[ PONTO DE VISTA ] - Run to the Hills - a biografia autorizada


Por Anderson Frota para o site Roadie Metal

6.5/10

Antes mesmo de abrir o livro, a capa já me apresenta duas informações que me causam reações contraditórias. A primeira é a palavra “autorizada”, escrita logo após biografia, e isso, comumente, pode ser um indicativo de uma obra chapa-branca, onde o autor deliberadamente evita pisar nos calos dos biografados. A segunda é o próprio nome do autor, Mick Wall, e isso já é um alento, pois Mick é um jornalista com longa história na imprensa britânica, tendo participado do staff de revistas como Kerrang e Sounds e é autor de inúmeras outras biografias, de bandas como AC/DC, Metallica e Black Sabbath.

Como se, para desfazer meus receios iniciais, há um pequeno prefácio escrito por Steve Harris, onde ele afirma que o livro não foi editado e, pode se dizer qualquer coisa de Harris, menos que ele seja desonesto. Sua afirmação, no preâmbulo da leitura, é a senha necessária para que possamos embarcar com tranquilidade nas páginas vindouras.

O livro é dividido em capítulos contendo os nomes dos principais personagens da história, na ordem em que eles vão surgindo: Steve, Dave, Paul, Rod, etc, mas isso não significa que os capítulos sejam focados exclusivamente sobre cada um. É apenas uma ferramenta indicativa do fluxo do tempo. A história, de fato, inicia com a infância de Harris e vai ganhando corpo conforme os fatos vão se delineando. Evidentemente, qualquer leitor quer saber dos ditos fatos com a maior quantidade de detalhes possível, mas, conforme o livro se aproxima de sua metade, algo estranho começa a ser percebido.

O livro tem 390 páginas e, na página 192, Bruce Dickinson aparece na narrativa pela primeira vez. Ou seja, levamos metade do livro até que a história individual de Bruce comece a ser contada, ainda bem antes de The Number Of The Beast começar a ser pensado. Todo o restante, 198 páginas, serão para cobrir tudo o que aconteceu desde então até o lançamento de “Dance of Death”! Se iniciarmos a conta a partir da primeira banda de Harris, em 1973, teremos nove anos de história, na primeira metade do livro, e 21 anos condensados no restante, o que me soa meio dispare.

Vale ressaltar, porém, que a primeira versão do livro – a original – data de 1998, ano de “Virtual XI”, e, portanto, todo o material a partir de então, 65 páginas aproximadamente, são acréscimos. Esse é um ponto positivo da obra, pois como ela foi lançada no Brasil em 2014, seria um desrespeito enorme com o público leitor se a sua abrangência fosse ainda mais desatualizada do que já é, considerado o lapso de dez anos – e dois discos de estúdio – não cobertos pelo texto.

Tentando deixar essa questão de lado e partindo para o que interessa, toda a história contada deixa uma coisa extremamente clara: O Iron Maiden é uma grande empresa. Digo isso sem qualquer tom pejorativo, muito pelo contrário. O Iron Maiden é uma empresa séria, que exige comprometimento de seus sócios, dirigida com rigor, e que visa, acima de tudo, o respeito à sua clientela, os seus fãs. Sempre foi assim e é por isso que a banda alcançou o presente patamar. Steve Harris recebeu de braços abertos cada um dos músicos que passaram pela formação e suas exigências não eram despropositadas: compromisso, seriedade e dedicação no palco. Não obstante o caráter lúdico que permeia uma banda de rock, não havia espaço para hesitação quando o assunto era a busca pelo melhor resultado artístico na visão de seus membros. O talento e o carisma das composições da banda foram fundamentais, mas, se não houvesse um autêntico rigor em sua conduta, o grupo talvez não tivesse se tornado o gigante que é hoje. Nesse ponto, a figura do empresário Rod Smallwood foi fundamental, devendo esse ser considerado o segundo, após Steve, a receber os louros pelo que conquistaram.

Mas, se a história do Iron Maiden gravita ao redor da persona de Steve Harris, isso não significa que o livro deveria ser tão focado em sua versão dos fatos. Digo isso, no sentido de que, em momentos mais delicados da carreira da banda, como por exemplo, na demissão de Blaze Bayley, parece que ninguém mais, além do próprio Harris se pronuncia a respeito, e o próprio autor não se aprofunda tanto na questão. Quem vivenciou a época, e acompanhou a imprensa especializada, talvez se lembre de que houve um pouco mais de tensão e problemas do que está descrito no livro. Harris faz o seu papel e fala, da forma mais ampla possível, sobre o assunto, mas o autor falha em não aprofundar passagens da história com o acréscimo de outros depoimentos, fazendo com que o livro decresça em seu objetivo. O nome de Mick Wall, que me alentou a princípio, acabou por não manter a confiança que lhe foi creditada.

Em resumo, é um livro bom e cumpre satisfatoriamente o papel de narrar a história do Iron Maiden, mas não é o livro definitivo. Se esse será feito algum dia, eu não sei, mas sei que ele é necessário, afinal é o Iron Maiden. Quando esse eventual futuro livro surgir, espero que seja lançado com um tratamento à altura, com uma capa que não se limite a estampar uma montagem escurecida, de uma imagem retirada de um álbum, e que não cometa o absurdo equívoco de citar, em sua contracapa, o nome do vocalista como Bruce Dickson…

Sobre Alexandre Temoteo

Alexandre Temoteo

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