale... o álbum tinha até uma música acústica: Journeyman. E pela primeira vez também, Nicko McBrain participou como compositor. Ele escreveu a música New Frontier.

Mas o álbum não tinha apenas detalhes curiosos, ele trouxe também a velha potência e mística em torno das letras que só o Iron sabe fazer. Quem escuta os solos de Rainmaker, No More Lies ou da faixa título, por exemplo, sabe que aquilo é o mais puro Heavy Metal. A faixa título que, por sinal, é um primor. Tem ótimos riffs, ótimos solos, uma harmonia sem igual! Outra que também impressiona bastante é Montségur. Seu peso é considerável, uma das músicas mais bem feitas da banda. O solo também é muito característico e a letra... que letra! Montsegúr tem toda uma mística em torno de sí (assim como a própria Dance of Death baseada em rituais vudú), ela fala a respeito da batalha pelo forte Montsegúr. Um castelo construído na França onde cátaros e católicos mancharam de sangue suas paredes em uma guerra sem precedentes na época da perseguição aos “infiéis” por parte da Igreja. O castelo também tem uma lenda muito interessante: em sua construção teriam petrificado o santo Grall (o cálice sagrado de cristo) em uma de suas paredes. Posteriormente em uma das batalhas, o enorme exército católico teria se assustado com o que seria uma aparição de um cavaleiro guardião do Grall e fugido, dando a vitória aos cátaros quando estavam quase os derrotando. Mas esta música apesar de tão fascinante, especial e agradável à grande maioria dos fans, não foi incluída no set list da turnê.

O álbum não se destacou só pelos pontos positivos, a capa, por exemplo, foi um tremendo desastre. Considerada de longe a pior arte de capa já feita pela banda, não só em álbuns mas também em singles, perdeu a “guerra” contra o X-Factor e até contra a antiga capa do Live at Donington (talvez os fãs preferissem uma capa toda branca do que aqueles bichinhos horrendos). A resposta para tamanha bizarrice veio de Steve Harris - “Nós queríamos algo que desse impacto nos fãs e ao mesmo tempo tivesse a ver com a idéia do novo álbum” – De fato deu muito impacto... negativo! Ainda segundo Steve, a banda havia pedido que fosse desenvolvida uma dança nos moldes da do filme De Olhos bem Fechados (talvez o desenhista tenha entendido mal e desenhado tudo de olhos muito fechados mesmo...).

Com o Dance of Death fazendo sucesso pelo mundo (foi 1º lugar nas paradas de Italia, Suécia, Finlandia, Grécia e Republica Tcheca; 2º em Inglaterra, Alemanha, Suíça e Slovênia; e 3º na Franca, Espanha, Noruega, Polônia, Hungria, Argentina e Áustria) a banda se lançou para a tão esperada turnê. Das novidades prometidas anteriormente só foram apresentadas três: A volta de Can I Play With Madness, a entrada de Lord Of The Flies e a música acústica Journeyman.

Só que o que acabou marcando o set list não foi uma presença e sim uma ausência, ou muitas ausências. Pra começar, a lista de músicas estava mais enxuta, com somente 16. Além disso, a música mais adorada pelos fãs do mundo todo ficou de fora: Montségur. Apesar disso, a banda fez brilhantes apresentações por onde passou, principalmente no velho continente, consolidando a boa nova fase.

Ao chegar no Brasil, mais uma surpresa: “Ei, Metallica, vai tomar no c* ” - foi o que se ouviu de mais de 20 mil fãs no Rio e em São Paulo, protestando contra o fato de o Metallica, alguns meses antes, ter cancelado seus shows no país (apesar de todos os ingressos já terem se esgotado) alegando “cansaço psicológico”, mas na mesma época, viajou para o Japão para cumprir seus compromissos. Bruce Dickinson (sempre ele) não perdoou – “Quando o Iron Maiden promete vir ao Brasil, o Iron VEM MESMO AO BRASIL P%$#@!” – disse ele no palco da cidade maravilhosa e da terra da garoa. A aprovação foi imediata, e as polêmicas também.

Depois da curta passagem pela América do Sul e do Norte, a banda seguiu para o Japão onde encerrou a maratona de shows e partiu para seu merecido descanso. Antes, porém, durante toda a turnê do Dance of Death a banda teve de dar entrevistas por onde passou, para explicar uma coisa tão simples quanto beber água: O Maiden vai parar de fazer longas turnês, mas vai continuar com seus shows. A primeira entrevista foi dada por Bruce Dickinson, ainda na Suécia, mas a mídia, como sempre, preferiu entender errado e divulgou que esta era a última turnê da banda. Isso até ajudou, pois quem acreditou não perdeu a oportunidade e lotou estádios e casa de shows, mas a verdade estava longe de ser aquela, o Maiden não estava com os dias contados.

Na entrevista coletiva no Rio de Janeiro, Bruce tratou de ser claro – “A banda SEMPRE virá para o Brasil porque amamos essa terra. É onde o fã parece mais caloroso. O Brasil sempre estará em nossos planos” – Disse o vocalista. Aliás, toda a entrevista mostrou como a banda não dá a mínima para a imprensa em geral. Também não era para menos, se a mídia pelo mundo afora for sempre tão estúpida quanto a brasileira, essa colocação da banda não só é entendida como é aplaudida de pé. Toda a entrevista foi recheada de perguntas sem nexo ou tão estúpidas que faz qualquer um pensar que aquilo não é um repórter e sim um fugitivo de algum centro de retardados.

EARLY DAYS... LATER DAYS!

A prova de que o Maiden não pretende e nunca pretendeu encerrar suas atividades são os agendamentos de 3 shows para o verão de 2005: um em Paris, outro em Helsinki (Finlândia) e outro em Gotemburgo (Hungria), nos dias 25 de junho, 6 e 9 de julho, respectivamente, para promover o novo DVD: The Early Days – com lançamento em novembro de 2004.

Enquanto esta biografia era escritaa, a notícia de que os ingressos (51 mil) se esgotaram em Gotemburgo em apenas duas horas e meia desde que foram postos à venda, mostram o quanto a banda ainda está ativa e sendo muito bem recebida pelos fãs onde quer que vá. Tudo isso só reforça a idéia de que o Iron Maiden está mais forte do que nunca e que sempre estará no coração do amante do Heavy Metal.

A Matter of Life and Death (2006)



A banda durante o A Matter Of Life And Death World Tour, em 2006 (da esquerda para a direita:Steve Harris, Dave Murray, Janick Gers e Adrian Smith).

Em 2006 a banda lança o décimo quarto álbum de estúdio, A Matter of Life and Death, com canções mais longas que o habitual do Iron Maiden. O álbum traz algumas características progressivas, que a banda já vinha apresentando nos últimos álbuns, porém agora nesse álbum com maior intensidade, junto com um som mais pesado que o mostrado anteriormente pela banda. Este álbum foi considerado pela crítica especializada como um dos melhores álbuns já feito pela banda, sendo considerado pela revista Classic Rock o álbum do ano de 2006, e obtendo uma classificação de cinco estrelas (classificação máxima) da revista Kerrang!, que neste mesmo ano elegeu o Iron Maiden como banda mais importante nos 25 anos de existência da revista. Em 2007, a banda faz uma turnê batizada de A Matter of the Beast Tour, comemorando os 25 anos de lançamento do The Number of the Beast. Neste ano ainda tocam como atração principal mais uma vez noDonnington Download Festival. Em agosto de 2007 a banda anuncia a próxima turnê que se chamará Somewhere Back In Time World Tour, que vai ser uma volta ao passado, onde a banda executará apenas canções dos anos 1980 (para os fãs novos também haverá uma canção dos anos 90).

Em fevereiro de 2008, inicia-se a Somewhere Back In Time World Tour na India, e a bordo do Ed Force One (um Boeing 757 customizado pilotado por Bruce Dickinson), passaram por muitos países (incluindo o Brasil, em 2008 e 2009), tocando para mais de 3 milhões de pessoas em estádios e arenas. O filme Flight 666 chega aos cinemas mostrando como é a vida da banda na estrada durante a primeira perna da tour de 2008. Em 15 de março de 2009, no Autódromo de Interlagos, em São Paulo, a banda realizou o maior show da história do estado, tendo os organizadores estimado em 63 mil espectadores.30

The Final Frontier (2010)

Durante a turnê Somewhere Back In Time em 2008, Bruce Dickinson anunciou nos concertos que ainda no mesmo ano começariam os preparativos para um novo álbum. No ano seguinte, Dickinson anunciou que um novo álbum chegaria em 2010, e Harris declarou em uma entrevista que já haviam reservado um estúdio.

Em 5 de junho de 2010, o site oficial da banda revelou capa, data de lançamento e faixas do álbum The Final Frontier, bem como disponibilizou a faixa "El Dorado" para download.31 4 dias depois, iniciaram uma turnê mundial para promoção do álbum, The Final Frontier World Tour em Dallas, Estados Unidos. A turnê passou em 2011 pelo Brasil e por Portugal.

The Final Frontier foi lançado em agosto de 2010, e estreou no topo das paradas de 30 países.32 33 O álbum marcou um retorno da banda ao Compass Point Studios para as gravações.

Após concluída a turnê, a banda lançou um DVD com a apresentação no Estadio Nacional de Chile em 10 de Abril de 2011, em Santiago, com o título En Vivo!, em 26 de Março de 2012. Além do show, o DVD conta também com um documentário contando os bastidores da tour, o clipe promocional e o making of de "Satellite 15...The Final Frontier" e um vídeo da introdução dos shows.



Up The Irons!


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