Por Denis Carvalho
Em 1996, um amigo da escola falava tanto num tal de Iron Maiden que peguei emprestado dois CDs. O primeiro não empolgou muito, mas ao ouvir o segundo, um disco ao vivo, o vocalista capturou minha atenção.
Naquela época, Paul Bruce Dickinson já não estava mais no Iron Maiden. Ele havia saído da banda e se dedicava à sua carreira solo, segundo me disseram. Fui conhecendo as músicas aos poucos, à medida que adquiria um CD ou outro. Eram sensacionais! E o cara cantava demais, além de ser creditado como compositor de várias das melhores (na minha opinião, pelo menos) músicas . A cada álbum que escutava, ficava mais admirado.
Dois anos depois, conheci um negócio chamado internet e comecei a pesquisar com afinco. Bruce Dickinson era formado em história, esgrimista, autor de livros e, diziam, estava aprendendo a pilotar aviões. E ainda tocava sua carreira solo, que à época, dava um banho no que o Iron Maiden estava fazendo.
No ano seguinte (1999), ele retornou à banda, tendo havido várias turnês memoráveis desde então. Além disso, a aviação passou a ser mais um ingrediente do sucesso da banda. É que paralelo ao seu trabalho como vocalista e radialista (teve um programa numa rádio inglesa entre 2002 e 2010), o sujeito havia se tornado comandante de aeronaves de grande porte e fazia voos comerciais regulares por uma empresa chamada Astraeus (agora extinta, especializada em voos charter).
Bruce começou a levar fãs para o show, comandando um voo exclusivo para aqueles que adquiriam um pacote conhecido como “Bruce Air Flight 666″ (passagem, ingresso para o show, etc). Em uma das turnês, em 2008, foi um dos comandantes de um Boeing 757 customizado para levar a banda, equipe técnica e equipamentos ao redor do globo, odisseia documentada no ótimo Flight 666.
Atualmente, está envolvido com uma empresa fundada a pouco tempo, a Cardiff Aviation, especializada em manutenção de aeronaves e que, especula-se, planeja expandir suas operações para voos comerciais.
Por essa incrível gama de atividades, todas (até onde sei) realizadas com extremo profissionalismo e qualidade, tenho uma profunda admiração por Bruce Dickinson. Olhando para trás, vejo que o descobri numa época em que estava carente por um ídolo. Ele preencheu um pouco do vazio que a morte de Ayrton Senna deixou.
No fim de 2011, o site oficial da banda noticiou que Bruce abriria datas para que fãs fossem instruídos pessoalmente por ele num simulador do Boeing 737-400. Não podia deixar passar. Era a chance de, além de conhecer um ídolo, ver mais um lado da aviação. No dia 11.03.12, o comandante Paul Bruce Dickinson seria meu instrutor durante uma hora num de treinamento localizado junto ao aeroporto Heathrow, em Londres.
Compra
O site para pesquisar os dias e horários, bem como obter outras informações sobre o que é oferecido, é o www.bruceair.co.uk. Atualmente não há datas disponíveis e já não tem há um bom tempo (desde dezembro passado). A banda esteve em turnê ao longo de 2013. Não existe qualquer regularidade, embora a eventual disponibilidade é comunicada com uma antecedência de algumas semanas. Aos interessados, sugiro se inscrever na newsletter.
Em síntese, você escolhe um dia e horário disponível e solicita a reserva por e-mail. Após receber a confirmação, o pagamento deve ser feito até duas semanas antes do seu dia de piloto. O pagamento é feito através de cartão de crédito, mas é preciso telefonar para Londres para fazer isso. Após o pagamento, um e-mail com o recibo e instruções detalhadas para chegar ao ponto de encontro, documentação necessária, etc, é encaminhado. O preço por uma hora foi de salgadas 666 libras (cerca de R$ 2.450), tax included.
“Check-in e embarque”
No dia e horário combinados uma assistente me pegou numa cafeteria junto a uma estação de metrô perto do aeroporto. O trajeto até o prédio onde estão os simuladores foi bem rápido. Aproveitei para perguntar por que Bruce faz esse tipo de coisa, especialmente num domingo. “Fun”, disse ela, e porque o trânsito é melhor.
Pelo que eu entendi, o simulador fica dentro de um complexo voltado ao treinamento de pilotos. A dona (ou maior cliente) é a British, pois o logo dela estava em praticamente todos os simuladores pelos quais passei. Além disso, todos os tripulantes que iam e vinham estavam identificados como funcionários da empresa.
O lugar é enorme, segurança rígida. Uma vez no “nosso” simulador, como tinha alguém terminando seu “treinamento”, pude observar como ele funciona por fora. Várias pernas mecânicas movimentam a cabine para frente, para trás, lados, inclinação. Um show à parte. Também notei que quando o simulador está em uso, não há como, fisicamente, alguém acessá-lo pelo lado de fora. Fica um fosso entre a plataforma e a cabine. Acho que isso se dá justamente porque a cabine faz vários movimentos.
Finalmente a portinhola se abriu, Bruce apareceu, acenou com a cabeça, baixou uma pontezinha que conectou a cabine à plataforma, recebeu presentes do pessoal que estava indo embora, tirou fotos, assinou mais algumas coisas e finalmente olhou para mim e disse: “Hello sir, how are’ya?”
Antes de entrarmos ele me perguntou se eu tinha alguma experiência. Absolutamente zero, respondi. “Great”.
Simulando
Sentei do lado direito, o do co-piloto. Tinha até que colocar o cinto. A quantidade de instrumentos, botões, alavancas, etc, é inacreditável. Eu só tinha espiado uma cabine por mais de 3 segundos uma vez, então fiquei realmente impressionado. Até no teto tem botões (e não são poucos). Eu já me perguntava como alguém pode dominar um avião e nos levar sãos e salvos da decolagem ao pouso. Depois dessa experiência, fiquei ainda mais intrigado. Minha esposa ia se arrepender da sua crença de que o controle do Playstation tem muitos botões.
Na tela à nossa frente, a imagem da pista. Segundo entendi, é possível simular praticamente qualquer condição atmosférica (intensidade da chuva e do vento, direção deste, visibilidade…), bem como falhas no equipamento. Em razão da minha experiência, as condições seriam as melhores possíveis.
Bruce passou a me explicar como funciona o manche e como trabalhar com os pés. Um pedal para cada pé para acionar o leme direcional. Ainda, os pés tem outra importante função, que é acionar os freios. Após ele se acomodar à minha esquerda, falou que estávamos prontos para “decolar”.
Ele me instruiu na decolagem e depois em algumas manobras, que foi o que eu achei mais difícil. É um negócio interessante. Ao mesmo tempo que é sensível, não é. O esforço para conseguir determinado movimento era diretamente proporcional ao esforço para não exagerar (para não passar do ponto). Fazer uma curva sem levantar ou abaixar o nariz do avião era impossível. Numa certa hora ele assumiu o controle para demonstrar como é que se faz. Não sei porquê, mas aí foi tudo muito suave e preciso… “Pequenas correções” ele disse. “Se você lutar contra o avião, ele vai te derrotar”. Pela quantidade de alertas e sinais sonoros que eu levei, fui derrotado várias vezes.
Depois fizemos um sobrevoo de Londres. Como era minha primeira fez na capital britânica, Bruce fez um “city tour” aéreo, indo para lá e para cá apontando lugares. Também me explicou algumas coisas sobre o controle aéreo, como por exemplo que nós não poderíamos sobrevoar Londres daquele jeito sem que o controle nos interpelasse umas 50 vezes e provavelmente até mandasse a RAF contra nós. Também fiz várias perguntas sobre piloto automático. Por exemplo, ele disse que ao menos na Europa, num voo de uma hora, 90% ou mais é piloto automático. E em algumas situações, é até melhor deixar o piloto automático fazer o pouso (visibilidade zero, num pouso absolutamente necessário e totalmente por instrumentos).
Aí chegou a hora da verdade. Pousar o bicho. Meu trabalho consistiria em mantê-lo alinhado com o horizonte e conservar a “linha” que representava o avião dentro de duas barras paralelas. Duvidei muito que fosse conseguir, mas até que não me saí mal. Engraçado é que me concentrei tanto olhando para o instrumento que não olhei para frente, pela janela da cabine, nenhuma vez. Quando pousou ele pediu para eu olhar para frente, pois o avião já ia sair da pista (estava indo para a esquerda, pois eu tinha esquecido de compensar com os pés, ou seja, acionar o leme direcional). Depois fizemos mais uma decolagem e, por fim, ele demonstrou o pouso pelo piloto automático com visibilidade absolutamente zero. Ao menos no simulador, deu super certo. Muito preciso.
Enfim, foi muito legal, pena que foi pouco tempo. Confirmei que os pilotos ganham é muito pouco pelo que fazem e pela responsabilidade que carregam.
Conclusão
Vale a pena investir tanto tempo e dinheiro para conhecer um ídolo? Não é possível responder com 100% de racionalidade à pergunta. Tampouco existem respostas certas ou erradas.
Queremos agradecer ao João Alberto por esse relato fantástico. Apostamos que muita gente vai salvar o endereço nos favoritos, assinar a newsletter e ficar de olho para agendar uma simulação na próxima leva! E você? Já fez hum voo ao lado do Bruce? Ou experimentou algum simulador?
Fonte: melhoresdestinos.com.br
Fonte: melhoresdestinos.com.br